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sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O DIREITO A DOIS CADERNOS, QUAL É A NOSSA PREFERÊNCIA? Incluir e/ou Excluir?

Imagem publicada – uma fotografia colorida de um mural, em um prédio, no Bairro da Liberdade, São Paulo, SP, com 08 cachorros diferentes, de cores diferentes (azul, laranja, rosa, verde, amarelo, vermelho, laranja com marrom nos olhos), segurando dois grandes cartazes, onde está escrito: EDUCAÇÃO BÁSICA DE QUALIDADE PARA TODOS e ACABAR COM A FOME E A MISÉRIA, com um poste à esquerdade PROIBIDO ESTACIONAR, com prédios desenhados ao fundo e nuvens, na direita um osso desenhado com a autoria do mural -foto de meu arquivo pessoal.)

“... a discriminação negativa não consiste somente em dar mais àqueles que têm menos; ela, ao contrário, marca seu portador com um defeito quase indelével. Ser discriminado negativamente significa ser associado a um destino embasado numa característica que não se escolhe, mas que os ‘Outros’ nos devolvem como uma espécie de estigma...” (A Discriminação Negativa – Cidadãos ou Autóctones? Robert Castel, 2008).

Somos nós, os Outros, como grifei no texto de Castel, que temos a alteridade e a também certa autoridade para forjarmos a exclusão desses diferentes de nós.

Peço desculpas aos meus leitores e leitoras, desde junho não conseguia escrever para vocês. Minha própria auto exclusão se fazia motivo de meu silêncio de escrevinhador. Sim, escrever é um ato doloroso e espinhoso, parece fácil, mas não é como a simplificação do que fazemos diante dos nossos cotidianos como excludentes, não como excluídos.

Resolvi revirar meu baú de textos, estava com a reflexão sobre as multidões que vivemos recentemente. Fui passear há 11 anos atrás, em 2002, quando publiquei um texto, em fevereiro, como o título: O Direito a dois cadernos. Vou reproduzi-lo, parcialmente, e tentar reacender e reviver o momento que o desencadeou. Caso encontrem algumas coincidências é mera responsabilidade de todos nós como autores, atores ou espectadores, ou melhor, se fôssemos espect.-atores.

CENA 1 – Supermercado da Rede SUPER. Uma grande cidade, uma metrópole. Um menino. Uma fila de consumidores. 01 Caderno e uma 01 caixa de ovos. Um olhar.

Há dias, escrevi lá no passado, venho me questionando acerca da literatura, principalmente do uso pouco criativo, na televisão e na vida de todos nós, do visionário e escritor George Orwell (1903/1950). É o conhecido autor do romance ‘1984’. O Grande Irmão (Big Brother) naturalizou-se e foi banalizado. Mas uma vez a Sociedade do Espetáculo e do Controle nos enfeitiça e domina. Outra vez a mais não olharemos para outros monitores ou tele telas que nos seduzem.

Indagava-me há tantos anos o mesmo que agora, diante de um mundo pós-Snowden, sobre os nossos modos de ver e se distanciar do que Bauman chama de “vidas desperdiçadas”, ou seja, o que ele chama de ‘refugos humanos’, ou melhor, os seres humanos tornados descartáveis, como efeitos de nossas novas economias neoliberais do hipercapitalismo.

Voltemos, então, a Cena 1: Eis que estou, como natural que é, numa fila de consumidores, dentro de um supermercado. Obedientemente empurrando o meu carrinho de compras, poucas. Olho em volta e tudo é estímulo para o consumo. Novas marcas, novos marketings, novas seduções, novos e brilhantes produtos embalados.

Lá fora, na porta de entrada, a violência explícita (o olhar fiscalizador dos seguranças). No perímetro do caixa, limite e limitação, meu olhar consumido é despertado. Passa um garoto, sandálias de borracha, calças curtas e olhar vago ou pedinte (ainda não encontrei outros modos de descrevê-los). Visivelmente pobre, visivelmente empobrecido, visivelmente excluído (como o que nos disse Castel).

Ele traz nas mãos: 01 (um) caderno espiral, desses de 200 folhas e uma 01 (uma) caixa de ovos tipo extragrande. Ele passa e pede aos participantes das filas: - “Moço, moça, paga para mim essas coisas...”.

Todos olham, se entreolham, disfarçam, ele passa, o Supermercado está lotado. É dia do pagamento dos assalariados. Como já naturalizamos também nossa permanência em filas (Bancos, Correios, INSS, Loterias, Hospitais, etc...), ele passa... Ele se afasta. Em seguida abandona o caderno numa prateleira de papel higiênico. E continua a sua peregrinação suplicante. Os autorizados na fila enfileirados, ordeiramente, apenas nos entreolhamos de novo.

CENA 2 - A caixa do supermercado, a fila, o olhar desconfiado, a insegurança.

Eis que surge a pérola que me fez pensar sobre os 02 (dois) cadernos: uma mulher, negra como eu, também excluída como alguns ali presentes, mas que não se deu conta, ainda, da sua condição, olha para algumas pessoas enfileiradas e se justifica: -“se ele tivesse apenas pedido os ovos, eu até pagaria...”

CENA 3- 01 (um) Outdoor enorme, uma imagem de um computador e seu processador de dados, uma família reunida em torno dele, felizes.

O outdoor anuncia a chamada para o lançamento da Intel e do novo Windows, com uma frase rica de significados e significantes: “INVISTA NO SEU FILHO, ELE PODE RENDER UM GÊNIO”. Lá estão estampados uma menina, um menino, um laptop e o rosto de Einstein (sem a língua para fora!).

Autorizei-me, e ainda não me arrependi, em ‘compartilhar’ minhas indagações surgidas desse encontro triste. A primeira é: qual é a minha, a nossa dívida para com estes meninos e meninas que estão nessa situação de rua?

Vocês primeiro interrogaram se eu paguei os ovos ou o caderno? Eu também não paguei os ‘dois’ cadernos que o menino (a) trazia na mão. Eu também não retruquei à senhora que falou da sobre a escolha (que não era de Sofia). E, mais ainda, não me indignei, naquela hora, com toda essa situação. Por quê? Temor da atitude grosseira dos seguranças que expulsam essas crianças desses espaços?

