terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

MULHER (ES), PODER (ES) E O(S) MEDO (S)...

Imagem publicada – uma foto (de uma série) da minha janela voltada para o pôr do sol (da deusa Disis), que intensifiquei como fogo no céu, acentuando os alaranjados, os azuis e os amarelos (próximos do que amo em Van Gogh), tempo visível com a sombra dos prédios que todos os dias posso avistar de minha janela aprisionada pelo tempo visto como passado, mas que se torna uma fulgurante demonstração de como podemos rever e transver nossas próprias horas, e se torna um tempo-vida-imaginação...

...’Esqueço as horas pensando em outras horas de quem tem poucas horas ou muitas horas. Ora Hora!... Não penso nas horas; elas e que me pensam’...

Preciso do silêncio e da negação de todos os sons para tentar pensar. Outro dia fui lembrado, nas ‘altas horas da madrugada’ que precisava me cuidar com a passagem do Tempo. Lembravam-me que, humano ainda, tenho um corpo físico e uma suposta saúde a deixar descansar. Este texto, como parto prolongado, nasceu em horas sem ruídos metálicos ou zumbidos alienantes. Em horas que não cabem nos relógios digitais ou ampulhetas.

Respondi com a frase acima, relâmpago afetivo, mais ou menos, sobre minha relação com as horas. As horas são e serão sempre femininas. As horas, conforme a mitologia grega são mulheres. Seriam as mulheres de Atenas? Aquelas cuja cidadania era negada, aquelas equiparadas apenas aos escravos. Ou seriam e são as guardiãs do Olimpo que organizam a passagem das estrelas? As que trazem a fertilidade da mudança?

Na versão apresentada pela Wikipédia são: - “As horas (em grego:  Ώρες, em latim: horae) constituíam, na mitologia grega, um grupo de deusas que presidiam as estações do ano. Filhas de Zeus e Têmis eram três deusas que personificavam a ordem do mundo. Eunômia (Εὐνομία, "legalidade") representa a legalidade, a boa ‘ordem’, as leis cívicas. Eirene ou Irene (Εἰρήνη, "paz") representa a paz. Dikê ou Dice (Δίκη, "justiça") representa a justiça”.

As horas também têm suas versões latinas. São também o tempo, as estações, as passagens dos momentos, das atividades de um dia ou as épocas. Quais seriam, hoje, as épocas que vivemos ou que nos dizem ou permitem ser vividas?  Vivemos o tempo em que a(s) Mulher (es), o(s) Poder(es) e o(s) Medo(s) encontram-se na(s)  mesma(s) encruzilhada(s)?

Como disse são, hoje, agora, nesse instante fugaz, nesse segundo, quando toco as teclas das letras que elas, as horas, aquelas deusas me assombram. Permitem-me, reles mortal, a aspirar com elas ainda sonhar com utopias, com as outras invenções gregas, tal qual a democracia. Entretanto, nesse mesmo passado do relógio, a História me diz que as deusas passaram a servir a outros ordenadores burocráticos do mundo.

Onde foram parar, pelo menos nesses territórios mais próximos, agora recriadores de novos muros e novas instituições, a legalidade, a Paz e aquela que pendula entre a espada e a balança? Passaram a ser apenas servas do Estado Nação ou de um novo Estado de Exceção?

Porém, se são Mulher (es) como já escrevi nos seus Dez(s) Mandamentos por aqui, não seguem os caminhos predeterminados pelos governantes mortais. Não se tornam, apesar de nossa persistência histórica, em escravas de um Tempo dos temores e dos desamores. Não se deixam capturar, completamente, pelas novas formas sutis de colonização de seus corpos e mentes.

O feminino e seu gozo não são visíveis. Não há e nem haverá a possibilidade de sua total dominação. Nem mesmo pelas armas ou pelos exércitos ou pelas microfascistações do cotidiano e suas falsas horas. São, mesmo as mais humilhadas, ricas de outro modo de devir, outros poderes, outras desterritorializações e fugas. São e serão, mesmos as mais duras, profundamente, como as deusas, inspiradas pelas suavidades, caso contrário seus opostos se tornam soberanos.

