Mostrando postagens com marcador Mulheres Negras. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Mulheres Negras. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 6 de maio de 2014

RACISMOS, BARBÁRIES, FUTEBOL... ONDE ENTRECRUZAM AS VIOLÊNCIAS SOCIAIS?

Imagem publicada – foto colorida de uma intervenção com arte e provocação nas ruas de Maceió, Alagoas, onde performers, pessoas vestidas de ternos enlameados com argila, com os olhos vendados, ‘com passos lentos e gestos delicados’, caminharam e provocaram os transeuntes para uma reflexão sobre nossas instituições. Nessa fotografia de Jonathan Lins, estão perfilados diante do Quartel Geral da Polícia Militar, batendo continência.

Pode uma intervenção nas ruas provocar em nós alguma forma de reflexão crítica sobre nossos mais recentes atos de violência social? Ou estamos tão anestesiados que a suavidade dessa performance não nos sensibiliza mais?

 Acho e espero que sim, pois essa intervenção que é parte de um evento cultural, o Palco Giratório, promovido pelo Sesc, intrigou e mexeu com os que puderam ver/assistir estes “Cegos”. A nossa ‘cegueira branca’ (Saramago) nos foi desnudada, denunciada e tornou-se pública. Deixemos,então, de ser apenas telespectadores (as).

Entretanto, para além dessas intervenções estamos precisando, urgentemente, de uma resposta coletiva diante de outros ‘espetáculos’ de horror, racismos e barbárie.

Atiram-se corpos dançantes em lajes de supostamente pacificadas comunidades UPP, jogam-se vasos sanitários sobre torcedores supostamente indesejáveis como nossos próprios dejetos. Arrastam-se corpos de mulheres, ou negras ou nomeadas “bruxas”, pelos morros e morrinhos, nos Rios ou Guarujás... Corpos ultrajados e linchados se tornam espetáculo para redes sociais.

Somos, nesse triste momento, a Sociedade do Espetáculo que se deixa iludir, que pede mais violações de direitos humanos, que justifica os linchamentos através de âncoras da TV. Somos alienados, todos e todas, um pouco Sheherazades? Aprovamos a espetacularização da ‘justiça’ feita com as mãos sujas de sangue ou de ignorância?

Sim, não saímos às ruas mais, as aguardarmos nos nossos sofás. Não continuamos, ainda, o amanhã de Junho de 2013. Não mais nos indignamos, no âmago, com bananas racistas jogadas sobre e para os campos de futebol.

Associam-nos, midiática e proveitosamente, a nossos darwinianos ancestrais. Somos todos “macacos”? Ou somos apenas humanos bem adestrados? Ninguém deixou de ir aos estádios. A bola rola e o futebol nos encanta... Melhor que a sala ou a cozinha, aguardamos também nossa Copa das Copas.

Pelo contrário, daqui alguns dias, estaremos em festa. Nossas ruas, nossos corpos, nossas casas se enfeitarão. Bandeirolas verdes-amarelas tremularão, inclusive nas favelas e em outras janelas com vista para o mar. Seremos apenas torcedores fanáticos que gritarão na hora de nosso gol de supostos campeões?

Esqueceremos, como de hábito e por história, da turba e das massas arruaceiras. As massas humanas que podem fazer uma onda nas arquibancadas. As mesmas que irão violentar e espancar, até a morte, alguém que, por sua cor, sua miséria, suas marginalidades, ou supostas “maldades”, se tornem a diferença a ser eliminada.

Seriam esses Outros a projeção encarnada de nossas mais inconscientes monstruosidades? Dentro ou fora dos estádios, das novas arenas que não são ágoras.

Os racismos, por exemplo, cada dia mais, são e serão visibilizados/espetacularizados e difundidos. Espero eu combatidos e erradicados. Há ainda muitas bananas invisíveis e suas cascas no meio do caminho. Nelas ainda vamos escorregar, não bastará engolirmos os frutos dos nossos preconceitos.

Entretanto, para além desses discursos antirracistas, muitos atos continuam enraizados institucionalmente. São racismos que se definem pela hierarquia suposta da superioridade de brancos sobre negros. É o naturalizado racismo ambiental ou institucional.

Racismo institucional pode ser definido como o fracasso coletivo das instituições em promover um serviço profissional e adequado às pessoas por causa da sua cor, conforme boletim do IPEA.

Porém o chamado “fio branco” segregador hoje é mais visível nas ações de cunho ideológico contra mulheres. As Cláudias arrastadas ou as Fabianes de Jesus espancadas como maléficas proliferam nos mapas de violência recentemente publicados. Só não ganham notoriedade e manchetes de jornais. As suas mortes devem ser contabilizadas com outros milhares de corpos banalizados.

Segundo um documento do Geledés, Racismo Institucional: uma abordagem conceitual, esse tipo de racismo é “um dos modos de operacionalização do racismo patriarcal heteronormativo”. Ainda tem os ranços históricos do modelo patriarcal do Brasil Colônia e suas senzalas.

O documento nos indica, na proposta de construção de políticas públicas de proteção de mulheres negras, deve-se, entre outras coisas, se considerar:
1.    Que o racismo institucional ou sistêmico garante as condições para a perpetuação das iniquidades socioeconômicas que atingem a população negra e outras atingidas pelo racismo.
2.    Que o racismo institucional se associa a outras iniquidades, produzindo ou ampliando as desigualdades experimentadas pelas mulheres negras e as demais atingidas pelo racismo patriarcal. Da mesma forma, associando-se a diferentes eixos de subordinação, agrava as condições de vida e aprofunda iniquidades.
3.   Que o racismo institucional traduz escolhas institucionais atuais ou passadas reeditadas por decisão ou inércia. E sua destruição requer novos compromissos, processos e práticas.

