Imagem publicada – foto que fiz de um panfleto do Movimento Negro RJ, na comemoração do centenário da Abolição da Escravatura, tendo ao alto: 1888 LEI ÁUREA 1988, sendo 1888 em rosa, LEI em branco, ÁUREA em rosa e 1988 em branco, seguida da fotografia de uma pintura do século XIX, com a representação dos castigos corporais impostos aos negros e negras escravizados, tendo um capataz que segura uma mulher negra, junto ao que aplica uma palmatória em outra escrava, ajoelhada em sua frente, com uma criança ao lado, tendo três outros homens negros, em primeiro plano ao centro, com uma roda de carro de bois, com mais outros escravos ao fundo, aguardando seus castigos, principalmente aos que eram chamados de “negros rebeldes ou fujões”. Segue-se em letras vermelhas: NADA MUDOU. Abaixo está a fotografia de um policial militar que traz um grupo de homens negros amarrados por cordas nos pescoços, uns aos outros, em fila, com quatro deles em primeiro plano... Segue-se, em baixo dessa foto, do ano 1988, a convocação: VAMOS MUDAR, convocando para a MARCHA CONTRA A FARSA DA ABOLIÇÃO (Participe – 11 de maio – 16 horas – Candelária – Movimento Negro – RJ). Será preciso descrever mais? Ou ainda continuamos convivendo com uma nova “cegueira branca”?
“2.4 A tolerância pode ter a forma da marginalização dos grupos vulneráveis e de sua exclusão de toda participação na vida social e política e também a da violência e da discriminação contra os mesmos. Como afirma a declaração sobre a Raça e os Preconceitos Raciais, “Todos os indivíduos e todos os grupos têm o direito de ser diferentes” (art. 12)
A citação é parte da Declaração de Princípios sobre a Tolerância, uma declaração da Unesco, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura reunidos em Paris em virtude da 28ª Reunião da Conferência Geral, que proclamou o dia 16 de novembro como o Dia Internacional da Tolerância.
Há apesar dos anos e lutas, a manutenção da imagem da foto de 1988? Lamento dizer que sim, apenas os meios de aprisionamento, encarceramento e de violentação, assim como vulneração, dos corpos e das vidas de negros é que se tornam menos ‘visivelmente acorrentadas e acorrentadoras’. As novas e modernas cordas em nossos pescoços são mais sutis e aperfeiçoadas. Estão também em nossos inconscientes colonizados e colonizadores.
Muitos ainda questionam o porquê e para que termos de inventar/respeitar um Dia da Consciência Negra? Aos que ainda têm dúvidas e aos intolerantes envio alguns dados:
- A maioria dos homicídios que ocorrem no Brasil atinge pessoas jovens: do total de vítimas em 2010, cerca de 50% tinham entre 15 e 29 anos. Desses, 75% são negros.
- Segundo o Mapa da Violência (2013): “... Podemos verificar que no conjunto da população:
• O número de vítimas brancas caiu de 18.867 em 2002 para 13.895 em 2011, o que representou um significativo decréscimo: 26,4%.
• Já as vítimas negras cresceram de 26.952 para 35.297 no mesmo período, isto é, um aumento de 30,6%.
• Assim, a participação branca no total de homicídios do país cai de 41% em 2002, para 28,2% em 2011. Já a participação negra, que já era elevada em 2002, 58,6% cresce mais ainda, vai para 71.4%.
• Com esse diferencial a vitimização negra passa de 42,9% em 2002 – nesse ano morrem proporcionalmente 42,9% mais vítimas negras que brancas – para 153,4% em 2011, em um crescimento contínuo, ano a ano, dessa vitimização”.
Em artigo de minha autoria publicado no livro O que é Violência Social, que está sendo lançado na III Conferência Internacional - Dinâmicas Sociais em África: Rupturas e Continuidades, na Universidade Eduardo Mondlane e seu Centro de Estudos Africanos, em Maputo, Moçambique, afirmo, ao analisar estes e outros dados de nossas exclusões e segregações sociais alimentando o genocídio de toda uma juventude negra, quando se trata da questão da cor da pele no Brasil, que: “Entre 2002 e 2010, segundo os registros do Sistema de Informações de Mortalidade, morreram assassinados no país 272.422 cidadãos negros, com uma média de 30.269 assassinatos ao ano. Só em 2010 foram 34.983...; um dado que confirmava também o decréscimo de mortes da população branca, com um crescimento de mortes violentas, principalmente junto à juventude, de cidadãos e cidadãs negros...”.