Não, apenas era mais um nessa fila dos que pensam: quem sabe isso é uma ‘pegadinha’. Ou pior, no modelo panóptico e paranoico do orwelliano 1984, não agir é porque não estamos em uma gravação feita por uma câmera de segurança, ou uma câmera de televisão que nos mostrará para todo o país. Não me sentia, naquele instante, diante do refugo social, tão ‘global’ ou minimamente solidário.

Era, ou melhor, continua sendo, apenas mais um na fila. Era, lamentavelmente, e continua sendo apenas uma cena ‘local’. Triste, repetitiva e banalizada. Ou seja, natural, comum, rotineira, cotidiana, sempre igual. Mas a visão não é do antigo Big Brother, que estava, segundo Bauman, “preocupado em ‘incluir’ – integrar, colocar as pessoas na linha e mantê-las assim...”.

No nosso reality show pós-moderno estamos aplicando um novo Big Brother. Sua função e eficácia é a Exclusão. Como diz o sociólogo para: “identificar as pessoas ‘desajustadas’ no lugar onde estão, bani-las de lá e deporta-las para o lugar ‘que é delas’, ou melhor, jamais permitir que se aproximem...”.

CENA 4 – A caixa reclama, o segurança age, a fila permanece, e todos e todas pagam suas compras.

Acho que apenas alguns se interrogaram: Meninos e meninas com fome de quê? Eram 22 (vinte e duas) horas e o Supermercado Brasil estava fechando suas portas, para que os telespectadores da vida pudessem assistir ao ‘’Big Brother” da Rede Globo, em dobro. Um último olhar do consumidor me lembra na porta: “Sorria você está sendo filmado”... Estamos, enfim, seguros e vigiados.

Ora, ora, alguém vai perguntar: hoje nessa nossa evolução social e econômica não retiramos esses refugos da marginalidade, da fome e das ruas?
Porém, hoje, estou renascendo de minhas próprias cinzas escrevinhadoras para lembrar que já naquela época estive, também, anestesiado. Mas, entretanto, contudo e todavia tenho que lembrar também que já me indagava sobre as cenas e sua relação com as pessoas com deficiência.

Me perguntei se naquela cena dos pedidos à fila do supermercado, numa nova classificação sobre deficiências, se o ‘menino(a)’ pedinte não poderia ser ‘incluído’ como uma criança em situação de deficiência. Quem sabe, talvez, pela naturalização os ovos seriam pagos por mim ou outro ‘filante’, como manifestação de piedade ou caridade? Quase certo que sim, pois estávamos em um ambiente, como os shoppings de hoje, ‘totalmente seguros e assegurados’.

Não nos encontrávamos, fechando os vidros dos carros, nos cruzamentos das ruas, nos semáforos. E o pedido de pagamento não era um pedido de resgate, apenas, nos gerava aquela repulsa ou preconceito que já deixamos lá no cantinho dos nossos inconscientes.
Afinal para quê alimentar de ‘ luz’ àqueles que só reclamam de um ronco na barriga? Nós, os da fila, não acreditamos ainda na dicotomia entre intelecto, aprendizagem e estômagos?

Enfim, tudo isso que escrevi e refleti são apenas ‘cenários’? Ou seja, será que ele só inventou ou é apenas uma ficção ‘real’? Tudo isso foi, é e continuarão sendo cenários para falarmos de uma exclusão que está imbricada com a inclusão. A existência das fomes, todas as fomes, principalmente aquela que preocupava Paulo Freire, a educação, como um direito inalienável dos cidadãos e cidadãs, acaba sendo denunciada pela a sua ausência.

Recentemente, uma ameaça partida de não sei onde, gerada por interesses que não sei de quem, mas todos, excepcionalmente, sabem, fez um termo velho, ‘preferencialmente’, ser motivo de uma grande e polêmica disputa. Os meninos ou meninas dos Supermercados Brasil, mais ou menos uns 03(três) milhões, fora da escola devem ser ‘incluídos’, preferencialmente, em uma escola especializada em prevenção de futuras atitudes violentas ou transgressoras? A fundação que cuida deles e delas não é chamada também de centro de reabilitação? Essa fundação não é uma escola ‘especial’?

Voltemos, enfim, às cenas e às suas interrogações necessárias. Disse no passado e agora confirmo: - é aí que surgem as exclusões sociais e os discursos que as legitimam. Na pobreza e na miséria, humanas, dizem que quem tem um “ovo” torna-se rei, é soberano. Portanto, para quê os da fila se indignarem com essas exclusões? Para quê precisamos de cadernos de papel? Os direitos não são, também, de papel?

Por essas perguntas que não tenho o dever de responder sozinho, já que a gramática que pode mudar radicalmente os paradigmas não aceita ser apenas preferencial e exclusiva, é que insisto e lanço mais uma pergunta: Porque não damos 02(dois) cadernos, o de papel e o digital, para todos os meninos e meninas, com ou sem deficiências (inclusive as sociais), para que juntos, com todos os recursos e respeito às suas singularidades, exatamente por suas diferenças, eles e elas não tenham de escolher apenas um caderno? Ou não queremos quebrar esses ovos?

 Ou então, para acabar com as querelas e continuar na fila, com os corações blindados e as mentes capturadas, vamos distribuir, preferencialmente, à mão cheia, um único caderno onde se escreve repetidas vezes: - Eu não sou parte daquele show, eu não pertenço àquele mundo, eu sou do time que fica de fora, muito embora me convidem para uma breve passagem pelo grande campo, também excludente, chamado de Inclusão.

Já mandamos restaurar os nossos sofás que recentemente foram parcialmente danificados pelas imagens teleguiadas, porém vandalizadoras daqueles baderneiros que queriam erradicar, radicalmente, essas exclusões?  Não se esqueçam de que a rede social dos Supermercados Brasil está promovendo, com toda segurança, o lançamento do meio de controle de nossas necessidades básicas: o ‘embolsa tudo’. Com satisfação e gozo garantidos, sem ter qualquer dinheiro de volta.

AVISO AOS NAVEGANTES (também chamados hoje, pós tempos de espionagem virtual e até presidencial, after Snowden, de cidadãos e cidadãs de ‘vidro’, ou seja, total e amplamente transparentes para o Estado e o Mercado): quem encontrar um menino ou menina pedintes de ovos e/ou cadernos favor me avisar por meio das nossas redes includentes e cibernéticas, muito embora saiba que ainda resta um grande número deles que não sabe nem o que é Internet.

