quinta-feira, 20 de novembro de 2014

RACISMOS, NEGRITUDES E INTOLERÂNCIAS, CONSCIÊNCIA PARA QUÊ?

Imagem publicada – foto que fiz de um panfleto do Movimento Negro RJ, na comemoração do centenário da Abolição da Escravatura, tendo ao alto: 1888 LEI ÁUREA 1988, sendo 1888 em rosa, LEI em branco, ÁUREA em rosa e 1988 em branco, seguida da fotografia de uma pintura do século XIX, com a representação dos castigos corporais impostos aos negros e negras escravizados, tendo um capataz que segura uma mulher negra, junto ao que aplica uma palmatória em outra escrava, ajoelhada em sua frente, com uma criança ao lado, tendo três outros homens negros, em primeiro plano ao centro, com uma roda de carro de bois, com mais outros escravos ao fundo, aguardando seus castigos, principalmente aos que eram chamados de “negros rebeldes ou fujões”. Segue-se em letras vermelhas: NADA MUDOU. Abaixo está a fotografia de um policial militar que traz um grupo de homens negros amarrados por cordas nos pescoços, uns aos outros, em fila, com quatro deles em primeiro plano... Segue-se, em baixo dessa foto, do ano 1988, a convocação: VAMOS MUDAR, convocando para a MARCHA CONTRA A FARSA DA ABOLIÇÃO (Participe – 11 de maio – 16 horas – Candelária – Movimento Negro – RJ). Será preciso descrever mais? Ou ainda continuamos convivendo com uma nova “cegueira branca”?

“2.4 A tolerância pode ter a forma da marginalização dos grupos vulneráveis e de sua exclusão de toda participação na vida social e política e também a da violência e da discriminação contra os mesmos. Como afirma a declaração sobre a Raça e os Preconceitos Raciais, “Todos os indivíduos e todos os grupos têm o direito de ser diferentes” (art. 12)

A citação é parte da Declaração de Princípios sobre a Tolerância, uma declaração da Unesco, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura reunidos em Paris em virtude da 28ª  Reunião da Conferência Geral, que proclamou o dia 16 de novembro como o Dia Internacional da Tolerância.

Há apesar dos anos e lutas, a manutenção da imagem da foto de 1988? Lamento dizer que sim, apenas os meios de aprisionamento, encarceramento e de violentação, assim como vulneração, dos corpos e das vidas de negros é que se tornam menos ‘visivelmente acorrentadas e acorrentadoras’. As novas e modernas cordas em nossos pescoços são mais sutis e aperfeiçoadas. Estão também em nossos inconscientes colonizados e colonizadores.

Muitos ainda questionam o porquê e para que termos de inventar/respeitar um Dia da Consciência Negra? Aos que ainda têm dúvidas e aos intolerantes envio alguns dados:
 - A maioria dos homicídios que ocorrem no Brasil atinge pessoas jovens: do total de vítimas em 2010, cerca de 50% tinham entre 15 e 29 anos. Desses, 75% são negros.
- Segundo o Mapa da Violência (2013): “... Podemos verificar que no conjunto da população:
• O número de vítimas brancas caiu de 18.867 em 2002 para 13.895 em 2011, o que representou um significativo decréscimo: 26,4%.
• Já as vítimas negras cresceram de 26.952 para 35.297 no mesmo período, isto é, um aumento de 30,6%.
• Assim, a participação branca no total de homicídios do país cai de 41% em 2002, para 28,2% em 2011. Já a participação negra, que já era elevada em 2002, 58,6% cresce mais ainda, vai para 71.4%.
• Com esse diferencial a vitimização negra passa de 42,9% em 2002 – nesse ano morrem proporcionalmente 42,9% mais vítimas negras que brancas – para 153,4% em 2011, em um crescimento contínuo, ano a ano, dessa vitimização”.

Em artigo de minha autoria publicado no livro O que é Violência Social, que está sendo lançado na III Conferência Internacional - Dinâmicas Sociais em África: Rupturas e Continuidades, na Universidade Eduardo Mondlane e seu Centro de Estudos Africanos, em Maputo, Moçambique, afirmo, ao analisar estes e outros dados de nossas exclusões e segregações sociais alimentando o genocídio de toda uma juventude negra, quando se trata da questão da cor da pele no Brasil, que: “Entre 2002 e 2010, segundo os registros do Sistema de Informações de Mortalidade, morreram assassinados no país 272.422 cidadãos negros, com uma média de 30.269 assassinatos ao ano. Só em 2010 foram 34.983...; um dado que confirmava também o decréscimo de mortes da população branca, com um crescimento de mortes violentas, principalmente junto à juventude, de cidadãos e cidadãs negros...”.

Nesse quadro, já comprovado e denunciado teríamos ainda dúvidas sobre a necessidade de estímulo das nossas “consciências”,  para além de que etnias, raças ou cores estivermos sendo biopoliticamente classificados?

A questão de aceitação do Outro e das suas diferenças é que nos dá parâmetros e limites para o que chamamos de Tolerância? Sempre digo que temos que ir além da aceitação, precisamos antes do re-conhecimento desse Outro, dessa Alteridade, no mais profundo de cada um de nós. Um dia apenas de conscientização não mudará todas as ‘más-consciências’ e nem aplacará a nova Onda de intolerância, fascismos e/ou racismos de todas as colorações e conotações.

Precisamos, urgentemente, da prática ético-política cotidiana dessa construção de novas culturas e mentalidades. Conseguiremos afrouxar os grilhões e mordaças que nos impuseram? Precisamos nos re-conhecer como in-tolerantes do Outro e dos Outros além de nós.

Por isso é que afirmei estarmos ainda com várias cordas e cordões nos aprisionando, visíveis e invisivelmente, transversalizando nossas relações, sejam sociais, micropolíticas e/ou amorosas. Há ainda debaixo dos tapetes de nossas culturas e história uma densa camada de poeira dos preconceitos mais arraigados. Entre eles está a presença negada desses escravizados que nos tornam seus afrodescendentes.

Avisem os ex-presidentes que “todos temos os pés na cozinha da mãe África preta e retinta”. Somos todos e todas mais Libéria do que libertos por nossas áureas leis. Somos na essência do humano e da humanidade mais negros, embora nos distanciemos do continente multifacetado e multicultural que chamamos de Mãe África.