Nesse quadro, já comprovado e denunciado teríamos ainda dúvidas sobre a necessidade de estímulo das nossas “consciências”, para além de que etnias, raças ou cores estivermos sendo biopoliticamente classificados?
A questão de aceitação do Outro e das suas diferenças é que nos dá parâmetros e limites para o que chamamos de Tolerância? Sempre digo que temos que ir além da aceitação, precisamos antes do re-conhecimento desse Outro, dessa Alteridade, no mais profundo de cada um de nós. Um dia apenas de conscientização não mudará todas as ‘más-consciências’ e nem aplacará a nova Onda de intolerância, fascismos e/ou racismos de todas as colorações e conotações.
Precisamos, urgentemente, da prática ético-política cotidiana dessa construção de novas culturas e mentalidades. Conseguiremos afrouxar os grilhões e mordaças que nos impuseram? Precisamos nos re-conhecer como in-tolerantes do Outro e dos Outros além de nós.
Por isso é que afirmei estarmos ainda com várias cordas e cordões nos aprisionando, visíveis e invisivelmente, transversalizando nossas relações, sejam sociais, micropolíticas e/ou amorosas. Há ainda debaixo dos tapetes de nossas culturas e história uma densa camada de poeira dos preconceitos mais arraigados. Entre eles está a presença negada desses escravizados que nos tornam seus afrodescendentes.
Avisem os ex-presidentes que “todos temos os pés na cozinha da mãe África preta e retinta”. Somos todos e todas mais Libéria do que libertos por nossas áureas leis. Somos na essência do humano e da humanidade mais negros, embora nos distanciemos do continente multifacetado e multicultural que chamamos de Mãe África.
Ainda jovem, muito influenciado pelas Marchas pelos Direitos Civis, por Martin Luther King, Malcolm X, Angela Davis e outros negros e negras “rebeldes”, que desejavam outro lugar social e político, escrevi um poema que chamei de Negrume. Dizia, se lembro destes anos ginasiais, perto de 1968, que ‘devíamos nos livrar do que nos impunham... pois já havíamos lavado com sangue coagulado... a mancha de nosso, do só nosso, do meu e do seu: Negrume”. Anos depois descobri minhas novas implicações. Tornei-me, temporariamente, mais uma negritude.
Um efeito e contágio com a poesia de Aimée Cesaire. Sempre a poesia, aquela que me trouxe a compreensão de que há um Outro, que este não é um lado “negro”, mas que nos habita que deseja sempre mais liberdade, mas ar, mais espaço, mais tempo, enfim, mais Vida. O conceito de negritude tornou-se, por sua radicalidade de orgulho e valorização da cultura negra, minha nova arma de luta contra todas as discriminações. Os eurocentrismos em mim se desmontavam, desfaziam-se ...
Por isso desejo que possamos combater novamente com “novas” negritudes, tornadas novos rizomas para criar novas cartografias. Em tempos de ódios, além dos raciais, também macropolíticos, ainda acredito que alguns possam se contagiar dessa busca onde o cultural poderá ficar acima do político e dos políticos. Onde se ultrapassaria, como os tigres e suas tigritudes, ir além dessas negritudes do passado. Ir além do consciente autorizado, buscar a radicalidade de liberação dos nossos inconscientes sob eterna captura e colonização.
Como no texto inicial deixar florescer em nós, e além de nós, rompendo todos os limites e limitações, a afirmação da Diferença não só como direito ou necessidade, da diferença que nos torna mais Potência Zumbi, libertária, do que a ruptura de conceitos e preconceitos, inclusive dos racismos enquanto ideologias.
Em tempos, de marchas ré, de neo-pastores fundamentalistas, fascistas de plantão, intolerantes pelo indiferentismo, lobinhos maus, lobões, espertos ao contrário, falsos tolerantes e negociadores dos medos que apregoam a Ordem como segurança, urge e ruge em mim o desejo de ir além, o desejo que vai além da vacina para o Ebola. O desejo sem fronteiras, para além das Áfricas. Em mim, urge, como poesis, sob a pele indelevelmente negra, o apelo para a re-existência e a resiliência.
Como no pedaço de meu papel rabiscado dentro do livro sobre Billie Holiday e a biografia de uma canção – Strange Fruit: -
“Ai quem me dera um dia, apenas um dia sem dor ...