Copyright/left – favor citar o autor e as fontes, mesmo as inexistentes, em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação de massa (ou serão multidões? TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

INDICAÇÕES PARA LEITURA CRÍTICA –

A DISCRIMINAÇÃO NEGATIVA – CIDADÃOS OU AUTÓCTONES? , Robert Castel, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 2008.

VIDAS DESPERDIÇADAS – Zygmunt Bauman, Editora Jorge Zahar Ed., Rio de Janeiro, RJ, 2005.

LEIA TAMBÉM NO BLOG –

O RETORNO DA INCLUSÃO PELA INTEGRAÇÃO: Novos muros nas Escolas, Fábricas e Hospitais.


INCLUSÃO/EXCLUSÃO: DUAS FACES DA MESMA MOEDA DEFICITÁRIA? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/02/inclusaoexclusao-duas-faces-da-mesma.html


A PARÁBOLA DA ROSA AZULhttps://infoativodefnet.blogspot.com.br/2010/05/parabola-da-rosa-azul.html

quarta-feira, 2 de maio de 2012

INTERDIÇÃO, DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E DIREITOS HUMANOS.

Imagem publicada- A foto colorida de um homem sorridente, inglês, que completou uma maratona após 41 dias, percorrendo apenas 1,5km por dia, com auxílio de um apoio especial para caminhar e uma equipe de amigos e familiares ao seu redor. A matéria não tem a ver diretamente com interdição, mas se pode supor o que teria acontecido com ele, caso fosse interditado, após o acidente que o levou a um quadro psicomotor semelhante a uma paralisia cerebral grave. Podemos dizer que, após um acidente, como o de Eddie Kidd, perdemos todas as nossas habilidades e capacidades? E, quando se trata de uma criança ou jovem com Síndrome de Down ou Paralisia Cerebral? A eles não é permitido, depois de diagnosticados/julgados "incapazes", de correr a corrida da Vida Livre e sem Interdições?

EU NÃO INTEDITO, NÓS NÃO OS INTERDITAMOS, PORÉM ELES AINDA INTERDITAM.

No dia 03 de maio será realizada uma audiência sobre a Interdição Legal total de pessoas com deficiência intelectual e pessoas com paralisia cerebral severa. Ocorrerá um debate proposto pelos deputados Mandetta (DEM-MS) e Rosinha da Adefal (PTdo B-AL).

O tema é de meu total interesse/dedicação há muitos anos. Já participei há mais de 15 anos atrás de um debate promovido no Centro Cultural Banco do Brasil, RJ, de uma acirrada discussão sobre a interdição total de pessoas com deficiência intelectual. Há época já manifestava minhas inquietações bioéticas e sociais sobre o tema.

A palavra interdição, para além de seu sentido legal, implica, para o senso comum, a restrição de alguns direitos fundamentais. É a proibição para os atos da vida civil por aqueles que forem considerados “incapazes”. Nessa perspectiva é que sempre interrogarei sua possibilidade, necessidade e sua aplicabilidade. Continuo sendo apenas um defensor ativista de direitos humanos ao refletir sobre ela.

Já há uma visão mundial sobre o tema. Foi expresso na Declaração de Montreal sobre a Deficiência Intelectual, em 2004, na cidade de Montreal, Canadá. Tive a oportunidade de traduzi-la para o português. Venho difundindo-a desde então para que possamos aprofundar e rever nossos preconceitos sobre as deficiências intelectuais e os sujeitos que as vivenciam.

E, lá fica claro que o paradigma que irá sustentar essa declaração que foi proposta pela OPAS/OMS, ambas no âmbito da medicina e da saúde, é o que irá ser o eixo principal do que se estabeleceu dois anos depois com a Convenção (ONU-2006). Em ambos os documentos os princípios fundadores são os Direitos Humanos. Mas que princípios norteariam uma interdição legal total?

Em princípio a palavra interdição vai de encontro com um dos direitos fundamentais, quando escolhe ou elege um ou mais sujeitos, a partir de sua condição de saúde, idade ou situação de vulnerabilidade. Os que estão, no momento, sendo o alvo dessa audiência são as pessoas com síndrome de Down e as com paralisias cerebrais graves.
No campo da Síndrome de Down já escrevi sobre sua autonomia e os exemplos de sua inclusão social só tem comprovado que são "cidadãos e cidadãs". No caso de pessoas com Paralisias Cerebrais ainda temos um campo nebuloso e confuso sobre sua classificação. O conceito de grave vai até onde?

É aí que há sempre o perigo do preconceito pela manutenção do paradigma biomédico. As pessoas com paralisias cerebrais são vistas, objetivadas, assujeitas e judicializadas como "doentes" ou "deficientes mentais".

Há sim quadros ou condições de saúde que levam a um maior número de restrições ou perdas de funcionalidade. Porém são em número muito menor a cada dia que passa. E, para o direito, na visão reducionista, são as pessoas “portadoras”, incapazes com “necessidades especiais”. Ainda não há uma abertura para os novos conceitos e visões sobre estes cidadãos/ãs, principalmente em algumas instâncias do Judiciário.

A noção de severidade dos quadros foi e é a maior justificativa também para o processo de institucionalização de pessoas com paralisias cerebrais ou síndrome de down. Ambos os quadros formaram o que se conceituava na CID-10 quadros de "retardamento mental". Há ainda muitos operadores do direito e profissionais da saúde que se baseiam nessas visões e conceitos arraigados erroneamente.

E para tais graves, moderados ou leves, ou então, historicamente, os imbecis, os débeis, os cretinos, ou, reducionisticamente, os retardados mentais, a melhor forma de cuidado e reabilitação só poderia ocorrer em espaços especializados e sob internação.

A maior defesa que já vi da interdição sempre foi direcionada por entidades que cuidam ou prestam assistência contínua a esses cidadãos e cidadãs sob reclusão. E a mais veemente foram as que famílias, principalmente mães, defendiam no sentido de “preservar o futuro” de seus filhos com deficiência considerada como “invalidez total”.

Mas o que é essa interdição judicial? Em pesquisa na Internet encontrei um dos documentos mais recentes sobre o tema. É do Chile (2011) e trata da “interdicción, proteción patrimonial y derechos humanos” (interdição, proteção patrimonial e direitos humanos). Nele se esclarece que a interdição é uma sentença judicial cujo efeito principal é a substituição das escolhas e decisões de uma pessoa com deficiência pelas de outra pessoa, que no direito recebe o nome de curador.