Ainda jovem, muito influenciado pelas Marchas pelos Direitos Civis, por Martin Luther King, Malcolm X, Angela Davis e outros negros e negras “rebeldes”, que desejavam outro lugar social e político, escrevi um poema que chamei de Negrume. Dizia, se lembro destes anos ginasiais, perto de 1968, que ‘devíamos nos livrar do que nos impunham... pois já havíamos lavado com sangue coagulado... a mancha de nosso, do só nosso, do meu  e do seu: Negrume”. Anos depois descobri minhas novas implicações. Tornei-me, temporariamente, mais uma negritude.

Um efeito e contágio com a poesia de Aimée Cesaire.  Sempre a poesia, aquela que me trouxe a compreensão de que há um Outro, que este não é um lado “negro”, mas que nos habita que deseja sempre mais liberdade, mas ar, mais espaço, mais tempo, enfim, mais Vida. O conceito de negritude tornou-se, por sua radicalidade de orgulho e valorização da cultura negra, minha nova arma de luta contra todas as discriminações. Os eurocentrismos em mim se desmontavam, desfaziam-se ...

Por isso desejo que possamos combater novamente com “novas” negritudes, tornadas novos rizomas para criar novas cartografias. Em tempos de ódios, além dos raciais, também macropolíticos, ainda acredito que alguns possam se contagiar dessa busca onde o cultural poderá ficar acima do político e dos políticos. Onde se ultrapassaria, como os tigres e suas tigritudes, ir além dessas negritudes do passado. Ir além do consciente autorizado, buscar a radicalidade de liberação dos nossos inconscientes sob eterna captura e colonização.

Como no texto inicial deixar florescer em nós, e além de nós, rompendo todos os limites e limitações, a afirmação da Diferença não só como direito ou necessidade, da diferença que nos torna mais Potência Zumbi, libertária, do que a ruptura de conceitos e preconceitos, inclusive dos racismos enquanto ideologias.

Em tempos, de marchas ré, de neo-pastores fundamentalistas, fascistas de plantão, intolerantes pelo indiferentismo, lobinhos maus, lobões, espertos ao contrário, falsos tolerantes e negociadores dos medos que apregoam a Ordem como segurança, urge e ruge em mim o desejo de ir além, o desejo que vai além da vacina para o Ebola. O desejo sem fronteiras, para além das Áfricas. Em mim, urge, como poesis, sob a pele indelevelmente negra, o apelo para a re-existência e a resiliência.

Como no pedaço de meu papel rabiscado dentro do livro sobre Billie Holiday e a biografia de uma canção – Strange Fruit: -
 “Ai quem me dera um dia, apenas um dia sem dor ...
A dor de ser demasiada e apaixonadamente  humano,
Sempre com a mesma cor, sempre Negro
Entretanto, apenas um Outro, um Outro Pessoa...”

Quem sabe me acordo, como já recordei, em um mundo e tempo onde já sonhei, com menos meninos e meninas negras vulnerados e violentados?  E, po-éticamente, alguma consciência despertarei?

Copyright/left jorgemarciopereiradeandrade (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação para e com as massas)

INDICAÇÕES PARA LEITURAS CRÍTICAS, REFLEXÕES E COMBATE DAS DISCRIMINAÇÕES E RACISMOS –

VIOLÊNCIA CONTRA A JUVENTUDE NEGRA NO BRASIL – Pesquisa de Opinião Pública Nacional – DATA SENADO – Novembro de 2012 - http://www.senado.gov.br/senado/datasenado/pdf/datasenado/DataSenado-Pesquisa-Violencia_juventude_negra.pdf

JUVENTUDE VIVA - Homícidios e Juventude no Brasil – Mapa da Violência - Julio Jacobo Waiselfisz, Brasília, 2013 http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/mapa2013_homicidios_juventude.pdf

MÍDIA E TOLERÂNCIA – A ciência construindo caminhos de liberdade – Margarida Maria Krohling – Roseli Fischmann (Orgs.), Editora EDUSP/Unesco, São Paulo, SP, 2002.

O QUE É VIOLÊNCIA SOCIAL - Antônio Zacarias, Daniel dos Santos, Jorge Márcio Pereira de Andrade, Ricardo Arruda, Escolar Editora, Coleção Cadernos de Ciências Sociais (Org. Prof. Carlos Serra), Lisboa/Maputo, Portugal/ Moçambique.

Na Internet –

LEIA TAMBÉM NO BLOG –

RAÇA, RACISMO E IDEOLOGIA: ZUMBI ERA UM VÂNDALO, UM BLACK O QUÊ? 
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/11/raca-racismo-e-ideologia-zumbi-era-um.html

RACISMO, HOMOFOBIA, LOUCURA E NEGAÇÃO DAS DIFERENÇAS:as flores de Maio 
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/05/racismo-homofobia-loucura-e-negacao-das.html





domingo, 7 de setembro de 2014

PSICANÁLISE, MACROPOLÍTICA, RELIGIÃO E O ‘’PONTO MORTO’’.

Imagem publicada - Sigmund Freud em 1938, já em Londres, após ser resgatado das garras cruéis e mortais do Nazismo, mas mostrando na face o efeito de mais de 30 cirurgias para o tratamento de seu câncer de palato e da mandíbula direita. Está de óculos redondos, de olhar firme e sereno, enfrentando todas as barreiras que lhe foram interpostas.  Está sem o tradicional charuto na boca. A barba  já está totalmente branca e o rosto emagrecido, por "sua" neoplasia. Apenas um homem, um homem visionário e persistente. Entretanto, por sua postura, não foi e nem deveria ser vilipendiado nem pela política e muito menos pela religião. Ambas não responderam ao seu desejo de outro futuro diante do mal estar na civilização da humanidade. (fotografia com a letra de Freud abaixo dela, com sua assinatura junto com a data 1938)

“Se eu governasse um povo de judeus, restabeleceria o templo de Salomão” (Napoleão, citado por Gustave Le Bon – Psicologia das Multidões, 1895).

E, a Universal, que não é a do cinema ou da tv, e cada dia mais utiliza de todos os meios e mídias, mas das salvações histriônicas, reconstruiu e se “fingiu” e mimetizou como se judaica fosse lá em São Paulo... O Napo Edir demonstrou-se ao seu ‘povo eleito’ e ungido. E foi louvado?