Portanto, como disse outro dia, não bastará superamos os racismos, temos a urgência de sua erradicação. Muitos ainda se apoiam, fragilmente, na ideia de um país que é cordial para com sua população de pele escura. Continuaremos sendo confusos cafusos e mamelucos mulatizados?

Com certeza sei que não somos orangotangos. Somos negros e negras. Somos os que ocupam a maior estatística de extermínio de jovens, quando comparados os números de mortos pela polícia militar em relação a jovens brancos; vejam a Cor dos Homicídios: “... a tendência geral desde 2002 é: queda do número absoluto de homicídios na população branca e de aumento nos números da população negra. E essa tendência se observa tanto no conjunto da população quanto na população jovem...”.

As múltiplas violências, em especial as que se praticam, instituem-se e se tornam mutiladoras, são um campo fértil de multiplicação também do uso da violência do Estado.

 A violência, que se torna um conceito vazio para o viver em comum, em especial para os jovens tornou-se uma porta de saída, uma alternativa, inclusive para a sobrevivência. Um menino excluído mata um professor, negro, incluído, por causa de um celular...

Nesses tempos de bárbaros, fardados ou em massas ensandecidas, como então esclarecer que os Direitos Humanos não são apenas de encarcerados? Abriremos as portas da sala para nos tornar novamente uma multidão contestadora?

O problema é que essa porta também nos leva a um “beco sem saída”: como educar para e em direitos humanos e práticas de tolerância, convívio e respeito ao outro, quando o tornar-se violento é a única opção que resta ou restou?

Vamos, iludidos pelos boatos ou falsas notícias, atirar também pedras ou balas nos corpos marcados para morrer? Ou estamos apenas na antevéspera de uma grande festa, um grande espetáculo dentro nas Arenas, com manifestantes outsiders sendo massacrados por brucutus e representantes policiais da Ordem e do Progresso, do lado de fora?

Enfim, sem respostas definitivas, pergunto-me: como transformar essa transversalidade dos racismos, das barbáries, das múltiplas violências visíveis e do espetáculo do futebol em potência de vida, para além de suas funções e finalidades biopolíticas?

Façam suas apostas. Seremos e continuaremos os campeões? Ou, então, entrem junto comigo no beco de muitas saídas e muitas linhas de fuga...

Copyright/left jorgemarciopereiradeandrade 2014 (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação com e para as massas. TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Matérias recentes relacionadas com o texto e o contexto:





Indicações para leitura –

Boletim de Análise Político Institucional – 4 – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, Brasília, 2011.

Racismo: uma abordagem conceitual – Geledés, Instituto da Mulher Negra & Cfemea, Consultoria e redação: Jurema Werneck, 2012.

Waiselfisz, Julio Jacobo, Mapa da Violência 2012 – A Cor dos Homicídios no Brasil, Cebela&Flacso¨& SEPPIR/PR, Brasília, DF, 2012 (1ª edição em PDF) – https://mapadaviolencia.org.br/pdf2012/mapa2012_cor.pdf

LEIAM TAMBÉM NO BLOG –
O MARTELO NAS BRUXAS - COMO "QUEIMAR", HOJE, AS DIFERENÇAS FEMININAS?
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/11/o-martelo-nas-bruxas-como-queimar-hoje.html

RAÇA, RACISMO E IDEOLOGIA: ZUMBI ERA UM VÂNDALO, UM BLACK O QUÊ? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/11/raca-racismo-e-ideologia-zumbi-era-um.html


MOVIMENTOS, MASSAS, MANIFESTOS E HISTÓRIA: POR UMA MICROPOLÍTICA AMOROSA, URGENTE.
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/06/movimentos-massas-manifestos-e-historia.html

AS SELEÇÕES: OS ESTÁDIOS, OS PARADIGMAS E UM NOVO GAME https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2010/06/as-selecoes-os-estadios-os-paradigmas-e.html  

domingo, 20 de novembro de 2011

A CONSCIÊNCIA INCLUSIVA E O RACISMO NA ESCOLA

Imagem Publicada - Alunos da Escola Municipal de Educação Infantil(Emei) Guia Lopes, no Limão, na Zona Norte de São Paulo, fizeram desenhos contra a discriminação racial sobre uma pichação feita durante um fim de semana de outubro no muro da unidade.
A frase "vamos cuidar do futuro de nossas crianças brancas" foi escrita pelos pichadores acompanhada da suástica nazista. A Emei tem 430 alunos, com faixa etária entre 4 e 6 anos, divididos em classes da educação infantil 1 e 2 (pré-escola) (Foto: Filipe Araújo/Agência Estado)


Estamos em um momento histórico para o mundo e país. Muitas re-voluções estão em ação. E, na comemoração do Dia de Zumbi, o resistente negro dos Palmares, o quilombola, reinvoco a sua potência para algumas interrogações/opiniões.

Primeiramente, precisamos interrogar quantos dos que lerão este texto experimentou, na pele, alguma forma de discriminação, ou não? Você(s) já se viu discriminado ou tratado com diferenciais modos de atenção ou exclusão em espaços públicos? Já vivenciaram a sensação de serem os ‘’estranhos no ninho’’ por quaisquer de suas condições humanas? Ou por serem mulher, ou gay, ou gordo (a) ou uma pessoa com
deficiência?