A dor de ser demasiada e apaixonadamente humano,
Sempre com a mesma cor, sempre Negro
Entretanto, apenas um Outro, um Outro Pessoa...”
Quem sabe me acordo, como já recordei, em um mundo e tempo onde já sonhei, com menos meninos e meninas negras vulnerados e violentados? E, po-éticamente, alguma consciência despertarei?
Copyright/left jorgemarciopereiradeandrade (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação para e com as massas)
INDICAÇÕES PARA LEITURAS CRÍTICAS, REFLEXÕES E COMBATE DAS DISCRIMINAÇÕES E RACISMOS –
VIOLÊNCIA CONTRA A JUVENTUDE NEGRA NO BRASIL – Pesquisa de Opinião Pública Nacional – DATA SENADO – Novembro de 2012 - http://www.senado.gov.br/senado/datasenado/pdf/datasenado/DataSenado-Pesquisa-Violencia_juventude_negra.pdf
JUVENTUDE VIVA - Homícidios e Juventude no Brasil – Mapa da Violência - Julio Jacobo Waiselfisz, Brasília, 2013 http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2013/mapa2013_homicidios_juventude.pdf
MÍDIA E TOLERÂNCIA – A ciência construindo caminhos de liberdade – Margarida Maria Krohling – Roseli Fischmann (Orgs.), Editora EDUSP/Unesco, São Paulo, SP, 2002.
O QUE É VIOLÊNCIA SOCIAL - Antônio Zacarias, Daniel dos Santos, Jorge Márcio Pereira de Andrade, Ricardo Arruda, Escolar Editora, Coleção Cadernos de Ciências Sociais (Org. Prof. Carlos Serra), Lisboa/Maputo, Portugal/ Moçambique.
Na Internet –
Negritude http://pt.wikipedia.org/wiki/Negritude
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RAÇA, RACISMO E IDEOLOGIA: ZUMBI ERA UM VÂNDALO, UM BLACK O QUÊ?
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A CONSCIÊNCIA INCLUSIVA E O RACISMO NA ESCOLA
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QUAL É A SUA RAÇA? - Nada a declarar...
http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2010/11/imagem-publicada-uma-foto-em-preto-e.html
http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2010/11/imagem-publicada-uma-foto-em-preto-e.html
"...digo que temos que ir além da aceitação, precisamos antes do re-conhecimento desse Outro, dessa Alteridade, no mais profundo de cada um de nós. Um dia apenas de conscientização não mudará todas as ‘más-consciências’ e nem aplacará a nova Onda de intolerância, fascismos e/ou racismos de todas as colorações e conotações." Assim reafirmo.
ResponderExcluirQuerida Sonia
Excluirobrigado por sua reafirmação de meu texto e palavras, mais ainda pelo carinho na leitura atenta, espero que minhas ideias possam ajudar na busca de re-conhecimentos sobre essas alteridades que insistimos em negar... e Pessoa e Florbelianamente possamos ''ser cada dia mais um Outro e outro mais...." um doceabraçocomZumbinocoração jorgemárcio
Belo texto esperança. Revive a utopia galiana, a esperança que faz caminhar. Temos o passado: navios negreiros, a Frente Negra Brasileira (década de 30/SP), movimento negro pós anistia (negro é lindo)... atualmente, os rolezinhos, vitimização do jovem negro pela violência urbana, "macaco" no futebol. Me pergunto se esta geração de pessoas negras que tomba a toda hora, não fará a diferença? Se os movimentos sociais, a escola, as políticas públicas de afirmação positiva, enfim uma rede de proteção articulada com o desenvolvimento da consciência de negritude (ideia de pertencimento, de orgulho afrodescendente) e acesso a cidadania darão a estes jovens um perfil de negros vencedores, consumidores de regalias brancas também, principalmente o direito a vida? Doceabraço, Jorge.
ResponderExcluirQueria sempre Louca pela Vida
Excluiro seu comentário faz indagações que urgem serem, individual e coletivamente, respondidas... e traz a vontade de que possamos lutar contra a extensão sutil dos modos dominantes de escravidão e genocídio, com luta permanente para que as cicatrizes geradas não sejam revivenciadas pelos mais jovens, os que ainda são chamados de macacos e ficam marcados para a vida toda com esse rançoso estigma... O orgulho que pode, junto com a empatia e a generosidade, vir a ser os lenitivos e vacinas contra os ódios arraigados vem sendo aplicado, mesmo que como 'doses mínimas', através de mudanças mais culturais que políticas... e isso dependerá sempre de pessoas livres e conscientes criticamente de seus papéis como você... um doceabraçocomAPOTÊNCIAZUMBIEMNÓS jorgemárcio
Ainda guardo a corda com que fui pra rua quando amarraram meus imãos pelos pescoços e 1982
ResponderExcluirinfelizmente, o racismo não acabou. Nos BANCOS, etc.