Após uma notícia sobre o uso da Psicanálise para fins de “evangelização” fui lançado novamente a um tema que pesquisei. Estas investigações e pesquisas foram a base de minha aprovação no Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Lá nos anos 70, mais precisamente em 1979, com a tese: Psiquiatria, Psicanálise e Religião podem coexistir?

Repito agora, nesses novos tempos pastorais, a interrogação. Apenas modifico com a inclusão da palavra POLÍTICA. E insistirei na busca de outra resposta: macro política, psicanálise e religião podem coexistir?

Segundo a matéria publicada recentemente há, para alguns oportunistas e mistificadores, uma nova utilidade dos conhecimentos descobertos e inventados por Sigmund Freud.

 Os pastores evangélicos utilizariam psicanálise para “cativar fiéis”. Digo que gostei dessa provocação, pude retomar um tema já estudado, e, mais ainda demonstrar a ambivalência que o termo “cativar” nos pode significar. Para mim não coexistimos e muito menos compartilhamos quando presos, iludidos, amarrados a quaisquer messianismos.

Torna-se cativo ou cativar fiéis pode ser também aproximado de cativeiro. Um local, que pode se o Templo de Salomão, onde mantem-se aprisionados e seduzidos milhares de pessoas. Uma massa ávida da salvação e de milagres. Um grupo humano que para O Futuro de uma Ilusão (Freud, 1927) pode estar buscando a repressão: “Parece mais provável que cada cultura deve ser construída em cima de ... coerção e renúncia às pulsões. ".

Não é por menos que alguns Pastores, como Mala&Faia, Marco Feliciano e cia, fazem uma cruzada homofóbica, tornando-se, neuroticamente, histéricos e vociferadores diante dos avanços dos direitos humanos para as diversidades sexuais no país. Como ocupam, cada dia mais, cargos de poder político torna-se necessário buscar o seu utilitarismo presente e futuro, inclusive nos discursos eleitorais recentes.

 Assim as Macropolíticas e a Religião passam a andar de braços dados. Quem sabe não estamos vendo aí “o retorno do reprimido”? Tenho a certeza científica de que, historicamente, desejamos nos nossos âmagos essa forma de controle. Entretanto também, em alguns corpos e mentes, as repudiamos, a elas estamos resiliente e ativamente combatendo.

Uma forma de controle que passa tanto pelas sutis biopolíticas assim como novos micros lugares onde os poderes serão exercitados e produzidos (Foucault). Reprimimos tanto quanto fomos reprimidos pelo Estado, como o caso brasileiro dos Anos de Chumbo, que ainda passam como verdade alguns discursos políticos de salvação da Ordem e do Progresso. Oferecem e prometem um lugar neutro e apolítico.

Este é o discurso que mais temo. Se procurarmos suas raízes histórico políticas encontraremos o “Vital Center” (Arthur Schlesinger, 1948). Um modelo de passeia entre a democracia e totalitarismo, hoje, também próximo dos fundamentalismos, que foi chamado de “meio da estrada”.

O modelo que foi abraçado por Ronald Reagan e Bill Clinton, tentando eliminar as competições entre o liberalismo e o conservadorismo, mas mantendo, para tal, uma postura “em cima do muro”, nem esquerda, nem direita. Muito pelo contrário uma forma de governabilidade que geraria e gerou um “ponto morto”. O ponto que não é de mutação, e, mesmo negando, é conservador e hipercapitalista.

Esse ponto foi também o que gerou algumas das crises econômicas que saíram do bojo do Império, nascente histórica de novas recessões, novos horrores econômicos. Horrores que justificam e justificaram a busca de posturas fascistas ou totalitárias, ou em sua máscara usada e velha com o acréscimo do termo NEO. O Neoliberalismo aí se cultiva, e, a muitos e muitas, cativa. Os “pontos mortos” são areias movediças para a História.

Há, então, que compreender e buscar respostas diante das novas estratégias de controle seja pela política, aqui como bio, das novas ondas de fundamentalismo religioso ou até mesmo pelos usos midiáticos ou evangelizadores da Psicanálise, mais uma vez anunciados.

Freud não teve a pretensão de que a psicanálise pudesse ser uma alternativa à política. Entretanto, deve se sentir ofendido pelos que usurpam sua Terra Psicanalítica com bíblias nas mãos. Ele, com certeza, se sabia e se sentia um judeu, mas não um rabino.

Apropriações ideológicas ou mistificadoras de quaisquer conhecimentos devem ser por princípio rechaçadas. O que faria Sigmund entrando ou participando de uma festa de reinauguração do Templo da Universal? Duvido que muitos achem que ele aceitaria. Eu digo que não. A sua vida e obra caminham em outra direção, buscam solver outros mistérios, outras verdades. Os novos vendilhões seriam expulsos do Templo? Ou com o Tempo?

Segundo Chemouni:”... Freud era um explorador modesto. Elaborou com tanta paixão a ‘sua’ psicanálise  que, mesmo se tivesse desejado, não teria tido tempo para entregar-se a outras tarefas”. E, vivendo em uma virada de séculos, com o recrudescimento do antissemitismo, a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Comunista e muitos “ismos” surgindo, não se tornou um ‘sionista’.

Hoje, acho eu, ele não autorizaria um massacre genocida da Palestina para que a Declaração de Balfour (1897) em seu objetivo de “encorajamento da colonização da Palestina por fazendeiros, camponeses e artesãos (judeus)”, utilizasse a guerra e a invasão como recentemente tele assistimos. Freud desconfiava da política. Nós somos treinados para desconfiar dos políticos e sua representatividade.

Ele teria, hoje, que reconhecer os desvios teóricos que a Psicanálise vem, historicamente, padecendo e/ou reproduzindo. O “Pai da Psicanálise” teria que re-conhecer as demolições de conceitos feitas por Guattari e Deleuze. Ambos seriam iconoclastas?  Quem sabe o criador, para além dos freudismos, leria com outros olhos o Anti-Édipo? Aceitaria a afirmação deleuziana “de que não devia considerar o desejo uma superestrutura subjetiva mais ou menos no eclipse”? O desejo e suas máquinas não cessam, não se limitam, podem transbordar, mas podem ser capturados pelas políticas.