Há alguns dias comemorou-se o Dia Internacional da Tolerância. Mas muito poucas pessoas se deram conta dessa ‘’comemoração’’ da UNESCO. Por quê? Esta palavra não é parte ativa de nosso Cotidiano e das Violências?. A palavra que confirma o sofrimento e o suportar o Outro e suas diferenças...

Interrogo-me sobre sua presença e negação, se o que mais estamos assistindo e tele-visando são, quando falamos das atuais massas em movimento, as resistências aos regimes intolerantes, aos tiranos de aldeia ou mesmo os que se engessam nos poderes.

São as revoltas contra todas as formas de perpetuação das violações de Direitos Humanos..., principalmente dos chamados regimes autoritários ou ditatoriais, e, inclusive, o ditos democráticos e, economicamente, hegemônicos.

Em minha opinião, podemos dizer que somente a revolta e a derrubada de tiranos ou velhos ditadores não é e nem será suficiente para uma mudança radical de paradigmas e culturas sobre os diferentes racismos. Muitas vezes, no hiper capitalismo atual, tornam-se as legitimadoras de outras formas sutis de segregação ou discriminação.

Primeiramente, portanto, precisamos lembrar o que foi descrito com sendo o racismo, e os atos que o alimentam: a Discriminação Racial. Segundo o conceito estabelecido pelas Nações Unidas (Convenção da ONU/1966, Sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial):
Significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferências baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, que tenha objeto ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, o gozo ou exercício, em condições de igualdade, osdireitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, social
ou cultural, ou em qualquer outro domínio da vida pública (Idem,Ibidem)”.


Em outubro foi difundido um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – Perfil dos principais atores envolvidos no trabalho escravo rural no Brasil- de forma inédita, mostrava que mais de 50%desta população é composta por homens com até 30 anos e em sua maioria migrante do Nordeste. 80% são de raça negra!

Um dia em um quilombo, há alguns séculos atrás, um homem negro desafiou por alguns anos, na Serra da Barriga, em Alagoas, a colonização opressora e seu trabalho escravizador. Quantos são os Zumbis que hoje resistem nos canaviais, nas fazendas, nos latifúndios, nas madeireiras, nos diferentes espaços rurais, e, inclusive urbanos,
onde seus corpos são apenas Vidas Nuas em exploração e cativeiro?

E, por haver ainda o trabalho indigno e escravo é que diante das atuais manifestações de júbilo ou de conquista de direitos para a população negra é que afirmo: ainda estamos muito longe de uma derrocada definitiva dos racismos.

Ainda estamos no caminho, ainda estamos a passos muito lentos nessa direção. Não farei as tradicionais alegações de diferenças salariais, econômicas ou de classe social, para falar da brecha que separa os cidadãos e cidadãs negros de outras ‘’raças’’. O IBGE tem sido suficientemente competente para nos mostrar em números escandalosos este abismo que nos distancia ou segrega.

Por estarmos assim ainda tão distanciados é que proponho que nossas maiores ênfases e dedicações, nesse momento atual, no combate aos racismos se deem através da Educação Inclusiva. A mesma que recebeu recentemente, no campo das deficiências, um duro golpe legislativo para se manter a institucionalização das diferenças. Cada um no seu quadrado... Enquadrado.

No mesmo Diário Oficial de nosso Governo Federal, do dia 17/11/11,estão o Decreto 7611 e o 7612. O primeiro tratando da Educação Especial e apagando da história as conquistas do Decreto 6571 de 2008,e o segundo que deveria ser o primeiro, o Plano Nacional para as Pessoas com Deficiência.

E o VIVER SEM LIMITES torna-se a nova meta governamental até o ano de 2014, com uma verba de R$ 7,6 bilhões, nos campos da educação, da acessibilidade, da mobilidade e da saúde. Um plano que ainda mantêm alguns campos das heterogêneas e singulares formas de ser e estar com um avanço, mas já foi antecedido por um retrocesso... 
É no retrocesso que mantemos sob vigilância todas as formas instituintes. Já que as fascistações e o racismo andam de braços dados na micro e na macro política.

É no conservadorismo que muitos resistiram aos abolicionistas. Temiam perder suas propriedades e senzalas, perdendo sua mão de obra escrava. Há os que ainda acreditam em privilégios, ou seja, leis para alguns poucos.

Mas a história nos mostrou que apenas trocamos de senhores e de capitães do mato. Ainda temos milhares em situação de trabalho escravo. Não temos mais Zumbis, perdemos nossas potências de resistência e revolta civil?

Hoje, assistindo um filme de Denzel Washington, O Grande Desafio, pude ver uma nova centelha de luz. É a história de um homem que crê na possibilidade de ‘’incluir’’ os estudantes negros em um debate com outros estudantes da Harvard. Baseou-se em uma história real, uma história que gostaria de ver milhares de vezes repetidas em nossas escolas.

Ele, como o professor Tolson, acredita no poder das palavras. Inspira-se em Gandhi e na desobediência civil. Ele, com sua determinação, escolhe três discípulos que nos mostrarão o quanto a cor da pele pode falar, quando é incluída e respeitada.

Creio que, somente, sob o estímulo de um bom professor, em um espaço de ensino aprendizagem mútua, no máximo respeito às singularidades e individualidades, como deve ser uma escola rumo à Inclusão, que podemos, juntos, acreditar em nossos direitos fundamentais e humanos de nos incluirmos entre nossos pares, sejam de que cores de pele forem.