Esta figura está prevista também na Declaração de Montreal. Ressalta-se nela que “todas as pessoas com deficiências intelectuais são cidadãos plenos, iguais perante a lei e como tais devem exercer seus direitos com base no respeito nas diferenças e nas suas escolhas e decisões individuais”. Portanto, como na Convenção, estão garantidas as suas capacidades de decisão e escolha.

Então, considerando-se esta afirmação, em que condições poderiam ser solicitadas as interdições? Para a Declaração de Montreal: “A. As pessoas com deficiências intelectuais têm os mesmos direitos que outras pessoas de tomar decisões sobre suas próprias vidas. Mesmo que algumas pessoas possam ter dificuldades de fazer escolhas, formular decisões e comunicar suas preferências, elas podem tomar decisões acertadas para melhorar seu desenvolvimento pessoal, seus relacionamentos e sua participação nas suas comunidades;...”

É, então, o Estado que deverá proporcionar a proteção e a garantia de que estes cidadãos e cidadãs possam exercer, com os avanços legais e sócio-políticos, o acesso e utilização de serviços adequados que sejam baseados nas necessidades, assim como no direito ao consentimento informado e livre. 

Com os avanços em ajudas técnicas, tecnologias assistivas e outros recursos das novas tecnologias quem são os que não seriam “capazes” da expressão de suas vontades e decisões?

No presente e no futuro sabemos que ainda teremos muitos excluídos do mundo digital e das novas tecnologias de informação, e entre estes estarão muitos sujeitos com deficiência intelectual. Porém o nosso dever será o de, caminhando no desenho universal, atender todas as suas necessidades, especificidades, “disfuncionalidades” ou incapacidades, e, principalmente as suas singularidades.

Tanto para a Declaração de Montreal como em outros documentos de cunho universalista encontraremos que o exercício da curatela deve ser relativizado. Porém o que encontramos é uma dura realidade de manutenção de pessoas com deficiência intelectual ou com paralisia cerebral em regimes de cativeiros, hospitais ou espaços de segregação. Muitos deles promovidos pelas próprias famílias desses sujeitos assujeitados.

É, dentro dessa realidade, brasileira em especial, que precisamos garantir que “as pessoas com deficiências intelectuais devem ser apoiadas para que tomem suas decisões, as comuniquem e estas sejam respeitadas ...”

Com a recente tomada de posição do nosso Governo com o Plano Viver sem Limites, e a decisão de subsidiar as pesquisas e desenvolvimentos em tecnologias assistivas, deveremos olhar para o futuro na tomada de uma decisão legal de interdição.
Aqueles ou aquelas que, hoje, não estão podendo se expressar por meios já conhecidos, em futuro não muito longínquo, utilizará meios avançados e nada onerosos para a comunicação de suas opiniões, ideias, sentimentos e decisões.

Já em 2004, em Montreal se afirmava: “B. Sob nenhuma condição ou circunstância as pessoas com deficiências intelectuais devem ser consideradas totalmente incompetentes para tomar decisões baseadas apenas em sua deficiência. Somente em circunstâncias mais extraordinárias o direito legal das pessoas com deficiência intelectual para tomada de suas próprias decisões poderá ser legalmente interditado.”

Há, portanto uma expressão afirmativa do direito de pessoas com deficiência intelectual, ou mesmo com paralisia cerebral, que não devem ser sinônimos ou equivalências. A maioria das pessoas com paralisias cerebrais NÃO SÃO pessoas com deficiências intelectuais. Apenas uma porcentagem pequena poderá apresentar alterações cognitivas ou restrições de funcionalidade psicomotora que prejudicará sua interação e expressão ao meio ambiente.

Ambas as condições devem ser expressão de direitos humanos. Portanto direitos que são inalienáveis, indivisíveis, interdependentes, interelacionados e universais. E, se fundamentarmos, nesses princípios, a prática legal das interdições, a partir desse encontro e debate na Câmara dos Deputados, terá de abandonar o paradigma biomédico.

Surgirá, inclusive com a presença, que espero não falte de nossa ministra Maria do Rosário Nunes, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, a efetivação dos Direitos Humanos como linha mestra de todos os novos modelos legais para pessoas com deficiência, sejam intelectuais ou não.

Lembrando a temporalidade vertiginosa em que vivemos, assim como as necessárias mudanças legais, os processos de interdição não devem ficar restritos aos laudos de peritos forenses ou psiquiatras. O nosso olhar médico nos leva para os ‘’mutirões’’ de ações de interdição, onde a Síndrome de Down está no mesmo nível que as pessoas com Doença de Alzheimer.Ainda trabalhamos com a CID-10 e desconhecemos a CIF-2006.

E as curatelas deverão ser de uma curta duração, principalmente aquelas que envolvem interesses patrimoniais ou alegações unicamente prestadas pelos familiares. Portanto, nesse campo é indispensável que o Estado e o Poder Judiciário observem que: “Qualquer interdição deverá ser por um período de tempo limitado, sujeito as revisões periódicas e, com respeito apenas a estas decisões, pelas quais será determinada uma autoridade independente, para determinar a capacidade legal”.

Finalmente, reforçando o que já foi declarado em Montreal, afirmar que: “C. A autoridade independente, acima mencionada, deve encontrar evidências claras e consistentes de que apesar dos apoios necessários, todas as alternativas restritivas de indicar e nomear um representante pessoal substituto foram, previamente, esgotadas. Esta autoridade independente deverá respeitar o direito a um processo jurídico, incluindo o direito individual de ser notificado, ser ouvido, apresentar provas ou testemunhos a seu favor, ser representado por um ou mais pessoas de sua confiança e escolha, para sustentar qualquer evidência em uma audiência, assim como apelar de qualquer decisão perante um tribunal superior”.

Era esse olhar para o futuro dos direitos humanos de pessoas com deficiência intelectual que há 08 anos se declarou. HOJE, como parte de um movimento para a afirmação política das pessoas com deficiência, qual visão futurista devemos criar em relação ao nosso próprio futuro?

Excelências, Meritíssimos, Ilustríssimos Senhores e Senhoras, que já conseguiram afirmar o direito sexual e reprodutivo das mulheres com a recente decisão do STJ sobre anencefalia, lhes faço um único pedido: - Eu, aqui cidadão brasileiro, desejo de coração que suas mentes continuem no processo evolutivo e transformador de todas as nossas leis.