Na sua Ilha Deserta, Deleuze, nos lembra, em debate com François Chatelet, Pierre Clastres, Roger Dadoun, Serge Leclaire e outros, a visão Guattari-deleuzeana de que “o desejo não para de trabalhar a história, mesmo nos seus piores períodos. As massas alemãs acabaram por desejar o nazismo...”. E, em nossos debates macro políticos atuais que desejo estamos pressentindo das nossas massas? O do ressentimento?

Ainda somos os mesmos daquelas massas, não-multidões, que foram para as ruas em Junho de 2013? Onde foi parar a nossa indignação e revolta? Guattari e Deleuze no debate citado nos dizem: “- Em certas condições as massas exprimem a sua vontade revolucionária, os seus desejos varrem todos os obstáculos, abrem horizontes inauditos, mas os últimos a se darem conta disso são as organizações e os homens que se supõem representá-las...”.

Repetirei ou não o convite à interrogação, no texto de 14 de junho de 2013: A PRAÇA É DO POVO? AS RUAS SÃO DOS AUTOMÓVEIS E ÔNIBUS? E DIREITOS HUMANOS SÃO DE QUEM? Ou vou convidá-los a uma posição mais ativa e participante, micro e macro politicamente? Vamos retornar, retroceder, ceder e optar pela chamada “Nova Política”?

Um recente manifesto do Clube Militar, que abre os braços para esta “nova política”, afirma que a candidata evangelizadora será a melhor opção para não tocarmos nas feridas abertas pelos Anos de Chumbo.

Vamos realmente reconhecer que são os corpos torturados, destruídos e lançados no Cemitério de Perus? E os responsáveis, inclusive o Governo da época, seus generais, almirantes, comandantes, seus subordinados ou seus algozes autorizados irão ser julgados, para além da Anistia? Por que estes senhores de pijamas com estrelinhas aposentadas estão com o poder de se afirmar os herdeiros da Ditadura Militar?

Acredito que eles desejam a manutenção de um Estado repressor, um Estado que possa ser tão sedutoramente “novo” que suas antigas repressões políticas sejam “esquecidas”. Volto, então, a Deleuze e Guattari que nos indagam: “Se é verdade que a revolução social é inseparável de uma revolução do desejo, enquanto a questão desloca-se: em que condições poderá a vanguarda revolucionária libertar-se da sua cumplicidade inconsciente com as estruturas repressivas e frustar as manipulações do desejo das massas pelo poder...?”

Estamos ávidos de servidão ou de salvação? E os pastores políticos serão nossos salvadores ou nossos “novos” senhores? Na vida política, seja nas macro ou micro políticas, ou nas psicanálises não deve haver espaço para neutralidades, mitificações ou mistificações.

Vamos acordar, ou seja, vamos colocar nossos corações e mentes em sintonia, e aí a Psicanálise talvez possa contribuir, mas nunca poderá substituir nossa busca de vontade política e de outras cartografias para o viver.

Para a resposta sobre a coexistência das práticas políticas, das psicanálises e das religiões, instigo a todos e todas buscarem as implicações que cada campo do viver citado propõem. Olhemos as fotografias ou imagens maquiadas com outras visões e pontos críticos. 

A de Freud, lá em cima, nos traz alguém que resistiu, com determinação, tanto ao Nazismo/Fascismo quanto ao próprio câncer do palato e de mandíbula. Sua memória fotográfica aí é a da re-existência que tanto falo e escrevo. Photoshops, há outros sendo midiatizados, seja de candidatos, candidatas, pastores ou não, mas que nos anunciam ‘novas-já velhas máquinas de Poder’ ou de “Glória”.

Concordo aí com Debray que nos diz que: “Reconhecer que existe algo mais do que a máquina na máquina destinada a transmitir é sugerir que, na arte de governar, há menos arte do que se possa presumir e mais mecanismo do que o próprio artista possa imaginar...”. Somos a Sociedade do Espetáculo, do Controle e da Hipermidiatização do viver?

Por isso, olhando para o nosso futuro sem ilusão, novamente, me/nos pergunto: - somos apenas espectadores televisivos, marionetes midiáticos, fanáticos religiosos ávidos da Salvação e da imortalidade, ou tornamos insondáveis que somos como um Inconsciente Maquínico, apenas criticamente mais e mais humanos que não abrem mão e negociam seus princípios éticos e seus direitos?

Copyright/left – sem estar no centro, muito pelo contrário jorgemarciopereiradeandrade (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação para e com as massas).

Matérias citadas e “visíveis” da Internet


Vital Center - Arthur Schlesinger, em "Introdução à Operação Edition" de The Vital Center http://en.wikipedia.org/wiki/Vital_Center

FREUD NÃO EXPLICA! Pastores brasileiros usam psicanálise para cativar fiéis evangélicos http://www.midianews.com.br/conteudo.php?sid=6&cid=209189

E para a “revelação” ou “insight” sobre o momento político-pastoral - VEJAM O VÍDEO, REFLITAM E COMPAREM COM VIDEOS DO PASSADO DOS QUE PROPUSERAM O FASCISMO COMO SOLUÇÃO: Pastora Ana Paula Valadão, "muito louca", profetiza a chegada da hora da igreja na política COMO UM EXÉRCITO? ou COM O EXÉRCITO?) http://www.geledes.org.br/pastora-ana-paula-valadao-muito-louca-profetiza-chegada-da-hora-da-igreja-na-politica/#axzz3CdwTGJik

Indicações para leitura crítica e reflexiva –

O FUTURO DE UMA ILUSÃO /TOTEM E TABU/ MAL ESTAR NA CIVILIZAÇÃO – Sigmund Freud, Editoras Imago e Companhia das Letras, com edições diferenciadas pelas traduções e pelos tradutores.

FREUD E O SIONISMO (Terra Psicanalítica Terra Prometida) – Jacqui Chemouni, Editora Imago, Rio de Janeiro, RJ, 1992.

A ILHA DESERTA e outros textos – Gilles Deleuze, Editora Iluminuras, São Paulo, SP, 2006.

DIFERENÇA E REPETIÇÃO – Gilles Deleuze, Editora Graal, Rio de Janeiro, RJ, 1988.
O ESTADO SEDUTOR (As Revoluções Midialógicas do Poder) – RÉGIS DEBRAY, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 1994.