Imaginemos uma criança negra, gorda, com síndrome de down, e pobre. Esta criança pode e deve frequentar nossas escolas regulares? Segundo novas determinações legais haverá uma possibilidade, dependendo da escola, de que sua inclusão esteja sob condicionais. Precisamos continuar tendo a sua possível diferença como transformadora e instituinte. O banco mais comum de escola, com todas as adaptações razoáveis, é o seu melhor lugar para a quebra de todos os preconceitos.

Bastaria lembrar, como a Convenção de 1966, que não podemos, sob nenhuma alegação, restringir seu direito, se nós a discriminamos por ser negra. E, para “complicar” o estereótipo, podemos dizer que essa aluna potencial poderia ser uma menina.

O gênero é e pode ser motivo de outra forma de exclusão, já que meninas negras são ainda mais segregadas. Assim, então, como nos afirmou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência em relação às meninas com deficiências, em seu artigo 3º sobre os seus Princípios:
g A igualdade entre o homem e a mulher;
h)O respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua identidade.


Portanto se pudermos, coletivamente, pensar em um “debate”, como os alunos do Professor Tolson, é a hora de reunirmos as forças instituintes e resilientes, que defendem direitos humanos, para que tanto os racismos, as homofobias ou quaisquer forma de preconceitos tornem-se discussão contínua e parte das diretrizes curriculares, urgentemente.

É preciso reconhecer que, para além dos bullyings, há um campo fértil para estas discriminações dentro dos muros (assim como fora) das escolas. É preciso reconhecer, assim como o fez o Projeto de Lei256/11, que se deve incluir a educação em e para os direitos humanos já no ensino fundamental.

Somente a sua apropriação por nossos filhos, e os filhos de nossos filhos, é a abertura para as necessárias e possíveis mudanças culturais e antirracistas, para além de todos os preconceitos, estigmas ou estereótipos.

Sim, poderemos ainda um dia VIVER SEM LIMITES, ou melhor, sem as limitações impostas, mas precisaremos antes da remoção de muitas barreiras, muitos ressentimentos identitários, muitos narcisismos das pequenas diferenças, muitos sectarismos, muitos exclusivismos e muitas negações do Outro e suas diferenças. Diferenças que espelham a sua afirmação contra toda forma de discriminação.

Vamos então reconhecer, diante das atuais macropolíticas, o quanto ainda temos de lutar por políticas públicas estruturais, o quanto ainda temos de, molecularmente, aprender a aprender a consciência inclusiva, que pode ser antirracista ou anti homofóbica, por exemplo, mas que só germina quando reconhecemos que ela é também o motivo de nossa vida, e, como disse Saint Exupéry, também o motivo de nossa morte...

Houve um tempo para que pudéssemos aprender que os bárbaros podem pichar nossos muros escolares. Nós não podemos é deixar de pintar, como as crianças da Emei Guia Lopes, com todas as cores, ideias e etnias, um arco-íris de direitos humanos dentro de nossas mentes e corações...

Pela Potência Zumbi, Maria Beatriz Nascimento, Abdias do Nascimento, Milton Santos e todas as negritudes que estão surgindo por aí...

Copyright e copyleft jorgemarciopereiradeandrade - 2024 ad infinitum - todos os direitos reservados ao autor  (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet ou outros meios de comunicação de massa TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Para conhecimento e difusão na Internet

LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003. 
Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.
 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm

OIT divulga dados do trabalho escravo rural no Brasil
https://www.palmares.gov.br/?p=15391

DECRETO No- 7.611, DE 17 DE NOVEMBRO DE 2011 Dispõe sobre a educação especial
https://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=12&data=18%2F11%2F2011

DECRETO 6949/2009 - Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6949.htm

COMBATE AO RACISMO Dia reforça luta contra preconceito na rede pública https://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/3288/162/dia-reforca-luta-contra-preconceito-na-rede-publica.html

Direitos humanos devem integrar diretrizes da educação, decide comissão
https://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/EDUCACAO-E-CULTURA/205450-DIREITOS-HUMANOS-DEVEM-INTEGRAR-DIRETRIZES-DA-EDUCACAO,-DECIDE-COMISSAO.html

Alunos fazem desenhos sobre pichação com frase racista em escola
https://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/11/alunos-fazem-desenhos-sobre-pichacao-com-frase-racista-em-escola.html

INDICAÇÕES PARA LEITURA –
Superando o Racismo na Escola
 Kabengele Munanga (Org.)-
https://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/me4575.pdf

Filmes indicados:

O GRANDE DESAFIO – Denzel Washington (2007) -
- Trailer www.premiereonline.com.br
https://cinezencultural.com.br/site/2010/03/14/o-grande-desafio/

Leia também no BLOG –

Onde Nascem e Morrem os Direitos Humanos –
https://infoativodefnet.blogspot.com/2011/11/onde-nascem-e-morrem-os-direitos.html

Direitos Humanos como uma questão para a Educação Inclusiva –
https://infoativodefnet.blogspot.com/2010/05/imagem-publicada-uma-foto-de-tres.html

Como fazer a Cabeça com Beatriz Nascimento?
https://infoativodefnet.blogspot.com/2009/11/infoativo_19.html

Qual é a SUA RAÇA? Nada a Declarar –
https://infoativodefnet.blogspot.com/2010/11/imagem-publicada-uma-foto-em-preto-e.html

NA NOITE GLOBAL TODOS OS SERES TORNAM-SE PARDOS
https://infoativodefnet.blogspot.com/search/label/Frantz%20Fanon

segunda-feira, 8 de março de 2010

TODO ÚTERO É UM MUNDO ...