Então, os “cida-downs” e os chamados de “paralíticos” poderão se orgulhar de um novo papel a exercer: serão os respeitados auto defensores dos seus direitos humanos. Não há como exercitar a cidadania sem um exercício de nossas autonomias e desejos mais profundos.

Comemorei, com minha família reunida, o 102º (centésimo segundo) aniversário de meu pai. Alguns devem se perguntar sobre sua capacidade de decisão, ou sua interdição. Com sua lucidez, garantida pelo desejo de vida, ainda é e será respeitado em suas decisões, mesmo as que nos pareçam estarem erradas ou contra nossa vontade.

Eu lhe perguntei se ainda irá acompanhar a sua querida Romaria a pé até Aparecida do Norte, distante mais de 300 km de minha cidade natal, ponderando sobre as baixas temperaturas e o risco de saúde de um ancião, e ele afirmativamente me respondeu: - “E por que não iria? Eu ainda não morri ...”. Ele irá como o maratonista com Paralisia Cerebral até o fim de sua jornada, seguindo sua fé e sua determinação/decisão.

E podem ter certeza de que ele, se interrogado for, afirmará como um desembargador que negou uma interdição recentemente noticiada: “De qualquer sorte, não se pode considerar a idade avançada do apelado (74 anos, atualmente) ou a preferência deste por um estilo de vida mais simples como motivos para interditá-lo. Veja-se, além disso, que velhice não se confunde com senilidade"...

Assim não podemos continuar confundindo a situação de deficiência com a noção de incapacidade total, para sempre, decretada. A interdição total deverá ser a exceção da exceção, e, ainda assim respeitar, antes que velhos códigos, a urgente ativação, transversalidade e implementação dos Direitos Humanos.

E, muito raramente, muito poucos, quase nenhum sujeito com deficiência intelectual ou com paralisia cerebral dita severa estará sendo submetido à perda de suas liberdades...

EU, NO FUTURO, ESPERO NÃO ME INTERDITAREI, NÓS NÃO SEREMOS INTERDITADOS, E ELES, TORNADOS MAIS JUSTOS E SÁBIOS, APRENDERÃO O QUE É SER/ESTAR INTERDITADO... POIS TODOS/TODAS, UM DIA, APRENDEMOS A VIVER/CONVIVER COM LIMITES...


Copyright jorgemarciopereiradeandrade 2012/2018- 2024 Ad infinitum (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação de massa) TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025

NA INTERNET – Fontes e notícias

Interdição legal de pessoas com deficiência intelectual será discutida em audiência
https://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/DIREITO-E-JUSTICA/416052-INTERDICAO-LEGAL-DE-PESSOAS-COM-DEFICIENCIA-INTELECTUAL-SERA-DISCUTIDA-EM-AUDIENCIA.html

DECLARAÇÃO DE MONTREAL SOBRE A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
https://www.defnet.org.br/decl_montreal.htm

PLANO VIVER SEM LIMITES - Plano beneficia 45,6 milhões com deficiência https://www.brasil.gov.br/noticias/arquivos/2011/11/17/plano-beneficia-45-6-milhoes-com-deficiencia

Tribunal nega pedido de interdição: velhice não se confunde com senilidade
https://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=visualiza_noticia&id_caderno=20&id_noticia=82239

Homem com paralisia cerebral completa Maratona de Londres após 51 dias 
https://www.estadao.com.br/noticias/internacional,homem-com-paralisia-cerebral-completa-maratona-de-londres-apos-51-dias,cional,homem-com-paralisia-cerebral-completa-maratona-de-londres-apos-51-dias,729002,0.htm

LEITURA INDICADA:

Derechos de las Personas com Discapacidad Mental *Chile (em PDF) https://www.senadis.gob.cl/descargas/centro/tematicos/manual_dicapMental.pdf

LEIA TAMBÉM NO BLOG: sobre Deficiências Intelectuais

DEFICIENTES INTELECTUAIS - Encarcerar é a solução final?   https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/01/deficientes-intelectuais-encarcerar-e.html

O MELHOR É A JAULA OU O GALINHEIRO? Deficientes intelectuais e o seu encarceramento
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/05/o-melhor-e-jaula-ou-o-galinheiro.html

INCLUSÃO/EXCLUSÃO - duas faces da mesma moeda deficitária? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/02/inclusaoexclusao-duas-faces-da-mesma.html

NÃO SOMOS ANORMAIS, SOMOS APENAS CIDA-DOWNS.... https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/03/nao-somos-anormais-somos-apenas-cida.html

VULNERAÇÃO E MÍDIA NO COTIDIANO DAS DEFICIÊNCIAS
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/04/vulneracao-e-midia-no-cotidiano-das.html

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

CIBERATIVISMO - 02 ANOS - Outras Línguas, Outros Sentidos e a busca do OUTRO


Imagem Publicada – um encontro entre o passado e o presente no campo da vida digital. É uma foto tirada na Tailândia onde um monge vestido de sua cor laranja, dialoga com um menino que traz um laptop do programa One Laptop per Child(um computador para cada criança...), de Nicholas Negroponte, tendo outro jovem olhando a cena. O laptop tem a cor verde, e uma manivela que é o meio pelo qual sua bateria interna irá funcionar, demonstrando-se na máquina o reencontro das tecnologias em que o passado ajuda o futuro. É o caminho para a Era da pós-informação, para além da Idade Mídia atual....

CIBERATIVISMO EM AÇÃO
Edição comemorativa 
dos 02 anos do Blog INFOATIVO DEFNET

CADA HOMEM É, sozinho, 
A casa da humanidade.

Não tenho nada na cabeça

A não ser o céu.

Não tenho sapato
A não ser o passo,
Não faço nada com o passo, 
Só traço a linha do futuro.
E o futuro tem caminho
na UNIMULTIPLICIDADE,
pois cada homem é, sozinho,
A CASA DA HUMANIDADE. (Tom Zé, compositor, Fórum Mundial, março 2001)


Hoje às onze horas e onze minutos, segundo os numerólogos e os matemáticos, uma sincronia de tempo e da vida se realizou. Um dia a mais no calendário? Ou um dia para celebrar a grande e importante descoberta da ‘’liberdade sem fio’’? Ou apenas mais um dia, um dia para que mais de 4.000 chineses busquem afirmar a sorte e se casem jurando o amor eterno?