LEIA TAMBÉM NO BLOG –

A COREIA DO FANATISMO POLÍTICO E O FANATISMO RELIGIOSO DO PASTOR – estamos no Século XXI? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/04/a-coreia-do-fanatismo-politico-e-o.html

FUNDAMENTALISMO, FASCISMO E INTOLERÂNCIA SÃO INCURÁVEIS? E OS GAYS? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/06/fundamentalismo-fascismo-e-intolerancia.html

Para não se esquecer do Pastor/Deputado - A ILHA DE FELIZ SEM ANO E SEU INTRUSO, E, NÓS TAMBÉM. (apenas um re-conto) 

MOVIMENTOS, MASSAS, MANIFESTOS E HISTÓRIA: POR UMA MICROPOLÍTICA AMOROSA, URGENTE. https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/06/movimentos-massas-manifestos-e-historia.html

O CORPO ULTRAJADO ONTEM SERÁ O CORPO NEGADO AMANHÃ? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2014/03/o-corpo-ultrajado-ontem-sera-o-corpo.html

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

O SUICÍDIO, ADENTRANDO AO MAR E AO NÃO HÁ MAR...

Imagem publicada – a capa do filme Mar Adentro com o rosto do ator Javier Bardem, usando uma blusa de lã de gola alta, e com um leve sorriso nos lábios. Ele está interpretando o marinheiro Ramón Sampedro, no filme de Alejandro Almenábar. Ramón (Javier Bardem) é um tetraplégico que está preso a uma cama há trinta anos. A sua única janela para o mundo é a do seu quarto, perto do mar, mar em que tanto viajou. O mar onde teve o acidente que lhe roubou a juventude e a vida. Desde então que Ramón luta pelo direito a pôr termo à vida dignamente, luta pelo direito à eutanásia através de um suicídio assistido. Uma história verídica que nos instiga à reflexão sobre o viver e sobre o morrer, com dignidade.

Texto para os seres humanos que se cansam de esperar outro diálogo com a Senhora Vida... Outro encontro acolhedor... Outra saída para a Dor.

Em 2005, exatamente no dia 18 de fevereiro, me afetei e “assisti” um suicídio assistido. Não, não estava presente a este ato. Estive, para além da identificação projetiva, é vendo-o através do magnífico filme: Mar Adentro. Estive intensamente presente sim ao ver Ramón San Pedro sair voando pela janela, como seu desejo e sobrevoar, imaginariamente, até praias e um possível amor.

Ramón Sampedro é uma boa referência para este momento onde o tema do suicidar-se retorna às manchetes e à hipermidiatização. Estes dias o ator Robin Williams e seu suicídio, levou-nos à manifestações sobre o tema e o ato. Esse ato que nos obriga a pensar sobre a finitude do viver e/ou desejo dela. Um tema ao qual negamos a devida atenção e reflexão. Estaria eu e nós todos/todas pensando sobre o assunto sem o nosso ‘professor’ que nos estimulava para o Carpe Diem?

O assunto sempre me foi importante, e se tornou mais ainda quando conheci a vida e obra de Florbela Espanca. É dela uma das mais contundentes afirmações sobre quem escolhe morrer por suas convicções ou dores profundas. A poetisa que se suicidou aos 36 anos, quem sabe por profundo amor, nos disse: “Quem foi que um dia ousou lançar a um papel as letras ultrajantes da palavra covardia, essa suprema afronta, esse insultante escarro, à face dos que querem morrer!?...”. Ela também se despediu de nós, em 07 de dezembro de 1930, desejando repousar perto do oceano.

Ela nos diz também da ‘coragem desdenhosa’, da ‘altiva serenidade’, do ‘profundíssimo desprezo’, às ‘almas que partiram por querer’. E sabemos que qualquer morte nos assusta, surpreende e desgosta.

A Dona Morta que vive passeando em nossas varandas da morada do corpo, sempre fiel e presente, só entra em nossos mais íntimos sótãos ou cama se a convidarmos, insistentemente. Vivemos negando a sua convivência e coexistência com a Senhora Vida.

O espanhol Ramón ficou paraplégico ao mergulhar no mar. Era o dia de maré baixa. Ele passou então, aos 25 anos, a lutar pelo direito à própria morte. Enfrentou todas as instituições, pois depois de 30 anos utilizando-se de sua boca deixou-nos também poesia e indignação em seu livro Cartas do Inferno.

Somente 30 anos depois em 1993, com auxílio de amigos e amigas, conseguiu um suicídio assistido. O que ele acreditava como dignidade para o morrer era o protesto contra sua forma de viver, e o cineasta Alejandro Amenábar o imortalizou, através de Javier Bardem, com o cinema e para além deste.

Ao assistir o filme, lá em 2005, fui mais uma vez lançado ao angustiante tema bioético do direito à morte com dignidade. Propus-me, então, uma metáfora com o título do filme: adentrando no mar, Morto! Muitas vezes é possível que ao se matar o sujeito já se considere ou se sinta de modo fúnebre, já falecido. E esquecido...

Esta metáfora é porque creio que estamos vivendo, todos, na chamada modernidade líquida e aniquiladora, a viver em estados quase paralisados, um tempo de alta salinidade de desamor, com uma dose de estagnação afetiva. Estamos imersos no novo e global mundo Mar Morto. Sobrenadamos, boiamos e continuamos superficiais, inclusive sobre o suicídio.

Pior ainda é quando o banalizamos e o ridicularizamos temerosos, usando discursos fanáticos para apressadamente o conectarmos com um desapego à Vida. Não podemos reduzir esse ato de tanta ousadia ou desespero ao modelo sociológico de Durkeim, apenas à anomia. Precisamos ir além da psiquiatria, da psicologia ou da psicanálise. Precisamos encará-lo como uma questão de saúde e bioética.

O século XXI, assim como o que passou, provocou enormes buracos negros em nossas singularidades. Disse-me em 2005 e repito: estamos em um mar sem ondas, sem pedras ou areias no percurso, um mar onde não pudéssemos ou poderemos nos suicidar pelo afogamento, pois, como já disse, nele boiamos e persistimos superficiais eternamente.