ResponderExcluirquando não estamos do lado oposto da linhaa (ela existe0)
QUANDO NAO nos inserimos e queremos nosso direitos (teóricos) Nubia
Séculos e mais séculos se passarão para que se redima essa dor e se recoloque um ser humano negro no seu lugar de humano.Mais outros séculos serão necessários para que esses dois tons de pele possam se
ResponderExcluirharmonizar, se aceitar, se amar sem o limite do preconceito, sem medo. Só feliz descoberta.
Caro Anônimo ou Anônima agradeço o comentário e lhe informo que a questão racial ultrapassa a harmonização 'desses dois tons de pele", pois os racimos incluem milhares outras "peles", inclusive as dos indígenas brasileiros que entraram no nosso projeto dos colonizadores de harmonizar pela miscigenação, incluindo até os cientistas e sociólogos, na produção de um 'paraíso tropical sem questões raciais '. Entretanto, os pesquisadores atuais reconhecem que alguns estavam imbuídos é de um desejo EUGÊNICO de invenção da "raça dourada"... O que posso dizer é que ainda temos o preconceito racial, mas há outras formas de preconceito que se aliam a ele, como atualmente no nosso país que tem preconceito com "nordestinos", por exemplo, mesmos que sejam brancos e de olhos azuis, a demolição de preconceitos e discriminações passa por um processo de conscientização que ainda temos de fazer avançar. Lamentavel que hoje esteja escrevendo após uma medida provisória de um presidente provisório que EXTINGUIU o Ministério das Mulheres, da IGUALDADE RACIAL e dos Direitos Humanos... espero que possamos lembrar um pouco de HISTÓRIA para nossos representantes dos macropoderes, como por exemplo, a questão de quantos NEGROS FORAM TRAZIDOS POR NAVIOS NEGREIROS no Brasil Colonial - ""O Brasil teve, na sua curta história de 501 anos, 350 anos de regime escravocrata e apenas 100 anos de trabalho livre. Não levamos em consideração os primeiros 50 anos, quando praticamente o único trabalho era carregar nossa riquezas naturais para fora. Em 1817, o Brasil tinha 3,6 milhões de habitantes e 1,9 milhão de escravos, ou seja, mais da metade da população. Em 1850, esse número pulou para 3,5 milhões.
ExcluirNo total, nosso país trouxe da África 4 milhões de escravos, quase a metade importada por todo o continente americano
.Com os números acima, pode-se afirmar que o Brasil foi fundado e teve o seu desenvolvimento e a sua economia baseados no trabalho escravo, o que não deixa ninguém orgulhoso, muito pelo contrário. Só no Rio de Janeiro, entre os anos de 1790 e 1830, chegaram 700 mil escravos trazidos por cerca de 1600 navios. Em Salvador, segundo maior importador de escravos, também nessa época, os trabalhadores forçados representavam mais de 40% da população..."
Escravidão, um passado para esquecer?
É urgente abrir os olhos, a mente, o coração para construir uma cultura de superação, valorização, sem preconceitos, onde não haja mais discriminação, ódio, escravidão, volência com pessoas pela diferença, cor da pele! O negro seja valorizado, reconhecido e tenha os mesmos direitos e juntos cresçamos com essa bela cultura APOTENCIAZUMBIEMNÓS!
ResponderExcluirNegamos nossa negritude, da mesma forma como homofóbicos negam suas incertezas, escondendo-se atrás de uma macheza da qual duvidam. E assim, matam, como se pisassem em uma barata, calcando-a baixo à sua sola, acreditando com isso, matar aquilo que negam. Não é só triste, é vergonhoso! Mas são pequenas as minhas esperanças de que tais vergonhas possam ser revertidas, de que nos transformemos todos em irmãos, onde irmãos não nos classifiquem pela cor de uma pele, mas apenas por nossos corações, todos, da mesma cor... Importante: Avisem os ex-presidentes (e a todos os demais) que “todos temos os pés na cozinha da mãe África preta e retinta”. dulcenegroeenternecidoabraço!
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