Imagem publicada- Foto de Prudence Mabhena, 20 anos de idade, que é uma cantora e compositora natural do Zimbábue que nasceu com uma séria deficiência física. Ela tem de enfrentar várias barreiras e o fato de que as deficiências são vistas no país como feitos de bruxaria. Por isso mesmo a jovem muitas vezes preferiria se manter escondida a aparecer em algum palco como uma verdadeira artista. 
O documentário Music By Prudence (Oscar de melhor Documentário/Curta - 2010) ainda revela as agruras e estigmas que as crianças com deficiência vivenciam no Zimbábue. Uma mulher negra sentada em uma cadeira de rodas que agora irá encantar o mundo, e também tem um útero musical que não pode ser silenciado.

InfoAtivo DefNet - Nº 4359 - Ano 14 - março de 2010

“ Segundo o dicionário, o útero é o lugar onde qualquer coisa é concebida ou trazida à vida. No meu entender, não existe nada exceto útero. Ao todo, há o útero da Natureza; depois há o útero materno; e finalmente há o útero em que em que se situa a nossa vida e o nosso ser a que chamamos de mundo...”. Henry Miller (A Sabedoria do Coração)

O Dia Internacional da Mulher deve ser comemorado também como o dia de algumas mulheres, que, erroneamente, alguns consideram "especiais", principalmente porque até bem pouco eram invisíveis. Falo e escrevo sobre e para mulheres com deficiência. Estas mulheres estiveram muito tempo associadas à ideia heredológica, ou seja de eugenia, herança e de doença aplicada às deficiências. 

Conheçam a "família Kallikak". Eram elas que, segundo essa lógica, transmitiam genes defeituosos ou geravam os seres considerados 'anormais', sempre como oposição do bom, do normal e do belo. Além do estigma da deficiência elas tinham de enfrentar, duplamente, os estereótipos e discriminações que estiveram colados, transculturalmente, ao gênero feminino.

Me lembro de quando apresentava em palestras, há alguns anos atrás, o documentário da HBO - Without a Pity: a film about Abilities, o Sem Piedade, nos tempos das fitas VHS, onde uma mulher com paralisia cerebral casava-se, tinha vida sexual, frequentava (apesar dos preconceitos) uma universidade, era cuidada pelo marido,e, por fim engravidava e tinha uma filha.

Neste documentário podia se demonstrar a possibilidade dela 'cuidar' sozinha de sua filha Tereza, com todas as dificuldades. Esta cena causava o espanto e a surpresa de muitos. Algumas interrogações me faziam ter de re-explicar que a Paralisia Cerebral não é e não era uma doença transmissível. Esclarecer que a mãe não tinha um útero potencialmente defeituoso.

Ela não deixava de ser um corpo feminino pelo fato de ter sua vida motora modificada pela anóxia que sofreu ao nascer. E mais ainda dizer que a filha não teria nenhuma deficiência, apesar de seu parto ter sido a fórceps, já que as paralisias cerebrais podem se causadas por traumas obstétricos. E mais ainda que o fato de uma mulher com paralisia cerebral ter uma filha isso não tornava mais especial que todas as outras mulheres sem deficiência. Era apenas uma mulher. Uma mulher uterinamente igual às outras mulheres do mundo. Para além dessa redução.

Em 08 de março de 2008 prestei uma homenagem às mulheres com um texto que interrogava: o Mundo é um útero?. Neste texto afirmei a necessidade de um resgate da suavidade no feminino, aproximando mais uma vez a Gaia, a Terra do corpo: " das fêmeas-mulheres-lunares-que-menstruam, aquelas tão bem homenageadas por poetisas, como Cora Coralina e Elisa Lucinda, deveríamos realizar a necessidade de uma intensa afirmação de nosso mundo-útero, de nossa Gaia em ameaça e devastação, ora gritante ora silenciosamente. Afinal todos temem transformar nossa ‘mãe-terra’ em nosso aprisionante túmulo futuro, mesmo que não reconheçam".

Hoje após tantos tremores, inundações, transbordamentos, devastações e ventos arrasadores, precisamos continuar desejando um outro mundo possível, bioéticamente, para homens, mulheres e todos os seres vivos. É urgente e vital mantermos ativo o desejo de produção de vida e de criatividade. Como nos avisou, poeticamente, Walt Whitman dizendo que "só desdobrado das dobras de uma grande mulher está por vir e nascer um grande homem". 

E, tristemente, reconheço que ainda não vislumbramos este nascimento. E o digo pelo fato de ainda estarmos nos negando a produção de uma nova suavidade nos encontros com o feminino, com o devir-mulher. E há mulheres que, por suas singularidades e diferenças, exigem mais ainda um outro e novo olhar para o nosso futuro. Elas trazem muitos mundos novos em seus úteros, ou além deles, no seu corpo vibrátil.

Há mulheres que, independentemente, se estiverem em cadeiras de rodas, sejam surdas ou com bengalas brancas e/ou com diversas estaturas, dimensões ou formas dos corpos diferentes, comprovam que todo útero é um mundo. Um mundo muito mais amoroso e amável. Um mundo onde as tormentas e as violências cessam e cedem lugar para a criação, para a poesis.

 Elas vem surpreendendo o mundo que acredita somente na uniformidade, no utilitarismo e individualismo. A sua generosa vivência da maternidade e dos afetos nos dizem que o mundo é muito mais uterino e que ele, apesar de nossos descuidos, mantêm-se gerador de vidas. Porém, não são apenas úteros mas sim corpos-vida que nos ensinam a sabedoria da não-segregação e das potências geradoras de um futuro menos triste, menos isolador, mais humanista e mais inclusivo.