A palavra, e não apenas o ato, ”suicídio” ainda continua um tabu, um dogma ou uma ameaça. Temos de direito e também o dever de ampliar nossas visões, ideias, convicções ou conhecimentos sobre o suicidar-se. Temos de ir além, buscar, além do coletivo, o que faz o sujeito buscar seu próprio assujeitamento à Dona Morte. Quais são os diálogos possíveis com a Senhora Vida que nos levariam a seu pré-conhecimento e, quiçá, novos afetos que não deixariam secar o desejo de viver em nós? Há o direito de sua versão eutanásica?

As estatísticas de ocorrência de suicídios no Brasil dizem ser uma média de 25 pessoas por dia, há, então, alguma outra causa mortis tão presente ao mesmo tempo em que tão invisível? Podemos dizer que o tema é mais grave do que o número de pessoas com chamados transtornos mentais?

Estas são as pessoas que estão, na maioria dos casos, em situação de vulneração e vulnerabilidade para as tentativas e para o suicídio. Entretanto, não devemos ter como principal causa apenas as depressões graves ou persistentes. Há outras situações que nos empurram para a varanda, para convidar a Dona Morte, como solução ou resposta, por exemplo, às desilusões em nossos amores e outros dissabores do viver com intensidade ou tensão.

Há ainda que discuti-lo quando a terminalidade do viver está no ápice do sofrimento e da dor, seja ela psíquica ou física. Os estados terminais, onde os cuidados paliativos não mais aliviam, podem nos tornar ainda mais próximos do que chamo da “visitante da varanda”.

O morrer e a morte não devem ter o mesmo significado, muito embora esteja transversalizados ou subjacentes, um ao outro. Compreendemos e aceitamos os testamentos vitais dos nossos moribundos? Os náufragos sem nenhuma tábua ou resto de seus navios, aqueles que onde não há mais o mar e nem o amar?

Não tenho estas respostas, como não acho que nenhum filósofo já as tenha como certeza, mesmo concordando com Albert Camus. Podemos nos afogar em imensos oceanos de debates sobre Thanatós, Eutanásia, Ortotanásia ou Distanásia. Só não podemos fugir da perspectiva e expectativa de que a Dona Morte ainda é o mais “democrático” de todos os acontecimentos, escapando, como areia no mar, de todas nossas explicações ou teorias.

Para alguns deixo a provoca-ação de vida e ideias de Deleuze, para quem nada há para interpretar ou compreender, mas sim para experimentar, intensamente viver, deixando-se no “mar à deriva”, novos argonautas Pessoanos(como Álvaro de Campos) que se indagam: “Se queres te matar, porque não te queres matar?”.

Então vejamos que ‘Pontes’ para o futuro estamos construindo para os que se suicidam ou tentam morrer. Vejamos nossas multiplicidades, bem como as singularidades. Aquelas que o Mar Adentro pode provocar diferente e multiculturalmente, pois até o Gilles também escolheu se despedir de nós, após lenta e sofrida escalada de sua doença e sofrimento, assim como o fez Freud, que pediu ao seu médico, Max Schur, um único e último alívio. Ambos podem ser tomados como suicídio, os meios e métodos é que foram diferentes: um solitário e o outro assistido.

O SUICÍDIO NÃO É UM FIM,NEM PRECISARIA SER, SÓ QUANDO NEGADO, INVISIBILIZADO, NATURALIZADO.

Copyright/left jorgemarciopereiradeandrade 2014/2015 (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação para as massas)

Onde procurar ajuda quando o suicídio passar pela cabeça e pelo coração

Sociedade Amigos da Vida (Campinas e região) - http://www.sociedadeamigosdavida.org.br/estatisticas.htm

Indicações de leituras ligadas ao texto

Cartas do Inferno – Ramón Sampedro , Editora Planeta, São Paulo, SP, 2005.

Diário do Último Ano – Florbela Espanca, Ed. Publicações D. Quixote, Lisboa, Portugal, 1985.

Manual de Prevenção de Suicídio – dirigido a profissionais das equipes de Saúde Mental

Suicídio - Os Desafios para a Psicologia – CFP – Conselho Federal de Psicologia – (pdf) http://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2013/12/Suicidio-FINAL-revisao61.pdf

O Suicídio (estudo sociológico) – Emile Durkheim – versão em PDF -  http://minhateca.com.br/atilamunizpa/Documentos/DURKHEIM+Emile+O+Su*c3*adcidio,3015822.pdf

Suicídio (ver fatores predisponentes e alguns mitos) http://oficinadepsicologia.com/depressao/suicidio

Indicações de filme para reflexão e discussão:
Mar Adentro, Alejando Amenábar, Espanha, 2005 (DVD) – dublado: https://www.youtube.com/watch?v=9boX5jeckrA
A Ponte, Eric Steel, Documentário,  Eua, Imagem Filmes, 2006 (legendado): https://www.youtube.com/watch?v=OCfhdVArDnI
Solitário Anônimo, Debora Diniz,  Documentário, 2007 (DVD)

Sobre os citados no texto –

Leiam também no blog –

O SUICÍDIO E A DOR - http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2015/09/o-suicidio-e-dor.html

A DONA MORTE É GLOBAL, MAS NOSSO TESTAMENTO PODE SER VITAL. http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/09/a-dona-morte-e-global-mas-nosso.html




OS NOSSOS CÃES desCOLORIDOS - Nossas "depressões" e o Dia Mundial da Saúde Mental http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/10/os-nossos-caes-descoloridos-nossas.html

No INFONOTÍCIAS DEFNET:
BIOÉTICA/SUICÍDIO - Na Inglaterra está em discussão o suicídio assistido como direito - Luta de britânicos por suicídio assistido vai a Parlamento http://infonoticiasdefnet.blogspot.com.br/2014/06/bioeticasuicidio-na-inglaterra-esta-em.html 

quarta-feira, 30 de julho de 2014

A PERFEIÇÃO RACIAL E A DESTRUIÇÃO NASCEM NO MESMO NINHO...