Eu aqui, usando uma "velha máquina de escrever, agora mais digital do que nunca", ainda com o Windows XP, estou comemorando o que há dois anos atrás se tornou um espaço de vivências, idéias e de minha própria super-vivência. Em 14 de novembro de 2009 foi ao ciberespaço o Blog INFOATIVO.DEFNET.



Estava eu me recuperando de um duplo trauma físico e psíquico. Primeiro tinha feio uma neurocirurgia e implantado 06 parafusos e 02 hastes de titânio dentro de meu corpo. Uma experiência da tentativa de supressão total da dor e da minha marcha prejudicada e claudicante. Já escrevia e publicava, via e-mail, o boletim eletrônico do DefNet. Entretanto, como meus passos e caminhada, ainda era muito pouco neste universo de comunicação e inteligência coletiva. 

Ao vivenciar, no corpo e na mente, a desagradável experiência pós-operatória de ser “largado’’, ou melhor não sustentado apropriadamente, pelos profissionais de saúde de um hospital universitário, descobri como sair desta queda. Novas dores aprendi em 11 de outubro de 2009. As mesmas que hoje busco re-aprender com elas...

Um mês após já tentava encontrar um caminho para resolução de minha imobilização física parcial. Precisava sair e ao mesmo tempo "ficar de cama". Como dar vazão ao mundo de emoções e sentidos que experimentava? Como não interromper meu ativismo na Internet? Como me levantar para além de quaiquer limitações de meu corpo?. 

Eis que uma adaptação de uma mesa dobrável e um laptop (o mesmo que pifou antes da cirurgia, e mais uma vez me deixou na mão estes dias) tornaram-se os meios tecnológicos de redenção de minhas dores físicas. Mas principalmente o melhor antídoto de uma possível depressão ou isolamento. Escrever tornou-se meu melhor remédio.

Hoje após 02 anos de luta e de tratamentos os mais variados ainda sobram muitas dores. Para além delas, hoje o blog já se tornou meu maior espaço de combate e afirmação dos direitos humanos. Entre eles afirmo o direito do alívio da dor humana. Por todos os meios, por todas as mídias, sem fronteiras ou limites.

São mais de 51.000 visitas e múltiplas difusões e retransmissões de meus textos pela Internet. São agora 90 posts. Espero possam ser 90.000.Escrever tornou-se um ato criativo de livre comunicação.Retomei o meu ciberativismo. Reafirmei minha esperança de uma socialização irrestrita do saber...

Neste dia 11 de novembro de 2011 lanço, no ciberespaço, hoje uma nuvem, este texto comemorativo dos 02 anos, antecipando os dois dias que antecederam a criação do blog, pois ele esteve nesse período em gestação no ano de 2009.Estou agora em busca de Outras Línguas, Outros Sentidos e, principalmente do Outro que me re-conheça e re-transmita...

Recentemente retomei um texto que escrevi em 2003. Trata-se do artigo: PARA ALÉM DAS EXCLUSÕES: POR UMA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO RUMO Á UMA SOCIEDADE DO CONHECIMENTO E DAS DIFERENÇAS. Estava relembrando uma pesquisa sobre a hegemonia linguística na Internet em pesquisa da FUNREDES. Ainda hoje somente 10% das línguas estão na Internet (Daniel Pimenta).

É um artigo escrito para o livro: Políticas Públicas: Educação, Tecnologias e Pessoas com Deficiência (veja em leituras indicadas abaixo). Foi uma resultante de um trabalho junto ao Congresso de Leitura do Brasil. Nele eu já afirmava minha necessidade de crer em um outro modo de incluir: a inclusão digital, combatendo, com urgência, a real exclusão digital.

Em 2003, para a construção dos cibercidadãos e cidadãs, trazia, em meu texto, a afirmação do Livro Verde que propunha:
. Aumentar drasticamente o número de pessoas com acesso direto e indireto à Internet.
. Popularizar o acesso à Internet em todo País (hoje com redução de valor da Banda Larga e pulverização de telecentros, por exemplo)
. Produzir e disponibilizar hardware e software de baixo custo;
. Promover a implantação de serviços públicos de acesso universalizado e sem discriminações;
. Oferecer mecanismos de aprendizagem em informática e treinamento no uso da Internet em larga escala.

Talvez alguns destes avanços foram concretizados, outros estão a caminho. O que ainda interrogo é que Inclusão Digital estamos produzindo? E, vendo-nos incluídos já conseguimos incluir o acesso à informação como direito humano essencial e fundamental para a cidadania? A Sociedade da Informação, na Idade Mídia, tem produzido novos modos de subjetivação? Esta produção de subjetividades caminha na direção de um paradigma ético, estético e político?

Por estas e muitas outras interrogações, como em uma torre de Babel atualizada, é que precisamos aprender as outras línguas, os outros sentidos. Há um novo horizonte aberto com as crises do capitalismo mundial integrado (Guattari). Segundo Zizek: "...Mas você conhece aquela praga, o que dizem os chineses quando detestam alguém: 'Que você viva tempos interessantes'. É isso. Nos aproximamos de tempos interessantes..."

Nesse mês será lançado um Plano Nacional para as Pessoas com Deficiência, no dia 17, e espero que possamos encontrar, para além de toda transversalidade do Decreto 6949/09 (a legitimização e implementação da nossa Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência), a indispensável concretização de políticas públicas de INCLUSÃO DIGITAL de toda a heterogeneidade que são as deficiências e os que se encontram nessa condição.

Nessa comemoração do InfoAtivo. DefNet, ainda em seus primeiros passos, espero que os tempos sejam mais que interessantes. Espero, desejo e trabalharei, com suas opinões e sugestões, para que possamos ver/produzir e sentir outras saídas, outros caminhos sábios e novas suavidades para o viver. Venham comigo! E multipliquemos nossas conexões com o futuro...

MEU MAIS DOCE ABRAÇO A TODOS E TODAS, Leitores, seguidores, comentaristas, amigos e amigas, com meu profundo e intenso desejo de que possamos chegar a casa dos 1.000...a cada dia em nossas interações e trocas "ciber-afetivas".
E que o CIBERATIVISMO nos contamine e nos apaixone para que, para além de nossas grupelhizações ou processos identitários defensivos, multipliquemos, também a mil, molecular e micropoliticamente todas as novas e surpreendentes cartografias coletivas.