Todos úteros são, por sua incomensuráveis e imprevisíveis possibilidades, múltiplos devir-mundos, e devemos também homenagear as mulheres e mães com deficiência, assim todas as outras que comprovam que o Planeta Terra, como o corpo feminino contêm tudo, a ele não falta nada, pois a elas, que não são castradas, segundo o poeta Walt Whitman, devemos dedicar esta exortação-poema em seu 
'Canto ao Corpo Elétrico':

"...Não se envergonhem, mulheres ... seu privilégio é conter o resto... ser a saída para o resto,
Vocês são os portais do corpo e são os portais da alma.
A fêmea contém todas as qualidades e as temperam ... está no lugar certo...se move em perfeito equilíbrio,
Ela é todas as coisas devidamente veladas... passiva e ativa ao mesmo tempo...
ela é que gera tanto filhos quanto filhas, tanto filhas quanto filhos..." 
(Folhas da Relva)

VOCÊS PODEM GERAR TAMBÉM UM OUTRO MUNDO, OUTROS MUNDOS, OUTRAS SUAVIDADES... para além de todos os úteros visíveis, biológicos ou autorizados.

PS.
E uma doce e suave BRISA nos levou Johnny Alf para encantar o mundo com sua saudade... e muita bossa.

(copyright jorgemarciopereiradeandrade 2010/2011 - favor indicar a autoria na multiplicação livre e através de veículos de comunicação de massa. Todos Direitos Reservados 2024 2025)

FONTES - DIA INTERNACIONAL DA MULHER - histórico
https://pt.wikipedia.org/wiki/Dia_Internacional_da_Mulher
https://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/mulher/home.html

MUSIC BY PRUDENCE - Diretor Roger Ross Williams
https://www.musicbyprudence.com/film/

FAMÍLIA KALLIKAK - eugenia e heredologia
https://topicosemautismoeinclusao.blogspot.com/2009/05/entre-jaulas-e-exclusoes.html

WITHOUT A PITY: A FILM ABOUT ABILITIESS - documentário - Exibido na HBO-Brasil em 1997

https://www.chrisreevehomepage.com/m-withoutpity.html

LEIA TAMBÉM NO BLOG -

EUGENIA - COMO REALIZAR A CASTRAÇÃO E ESTERILIZAÇÃO DE  MULHERES E HOMENS COM DEFICIÊNCIA -
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/01/eugenia-como-realizar-castracao-e.html

MULHERES, SANGUE E VIDA, PARA ALÉM DE SUA EXCLUSÃO HISTÓRICA

https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/03/mulheres-sangue-e-vida-para-alem-de-sua.html 

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

UMA PRECIOSA HISTÓRIA? NÃO, UMA HISTÓRIA DURA


imagem publicada - capa e propaganda do filme Preciosa - uma história de esperança, com a personagem Clairecee Precious Jones, uma adolescente negra, obesa, com um casaco preto, calça jeans,caminhando e às suas costas se desenham asas de borboleta simbolizando sua busca de uma outra vida e da sua libertação das privações. Esta vestindo um casaco preto sobre uma blusa mais fina azul, que reforçam a sua condição de pessoa com obesidade.

O cinema faz parte de algumas vidas. E algumas vidas passam a fazer parte da história do Cinema. O filme Preciosa: uma história de esperança, lançado nessa sexta feira, em pleno momento de alegria carnavalesca é um filme para a história das imagens em movimento. Perguntem o porquê após assistí-lo.

"Este filme é 'duro'", foi a única expressão como resposta/silêncio que pude dar ao sair mais que calado desta experiência com a identificação projetiva provocada pela a não-atriz profissional Gaborey Sibide. Guardem esse nome pois ela já foi indicada para o Globo de Ouro, na mesma noite que a Mamma Mia Meryl Streep e Sandra Bullock. Ela e sua mãe, nesse filme realista, e de roteiro baseado na vida dentro do negro Harlem de 1987, surpreendem por sua mútua dramaticidade. A elas faço minha reverência humilde e agradecida.

Mas o que mais surpreende no filme de Lee Daniels é a rudeza com que as imagens se mantêm, até mesmo na Escola Alternativa - Cada um ensina a cada um.

O mundo de Clarecee Precious (Gaborey Sibide) é rude, e as cenas vão nos levando progressivamente a refletir sobre outra forma de aspereza. A câmera nos dá uns closes que só a telona pode transmitir, por isso é melhor ir ao Cinema e deixar a tela do computador. As seguidas agressões e violentações a que a personagem é submetida refletem uma realidade que tentamos afastar de nossos mundos e vidas.

No mundo de Preciosa não há, para além de seus sonhos, fantasias e imaginário, muita compreensão.
No seu mundo sobra incesto, abuso físico ou sexual, zombaria do corpo diferente, dor, privação cultural, analfabetismo, preconceito, e exclusão. Há, nesse mundo tão 'hard', uma presença importante, tocante para mim, da Síndrome de Down, e mais ainda o já naturalizado preconceito sobre esta condição e diversidade humana.


A primeira filha de Preciosa é denominada de Monga, que ela própria diz, na sua vida dura e nua, ser o diminutivo de "mongolóide". Esta criança como um fruto de incesto e disputa com a figura materna, pelo pai abusador/violentador, se torna apenas um trunfo para receberem dinheiro da pensão da Assistência Social.