Imagem publicada – uma foto da cidade de Gaza com sinalizadores que são lançados de Israel na madrugada, e iluminam o céu da cidade sitiada, riscos ou traços de fumaça branca, anúncio de bombardeios aéreos maciços, que segundo dados já mataram mais de 1.100 palestinos. Uma fotografia em sépia, com a força de uma noite prolongada que obscurece o futuro da própria História de um povo que já foi também massacrado e exterminado holocausticamente..., um povo que se disse “escolhido”, um grupo humano que se tornou significante de muitas coisas criativas ou destrutivas, e carregou uma estrela de Davi como símbolo de exclusão e vulneração. Hoje as verdadeiras estrelas saíram da faixa, não existe ar que as permitam brilhar... (foto de Khalil Hamra/AP)

“Toda luta entre homens é, de fato, uma luta pelo reconhecimento, e a paz que se segue a essa luta é apenas uma convenção que institui os sinais e as condições desse mútuo e precário reconhecimento. Tal paz é sempre e apenas a paz das nações e do direito, ficção de reconhecimento de identidade da linguagem, que provém da guerra e acabará na guerra.” *(Giorgio Agamben – A ideia da Paz in Ideia da Prosa – Autêntica Ed.,2013)

Os meus pulmões não são perfeitos. Acho que ainda não aprendi a respirar “perfeitamente”. Quem sabe isso é consequência da minha miscigenação genética? Um pouco de cristãos novos, obrigados a ser uma árvore frutífera, lá na Inquisição de Portugal pode ter sido o começo de tudo: tenho o Pereira no nome e no sangue. E, hoje, me sinto palestino e sem ar...

Aliás, para quem não sabe que alguns cristãos novos são judeus, ou mesmo de origem moura, convertidos a ferro e fogo pela Igreja Inquisitorial a se converterem, deixando sob os porões de Lisboa e arredores os seus outros livros sagrados e seus purismos raciais, tornam-se criptojudeus ou massacrados, lá em 1506. Hoje nessa minha mais nova pneumonia, que já passa da quinta em alguns anos, estou pensando que o Google tem razão. Meu sangue deve ser “ruim”.

Hoje li e publiquei o artigo que anuncia uma possível neoeugenização ou neobiotecnomedicina para a ‘’a busca do ser humano perfeito”. Em matéria de Raquel Freire para a Techtudo anuncia-se que o “... Google começou a coletar material genético de voluntários com objetivo de montar um banco de dados de biomarcadores, que mostrarão como um ser humano saudável deve ser. Denominado Baseline Study, o polêmico projeto sobre o corpo e a saúde perfeitos está sendo desenvolvido pelo Google X, o “laboratório secreto” que cuida dos planos mais audaciosos do gigante de Internet...”.

Para mim foi a concretização de uma reflexão bioética sobre como estamos caminhando, cada dia mais velozmente, para uma suposta medicina de prevenção das doenças e do sofrimento, enquanto mantemos uma massa de seres humanos ainda vivendo com o Ebola, a Dengue, e, preferencialmente, com as máquinas mortíferas da guerra ampliando nossas misérias e doenças “tropicais e sub-tropicais”.

Como estarão, agora, milhares de crianças em situação de exposição de guerra no Sudão, na Síria, em Gaza, no Iraque, ou mesmo, nas nossas multiplicantes periferias das megalópoles? Não falo apenas das guerras que vivemos assistindo nas Tvs. Não falarei das que recebemos como notícias longínquas ou que não nos afetam diretamente. Falo e grito sim é sobre os que estão sendo lentamente sufocados, subterraneamente mantidos, ou mesmo, sob novos, e até visíveis, muros de vergonha e de segregação. Os cenários de destruição, após controle biopolítico, em massa. E que comporão a possível “escória” infame a ser geneticamente purificada.

Tenho, por força dessa minha própria condição debilitante física, sido obrigado a reconhecer nossa intrínseca relação com a Dona Morte. O nosso corpo imperfeito/frágil nos obriga a reconhecer o sentido da finitude da Dona Vida. Começamos a nos sentir imperfeitos mortais? E, neo eugenicamente, nos iludimos, aceitando que nosso sangue seja coletado para um “projeto secreto” que irá, no futuro, eliminar todos os nossos defeitos genéticos, inclusive aqueles que nos turvam a mente e nos tornam “transtornados mentais”. Eliminarão a parte “negativa e ruim” de minhas heranças genéticas lá de Portugal ou da África?

A busca de uma perfeição humana é a mesma daquela que originou micro e macrofascismos. Persistentemente, têm adeptos do ‘sangue bom’ x ‘sangue ruim’, ideológica, fanática e religiosamente. É o alicerce dessa discriminação: a chamada ‘perfeição racial’. Já escrevi, aqui, que a ideia de uma raça “pura” antecede aos modelos fascistas ou nazistas do século XX. As suas raízes são mais profundas, mais transhistóricas. A atual utilização do discurso racial no Oriente Médio nos levará, se pesquisarmos, até muito antes dos hebreus e da Terra Prometida.

A atualização do discurso de purificação racial é hoje, por exemplo, em Israel utilizada pelos mais diferentes apologistas desse massacre em ação. Houve até a sua comprovação com o discurso de um ‘professor israelita de Literatura Árabe’ que nos diz que uma forma de impedir os atentados palestinos é cometer um atentado sexual. Diz ele: “...As palavras exatas de Mordechai Kedar, citadas no site do Alternative Information Center (AIC), de Jerusalém, são as seguintes: "A única coisa que pode deter um bombista suicida é saber que, em caso de captura [de quem? - a tradução inglesa não é clara], a sua irmã ou a sua mãe serão violadas".

E, para melhorar ainda a solução final, parecida com as do Dr. Mengele, há ultranacionalistas sionistas que pregam o ‘extermínio’ desses “insetos” que não são uma “raça pura e boa”...E como uma esterilização em massa, no caldeirão bombástico atual de lá, não foi e nem será possível, propõem uma matemática cruenta: para cada israelense morto multipliquem, com as bombas, em no mínimo 100 palestinos “cirurgicamente extirpados”. Não importa se adultos, velhos ou crianças. Talvez, em alguma mente perversa o melhor é seguir o método do Mordechai. Afinal ele não é um professor?

Por isso afirmo que a chamada perfeição racial é nascida do mesmo ninho da serpente da destruição. Dessa construção de uma suposta PAZ fomentando uma industrial e eficiente máquina da guerra. Para a Paz violentadora de alguns que se implante a Paz pela violência e destruição de outros, sejam estes inclusive geneticamente “tão perfeitos como nós”. Diremos que são ‘defeituosos’ e uma ameaça às nossas próprias vidas.