As mulheres podem vestir togas, podem usar fardas, podem e devem cair nas homogeneizações e binarizações/dualidades. São sujeitos sociais, assim como todos os gêneros e indivíduos. Mas nenhum de seus uniformes retirará de seus corpos as suas castrações, ao contrário, podem acentuar suas falicidades. Como horas, passantes, mutantes e mutáveis, surpreendem e se surpreendem, como as heterogeneidades de formas de amar, apaixonar ou inventar. Elas são e serão uterinas, mesmo quando histerectomizadas pelos homens ou pelas novas tecnologias. Ou mesmo por outras mulheres in-vestidas de autoridade(s).

Para que continuemos a busca do feminino como liberdade, embora nos tenham levado às ilusões temerosas, cabe à(s) mulher (es) o restabelecimento do equilíbrio que as horas, não mais reificadas ou endeusadas, nos ensinaram e ensinam a desejar ir além dos permitidos. Ir além, dos preconceitos, das discriminações, dos mitos, das falácias, dos podres poderes e, principalmente do Medo.

Como, então, a partir das muitas feminilidades, das muitas multiplicidades, das singularidades e das pluralidades de ser e existir poderemos enfrentar essa Cultura do Medo? A resposta recente me veio de releituras de Espinosa e as novas de Antonio Negri sobre o filósofo polidor de lentes e mentes. De lá extrai o conceito de tempo vida e não de temporalidade. O viver como duração e não durabilidade.

Para A. Negri: “A filosofia de Espinosa exclui o tempo-medida. Ela apreende o tempo-vida. É por isso que Espinosa ignora a palavra ‘tempo’ – mesmo fixando seu conceito entre vida e imaginação. De fato, para Espinosa o tempo só existe como liberação. O tempo libertado se faz imaginação produtiva, radicada na ética. O tempo liberado não é nem devir, nem dialética, nem mediação. Mas ser que se constrói, constituição dinâmica, imaginação realizada. O tempo não é medida, é Ética...”.

O tempo é da ‘hora’ que retoma a Eunomia. Tal como o corpo feminino pode, se for libertado, se tornar o ser da revolução, da contínua escolha ética da produção. Do direito de não ser apenas um corpo reprodutor, mas aquele que enriquece o ser.

Pelos corpos que mesmo negados, ou ainda sob desmandos, ou sob midiatizações espetaculares, é que afirmo que a hora é a do ser-mulher, como forma de potência e transformação. Afirmo que, diante dos nossos desencantamentos coletivos, não nos iludamos com as organizações, mesmo as globais ou globalizantes.

A hora é a do desafio da quebra de alguns paradigmas. Macro e micropolitica-mente. A hora é do afirmar o respeitar as ‘minas’, mas tomando cuidado para pisar nas mesmas que alguns querem, belicosamente, semear em nossos caminhos e passos.

Quando, dos poderes visíveis, das ditas autoridades do alto, nos vem o anúncio de novos muros, novas discriminações, novas guerras, que muitos aqui não vêem como já existentes, as horas se tornam mais urgentes. Precisamos das outras horas, pois há sim outras deusas-horas, como Disis, que era a deusa da finalização do dia, o por do sol.

Este texto não crepuscular é um apelo, não uma alegoria, que convoca/provoca às mais poderosas e destemidas, às que podem abrir as portas de corações, podem encantar avenidas, podem desafiar ditadores, podem lançar foguetes no espaço, podem revelar verdades e desmitificar as ondas de alienação e submissão. À(s) Mulher(es) com o(s) Poder(es) de demolir(em) todo(s) o(s) Medo(s)...

(copyright/left jorgemárciopereiradeandrade 2017 ad infinitum, favor citar o autor em republicações livres pela Internet e outros meios de difusão, comunicação ou manipulação de massas...)

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