Fato que não é distante de histórias realistas que vi, ouvi e acompanhei quando médico, nos anos 80, na, também dura, Baixada Fluminense e seu Esquadrão da Morte, assim como na Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde atendi famílias de pessoas com deficiência. Depois pude constatar, apesar dos anos passados, esta repetição do preconceito e do abuso da deficiência intelectual em relatos e vivências no cuidado de famílias pobres e desfiliadas de Campinas, trabalhando em um Caps III (Centro de Atenção Psicossocial).

Ao interpretar uma mãe quase fascista, quase, pois haverá sua rendenção/confissão humana diante de uma assistente social (Mariah Carey), a atriz Mo'Nique dá um show de interpretação, e, para mim, já merece mais que um Oscar.

Ela consegue demolir a naturalização da mãe perfeita e boa, que no filme só existe em paródia de Sofia Loren, indo na direção da crueza da alma humana, buscando nos porões do inconsciente as mais diferentes manifestações e sintomas. Uma mãe que ancora uma personagem como esta é capaz, como no evento aqui ocorrido há algum tempo no mundo real, de lançar um bebê ao chão (aqui o bebê foi lançado no vidro do carro no Taquaral).


Ela relembra os anciãos de Esparta, no alto do monte Taygetos, lançando os corpos defeituosos e a mentes imperfeitas, ou seja os sujeitos com deficiência, imprestáveis, no ponto de vista bélico, para aquela sociedade grega. Há também e ainda Medéias pós-modernas.

A atriz Mo'Nique me levou ao teatro grego e não apenas ao cinema. Uma bela dupla de mulheres negras, sofridas e intensas, em dueto e duelo. Ambas levando ao espectador a questão da rejeição e da superação desse desejo filicida que dorme nos mais obscuros sotãos das mentes humanas, transculturalmente.

Enfim, para superar o espetáculo da crua e nua vida nua de Preciosa, em tempos de carnavalização da vida, nos resta sonhar, como ela, que vivemos 'vestidos de dourado, palhaços das perdidas ilusões', pois esta preciosa história é para além de dura: é indispensável para que continuemos no BLOCO. O bloco carnavalesco "EU NUM TÔ SOZINHO", pois existem educadoras, como a Rain do filme, que nos dizem firmente: por mais que sua dor e sofrimento sejam intenso- 

ESCREVA, ESCREVA... escrever é preciso, viver é mais impreciso ainda. Vivam e sobrevivam as Preciosas Clarices e seus diários ou blogs que re-existem no mundo.

Vamos fantasiados e fantasiando, juntos, assitir a Preciosa, mais uma vez? e depois...

copyright jorgemarciopereiradeandrade (favor citar a fonte em reprodução, difusão ou multiplicação livre por quaisquer mídias de massa TODOS OS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Fonte para outra crítica do filme:
PRECIOSA - UMA HISTÓRIA DE ESPERANÇA
- Lee Daniels ( baseado no livro Push de Saffire- 2009)

https://www.omelete.com.br/cine/100025138/Critica__Preciosa___Uma_Historia_de_Esperanca.aspx

*MEDÉIA - (em grego, ΜΗΔΕΙΑ - MĒDEIA ) é uma tragédia grega de Eurípides, datada de 431 a.C. Nessa peça do teatro grego trágico foi apresentado o retrato psicológico de uma mulher carregada de amor e ódio a um só tempo. Medéia representa um novo tipo de personagem na tragédia grega, como esposa repudiada e estrangeira perseguida, ela se rebela contra o mundo que a rodeia, rejeitando conformismo tradicional. Tomada de fúria terrível, mata os filhos que teve com o marido, para vingar-se dele e automodificar-se. É vista como uma das figuras femininas mais impressionantes da dramaturgia universal.
LER EM - https://vidraguas.com.br/wordpress/2007/06/19/um-passeio-pelo-mito-medeia/
InfoAtivo DefNet Nº 4344 - Ano 14
LEIA TAMBÉM NO BLOG sobre CINEMA E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - Aos meus "COLEGAS" INTOCÁVEIS E INDENPENDENTES - O Cinema Reverencia as Pessoas com Deficiência - https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/08/aos-meus-colegas-intocaveis-e.html

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

COMO FAZER A CABEÇA COM BEATRIZ NASCIMENTO


*(imagem descrita - foto da capa do livro EU SOU ATLÂNTICA sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento de Alex Ratts - com seu rosto em preto e branco pela metade)

ORI - Como fazer a cabeça com Beatriz Nascimento
IN MEMORIAM


Ás vésperas do Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, relembrando Zumbi dos Palmares, também me relembrei de uma amiga: Maria Beatriz Nascimento (1942-1995), de quem tive a intensidade e o afeto como seu interlocutor-aprendiz, no ofício de seu cuidado como psicanalista.


Aprendi com ela o que realmente foram os Quilombos, mais ainda acerca de nossa 'africanidade' e sua negação, com ela aprendi a respeitar e reconhecer muitas das questões ligadas à noções de 'raça' e gênero. 

Ela que se dizia 'atlântica", realmente muitas vezes se tornou um verdadeiro Atlas em seu desejo de transformar o mundo, muito embora fosse impossível carregá-lo nas costas. Foi sua implicação irrestrita com a vida e com o Outro que a levou a uma defesa de uma mulher, e, covardemente, ser assassinada em 1995, pelas costas, por um homem que agredia a sua amiga em um bar do bairro Botafogo, no Rio de Janeiro.

O revelador e analisador de um resgate histórico sempre foi uma das lições que melhor pude aprender ao intervir/aprender com esta mulher, principalmente por sua negritude inquieta e inquietadora. Já dizia meu velho Freud: "as pedras falam"..., por mais que as soterremos.