Já vimos esse filme devastador. Os próprios ancestrais, inclusive os meus Pereiras, já virão como é fácil demonizar e exorcizar, com Cruzadas, Cruzes ou Campos de Extermínio, aqueles que passam a ser o modelo social da “impureza, da sordidez, da avareza, da degeneração racial ou mesmo da luxúria”. O Outro “infiel e não crente” só merece mesmo a tortura, a expulsão ou ostracismo, a sua inclusão pelo trabalho escravo, ou melhor, ainda, a sua “eliminação”...

Por essa indignação que me atravessa, transhistoricamente no meu próprio corpo dito impuro, que traz também o sangue de índios e de negros, é que supliquei outro dia, poeticamente para que nos revoltássemos contra essa nova ditadura de um mundo tão perfeito, tão limpo e ao mesmo tempo com tantas ruínas em produção. E ainda continuo e continuarei, nesse sangue miscigenado e brasileiro, buscando alguma coisa contra a perfeição...

E REPITO: A PERFEIÇÃO RACIAL E A DESTRUIÇÃO NASCEM DO MESMO NINHO... E esse ninho pode ser em qualquer mente, corpo ou “coração”, mesmo os geneticamente modificados...

Aí vai para os que não me leram em rede:

O AR É O VERDADEIRO FOGO!
  (para os meus e os seus meninos/meninas em Gaza)

Quantas vezes já sentiram lhes faltar?
Quantas vezes o expiras?
Quantas vezes o sentes?
Quantas vezes, silenciosamente, o escutas?
Quantas vezes foi o ausente?
A sua ausência nem ao fogo permite potência
A sua saturação é o que lhe propaga...
Em nós quem sabe o apagaria?
Penso novamente nele, apenas na pneumonia?
Para o que te tornas tão dependente?
Até lá fora da Terra me prendes?
Se desço profundidades também?
Por isso aqui também sinto sua presença
Onde uma ausência nem mesmo será notada
Caso desejem o impérios tirá-lo do ar...

O ar esse invisível parceiro sendo quase um infiel
Tornou-me, em segundos, sem fôlego, sem forças,
Sem fogo vital...

 Será o mesmo que agora em instantes arde em outras
Faixas sitiadas e cheias de gaze, cheias de sangue, sem chão, sem água e SEM AR?
E, cada segundo ou seus milésimos mais indiferentes,
Nós, que não o perdemos, como respiramos?
Mais aéreos, como as bombas, menos arejados como os túneis.
A nossa hipocrisia e distanciamento, são como respostas,
Como profundos silenciosos, aqueles onde o vácuo das mentes povoa...
Somos afinal respirantes, somos quiçá apenas transpirantes?
Sequem as já desérticas superfícies sensíveis
E nenhuma gota ética será suada por nenhum Genocídio,
Seguem em marcha então, com máscaras anti gases,
Exércitos, massas, seguidores, fanáticos e fascistas,
Seguem retirando a música silenciosa do vento,
Substituem-na por um fogo que só queima o que
De pureza no ar ainda resiste...

E se o teu fôlego e empenho até aqui te trouxe,
Não te iludas que dele, o ar, também és dependente e amante...
ENTÃO, por que, como os torturados, dele privados, o imploras?
FAZ a tua parte, abre agora a tua janela, expande teus pulmões,
E GRITA: nenhuma fé, nenhuma ideologia, nenhum partido,
Nenhum que se arvore a ser humano, nem pequeno ou grande,
Poderá ser, assim como da Terra, do AR o único dono.
Ar, AR, AR-RREFECER, DES-AR-MAR, ASPIR-AR, AO AR AM-AR,
PRINCIPALMENTE SE É ELE O QUE ESQUECESTES... O OUTRO SUFOCADO.
Perdoem-me a falta de pausas, é que falta INS PIRAÇÃO...

Sobram-me a dor, urgência de novos ares, novos pARes, e essa dura constatação:
O AR É O NOSSO VERDADEIRO FOGO.
CESSEM O OUTRO, ELE SÓ TRAZ FUMAÇA...
E o sufocamento. ...

Copyright/left jorgemarciopereiadeandrade 2014 ad infinitum  2023...(favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet ou outros meios de comunicação de e para as massas, TODOS DIREITOS RESERVADOS)

Links de matérias na Internet –


NEOEUGENIA (termo que chamo atenção e alerto há algum tempo) ou a NEOBIOTECNOMEDICINA? – Google quer catalogar material genético para criar 'ser humano perfeito' 

Em inglês (recomendo o texto Jewish Eugenics de Glatt) - NeoEugenics' web site https://www.neoeugenics.net/

The future of neo-eugenics. Now that many people approve the elimination of certain genetically defective fetuses, is society closer to screening all fetuses for all known mutations? https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1794693/ (a partir da questão bioética da “prevenção” dos chamados ‘defeitos genéticos’ e da síndrome de Down, uma discussão sobre o uso de técnicas de ‘eliminação’  desses ‘defeitos’...)

Académico israelita recomenda violação de palestinianas para impedir atentados https://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=754372&tm=7&layout=121&visual=49

PARA ONDE CAMINHA ISRAEL? Deputada israelita anti-racista foi suspensa do parlamento 
Documentário - Homo Sapiens 1900 (Original) Ano produção: 1998 Dirigido por: Peter Cohen Duração: 88 minutos https://www.youtube.com/watch?v=jUXC9dj3Oqw

LEIA TAMBÉM NO BLOG


EUGENIA – Como realizar a castração e esterilização de mulheres e homens com deficiência? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/01/eugenia-como-realizar-castracao-e.html

SEREMOS, NO FUTURO, CIBORGUES? Para Além de Nossas Deficiências Humanas https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/02/seremos-no-futuro-ciborgues-para-alem.html

RACISMOS, BARBÁRIES, FUTEBOL... ONDE ENTRECRUZAM AS VIOLÊNCIAS SOCIAIS? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2014/05/racismos-barbaries-futebol-onde.html

A TOLERÂNCIA É MAIS QUE UM BACALHAU NO MEU FEIJÃO COM ARROZ ? em busca da Empatia , para além da Antipatia... https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/07/tolerancia-e-mais-que-um-bacalhau-no.html

O RETORNO DA INTEGRAÇÃO PELA INCLUSÃO: OS NOVOS MUROS NAS ESCOLAS, FÁBRICAS E HOSPITAIS (e nas fronteiras)  https://infoativodefnet.blogspot.com/2016/08/o-retorno-da-integracao-pela-inclusao.html