ASSIM, intensos e desejantes, sejamos as novas revoluções por uma INTERNET LIVRE, ACESSÍVEL e PLURAL, com ou sem suas novas massas, sempre como cibercidadãos e cibercidadãs implicados com a mudança dos paradigmas... EM TODAS AS LÍNGUAS E EM TODOS OS SENTIDOS.

copyright jorgemarciopereiradeandrade 2011/2012 (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet ou outros meios de comunicação de massa TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Leitura Indicada no texto:
Para Além das Exclusões: por uma Sociedade da Informação Rumo à Sociedade do Conhecimento e das Diferenças - Jorge Márcio Pereira de Andrade - 
In Políticas Públicas: Educação, Tecnologias e Pessoas com Deficiência, Shirley Silva & Marli Vizim (Orgs.) - Editora Mercado de Letras/ALB, Campinas, SP, 2003. (https://www.alb.com.br)

A Vida Digital – Nicholas Negroponte, Editora Companhia das Letras, São Paulo, SP, 1995.https://pt.wikipedia.org/wiki/Nicholas_Negroponte

Livro Verde da Sociedade da Informação no Brasil - programa do Governo Federal na promoção de um planejamento para a INCLUSÃO DIGITAL
https://www.mct.gov.br/index.php/content/view/18878.html

Informações na INTERNET

ONE LAPTOP PER CHILD - http://www.olpc.org.br/
Profesor de la UnB afirma que menos del 10% de las lenguas del mundo están en la Web
https://noticias.universia.com.br/translate/pt-es/vida-universitaria/noticia/2011/11/10/887414/professor-da-unb-afirma-menos-10-das-linguas-do-mundo-esto-na-web.html

O Horizonte está aberto - https://www.outraspalavras.net (entrevista a Tom Ackerman com Slavov Zizek)

Sobre Ciberativismo - https://pt.wikipedia.org/wiki/Ciberativismo

Leia também no Blog (entre os primeiros textos publicados):

OS NÓS E OS SEM REDE – Acesso à Banda Larga na Internet Brasileira
https://infoativodefnet.blogspot.com/2009/12/os-nos-e-os-sem-rede-acesso-banda-larga.html

SEREMOS 300? 01 pc para cada PC – do LIMÓGRAFO AO COMPUTADOR
https://infoativodefnet.blogspot.com/2009/11/infoativo.html

UMA LUZ NO FIM DO LIVRO - https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2010/09/uma-luz-no-fim-do-livro.html

ENTRE O MARCO E A BENGALA - NA INTERNET O QUE É LEGAL? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2009/11/infoativo_26.html

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

PARA ALÉM DO PRECONCEITO - A Convenção, Cidadania e Dignidade


IMAGEM PUBLICADA - Um homem, provavelmente indiano, com pernas atrofiadas é empurrado por uma jovem, dentro de um rudimentar meio de transporte, qual um carrinho rústico, com uma criança pequena entre as pernas, circulando em uma rua aberta com veículos ao fundo, representando, na minha visão, a maioria das 650 milhões de pessoas com deficiência do mundo globalizado, ou seja 06 de cada 10 pessoas com deficiência são pobres, desfiliados, marginalizados e ainda estigmatizados. Uma foto em P&B de Khaled Satter, difundida pela OMS (Organização Mundial de Saúde) com a finalidade de difundir a CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde- 2001), que foi premiada em "1º lugar", por mim, e apresentada, no passado em muitas conferências...

"Ser cidadão, perdoem-me os que cultuam o direito, é ser como o estado, é ser um indivíduo dotado de direitos que lhe permitem não só se defrontar com o estado, mas afrontar o Estado. O indivíduo seria tão forte quanto o estado. O indivíduo completo é aquele que tem a capacidade de entender o mundo, a sua situação e que, se ainda não é cidadão, sabe o que poderiam ser os seus direitos..." (Milton Santos, Cidadania Mutilada in O Preconceito)

O pensador e intelectual Milton Santos nos instiga a afirmação de nossos direitos. Ele interroga em seu texto: "O que é ser cidadão neste país?". E, hoje, quando se comemora o DIA INTERNACIONAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (Onu) temos de buscar uma nova afirmação destes que tiveram por muito tempo sua cidadania mutilada. Eles, muitas vezes fisicamente mutilados, foram considerados, até recentemente, apenas objeto de intervenção, seja do Estado ou da Sociedade civil.

Hoje, quando a sua cidadania, quando reconhecida, permite até um enfrentamento do Estado, é a hora de buscar que direitos devem ser difundidos, educacional e persistentemente, para que sua diferença e diversidade funcional possam realmente estar em processo de inclusão social.


Em recente evento promovido pela RIADIS ( Red Latinoamericana de Organizaciones No Gubernamentales de Personas con Discapacidad y sus Familias ) e Conectas Direitos Humanos, na cidade de São Paulo, acerca da "Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência - Avanços, Desafios e Participação da Sociedade Civil", no mês de novembro, foi construído um importante marco sobre a questão do que podemos, pessoas com e sem deficiência, realizar para que o Artigo 33, acerca da Implementação e Monitoramento da Convenção em nosso país, seja plural, democrático e, principalmente, realize, concretize e implemente o que já está no Decreto Lei 6949/2009, para que os sujeitos com deficiência tornem-se, como diz Milton Santos, "indivíduos completos".

Tenho comigo a convicção de que um dos meios mais importantes, na atual situação econômica, social e política em que se encontram a maioria das pessoas com deficiência, ainda em desfiliação social e pobreza, que, sem dúvida já ultrapassam os 25 milhões de brasileiros e brasileiras do Censo de 2000, é indispensável que também, e em especial hoje, façamos conhecer o Artigo 8 - CONSCIENTIZAÇÃO, da Convenção, que nos diz:

1. Os Estados Partes se comprometem a adotar medidas imediatas, efetivas e apropriadas para:
a) Conscientizar toda a sociedade, inclusive as famílias, sobre as condições das pessoas com deficiência e fomentar o respeito pelos direitos e pela dignidade das pessoas com deficiência;
b) Combater estereótipos, preconceitos e práticas nocivas em relação a pessoas com deficiência, inclusive aqueles relacionados a sexo e idade, em todas as áreas da vida;
c) Promover a conscientização sobre as capacidades e contribuições das pessoas com deficiência.