Ela nos deixou um depoimento vivo, e agora podemos aprender novamente. Em 2009 foi relançado em formato de DVD de seu histórico transformado em filme: ORI (1989 - 131 min.), dirigida pela socióloga e cineasta Raquel Gerber.

Este documentário, em longa metragem, nos traz, a partir de um roteiro de Beatriz, a sua história entrelaçada com a 'africanidade' que se imbrica com a própria história de nossa Terra Brasilis.

Ori, o filme nos documenta os movimentos negros brasileiros, de 1977 a 1988, com imagens e textos desta historiadora, militante e intelectual, tendo como fio condutor a .sua própria história pessoal, de Sergipe ao Rio de Janeiro, passando por outros locais, que tem nos quilombos a sua ideia e eixo central. Foi ela que me apresentou a inter-relação  datada e contextualizada, entre as favelas e os quilombos como territórios existenciais da resistência cultural e étnica.

Recentemente reencontrei-me com Beatriz Nascimento através do exercício estético do cinema. Assistir Ori é um exercício transoceânico, para quem trouxer e reconhecer em si nossas origens africanas. É preciso, para além de atitudes intolerantes ou preconceituosas, afirmar a presença de nossa 'mama África', como nos diz Chico César em sua música.

Para quem quiser conhecer um pouco da VIDA intensa e rica de Beatriz, assim como de seus textos, sugiro um passeio no site do Géledes, Instituto da Mulher Negra: https://www.geledes.org.br/beatriz-nascimento/, onde sua trajetória no cenário do movimento negro, assim como dedicada estudiosa, com real implicação, do papel dos quilombolas e da necessidade de resistir à pasteurização e a homogenização dos que 'fugiam da escravidão e do trabalho forçado', muitos dos que ainda compõem uma massa de brasileiros e brasileiras.

Há pessoas que acreditam que um dia para comemorar o dia da Consciência Negra, seja um estímulo à segregação ou à discriminação, da mesma maneira como negam a necessidade ainda das ações afirmativas para a defesa daqueles que compõem uma população ainda sob discriminação étnica, desfiliação, desigualdades, mantida preconceituosamente como uma 'raça' negra. A todos e todas lembramos que: a verdadeira libertação e consciência de que não foi em Maio, nas lutas dos abolicionistas, assim como nas mãos e pena de uma princesa e sua Lei Áurea, que se desencadeou o verdadeiro processo de cidadania e reconhecimento histórico-político dos negros e sua negritude no Brasil. Por isso em novembro o dia 20 é muito mais revolucionário que o dia 13 de maio.

Beatriz Nascimento, era Maria, era uma mulher, mãe e também uma negra, que mesmo machisticamente assassinada continuará VIVA. Devido à sua transatlancidade africanizada, continuara a 'fazer a minha cabeça' (ORI), em uma inversão mantida do que se espera, reducionista e naturalizadamente, do papel de quem se arriscou colocar-se no lugar e função de analista desta 'história-corpo-transcendente e pura cartografia humana'.

Ela merece, para resgate de sua memória, que Ori possa ser exibido como uma aula-cinema para todos os que ainda pensam ser melhor continuarmos negando nossas africanidades e o lugar do Negro na construção de nossa História.

Pela potência Zumbi que transversaliza nossas vidas...

(copyright jorgemarciopereiradeandrade 2009-2022/2024 - ad infinitum, todos direitos reservados - TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Sugestões para leitura e reflexão:

Origens Africanas do Brasil Contemporâneo - Histórias, Línguas, Culturas e Civilizações, Kabengele Munanga, São Paulo, SP, Global, 2009.

O Negro no Brasil de Hoje - Kabengele Munanga & Nilma Lino Gomes , São Paulo, SP, Global, 2006.

O que é Colonialismo? Coleção Cadernos de Ciências Sociais - coleção dirigida por Carlos Serra (In Memoriam) - Dos Colonialismos aos Pós e Neo-colonialismos - Jorge Márcio Pereira de Andrade , Escolar Editora, Lisboa, Portugal, 2019.

ALGUNS DADOS SOBRE A DESIGUALDADE ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL:

O BRASIL foi último país a abolir a Escravidão. Trouxemos 04 milhões de africanos para a escravidão na nossa colonização.

O Brasil é o maior país do mundo em população afrodescendente, fora do continente africano ...

"Formam mais de 79 milhões de homens, mulheres,crianças. Formam a segunda maior população negra do mundo - atrás apenas da Nigéria. Representam 46% dos brasileiros (sem contar os pardos). Transbordam nas áreas pobres. São quase invisíveis no topo da pirâmide social (vejam fala recente da representante da Alta Comissaria da ONU para os Direitos Humanos que afirmou: "Milhões de afro-brasileiros e indígenas estão atolados na pobreza e não têm acesso a serviços básicos e a oportunidades de emprego"- novembro de 2009). E enfrentam uma desvantagem quase monótona nos indicadores socioeconômicos: do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) à taxa de analfabetismo; do desemprego ao salário médio; das condições adequadas de saneamento ao acesso doméstico à Internet." (Flávia Oliveira, IETS, O Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade).

IMAGEM PUBLICADA *(é importante a descrição para leitores e visitantes cegos) - Capa do livro EU SOU ATLÂNTICA -sobre a trajetória de BEATRIZ NASCIMENTO - autor Alex Ratt- com o retrato em preto&branco de Beatriz - Livro publicado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e Instituto Kuanza.


InfoAtivo.DefNet - Nº 4304 - Ano 13 - 19 de NOVEMBRO de 2009.

LEIAM TAMBÉM NO BLOG -