2. As medidas para esse fim incluem:
a) Lançar e dar continuidade a efetivas campanhas de conscientização públicas, destinadas a:
i) favorecer a atitude receptiva em relação aos direitos das pessoas com deficiência;
ii) Promover a percepção positiva e maior consciência social em relação às pessoas com deficiência;
iii) Promover o reconhecimento das habilidades, dos méritos e das capacidades das pessoas com deficiência e de sua contribuição para o local de trabalho e o mercado laboral;

b) Fomentar em todos os níveis do sistema educacional, incluindo neles todas as crianças desde tenra idade, uma atitude de respeito para com os direitos das pessoas com deficiência;
c) Incentivar todos os órgãos de mídia a retratar as pessoas com deficiência de maneira compatível com o propósito da presente Convenção;
d) Promover programas de formação sobre sensibilização a respeito das pessoas com deficiência e sobre os direitos das pessoas com deficiência.

Estas medidas devem ser um dever de Estado e um direito de todos e todas no Brasil. A Convenção além de ratificada na íntegra tem também seu Protocolo Facultativo, que permite-nos a denúncia de quaisquer violações dos seus artigos. Qualquer pessoa, grupo ou entidade poderá enviar a um Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Artigo 34), e nós, enquanto cidadãos e cidadãs, devemos estar alertas para que nossa participação política e social se faça presente no monitoramento da aplicação destas medidas de conscientização.


Para tanto devemos, no Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, potencializar nossos desejos de, micropoliticamente, nos confrontarmos com todas as formas de preconceito e estigmatização a que somos submetidos. Precisamos quebrar, romper e transpor as barreiras invisíveis de velhos paradigmas, enraizadas em instituições que temem a perda de poder e uso das pessoas com deficiência, espaços de segregação ou de institucionalização que se locupletam e dependem dos corpos que serão, biomedicamente, considerados defeituosos.

É HORA, PORTANTO, DA MÁXIMA VISIBILIZAÇÃO E DE "OCUPAÇÃO PACÍFICA, PORÉM AGUERRIDA" DE TODOS OS ESPAÇOS, SEJAM DA MÍDIA, QUE AINDA DIZ E ESCREVE SOBRE "PORTADORES", DAS ESCOLAS E EDUCADORES QUE CRIAM OBSTÁCULOS À INCLUSÃO ESCOLAR, ASSIM COMO DAS QUE NEGAM AS SINGULARIDADES E DIFERENÇAS NA PLURALIDADE E NO MULTICULTURALISMO QUE DEVE ALICERÇAR A EDUCAÇÃO INCLUSIVA, DAS ENTIDADES ASSISTENCIALISTAS QUE SE APEGAM A ESTEREÓTIPOS, DOS QUE GANHAM DINHEIRO EM NOME DE SUPOSTAS CARIDADES OU APLACAMENTO DE CONSCIÊNCIAS CULPOSAS E REFORÇAM APENAS O MODELO REABILITADOR, 

DOS QUE SE NEGAM A RECONHECER AS POTENCIALIDADES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO TRABALHO E NÃO RECONHECEM AS ARTIMANHAS HIPERCAPITALISTAS NO CUMPRIMENTO DE COTAS E DE INSERÇÃO LABORATIVA COM EQUIPARAÇÃO DE OPORTUNIDADES, DE PROFISSIONAIS DE SAÚDE QUE NÃO ENXERGAM PARA ALÉM DOS DITAMES BIOMÉDICOS SOBRE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E SE RECUSAM A APRENDER OS NOVOS CONCEITOS TRAZIDOS PELA CIF (CLASSIFICAÇÃO INTERNACIONAL DE FUNCIONALIDADE, INCAPACIDADE E SAÚDE - 2001), 

PARA OS OPERADORES DE DIREITO QUE AINDA PERSISTEM NO DESCONHECIMENTO DA CONVENÇÃO E SUA MUDANÇA DE PARADIGMAS NO DIREITO E PERSISTEM EM UM OLHAR VITIMIZADOR E DESPOTENCIALIZADO DOS SUJEITOS DE DIREITO QUE SÃO AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA... É HORA DE NOSSAS REVOLUÇÕES MOLECULARES PROVOCAREM ESTES INSTITUÍDOS, E, TRANSVERSALIZANDO SEUS TERRITÓRIOS, PROMOVER A CRIAÇÃO RIZOMÁTICA, OU SEJA MULTIPLICADORA E CONTAGIANTE, DE NOVOS PARADIGMAS E NOVAS CARTOGRAFIAS.

Os tempos são da Acessibilidade, da visão Bioética, da Cidadania, da Dignidade e da construção de novos princípios Éticos como alicerces para que ninguém, nenhuma pessoa, nenhum ser humano fique ainda debaixo da mutilação e violação de seus Direitos Humanos. Este ABCDário, se efetivamente realizado, pode ser um dos caminhos para um Outro Mundo Possível, para além dos preconceitos, para além das exclusões, rumo À SOCIEDADE DAS DIFERENÇAS...

Enquanto, passando o dia e ia escrevendo, pensando e repensando, lá na ONU, uma jovem negra, qual Milton Santos, com seu histórico de artrogripose, em sua cadeira de rodas, fazia ressoar a sua música e seu canto, com toda a intensidade do Zimbaue e da África. Ela, Prudence Mabhena, mostra ao mundo como é possível se tornar, mesmo com aparentes ''mutilações'' de seu corpo, muito mais efetivadas em sua cidadania, como podemos, ao soltar nosso canto de protesto e vida, um ''indivíduo completo e surpreendente". Ouçam e se apaixonem.

copyright jorgemarciopereiradeandrade (2010-2011 - favor citar as fontes e os autores em republicação livre na Internet e outros meios de comunicação de massa - TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025)

Informações, indicações e Conexões:

CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - Decreto Legislativo 186/2008 - Decreto 6949/2009
3ª ed- rev - Brasília - Secretaria de Direitos Humanos - Secretaria de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência , 2010.
Na internet -
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm

O Preconceito - Julio Lerner Editor - São Paulo, Imprensa Oficial do Estado - 1996-1997.

A CONVENÇAO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA COMENTADA - Coordenação de Ana Paula Crosara de Resende e Flavia Maria de Paiva Vital - Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos - Corde - 2008.
Na Internet - https://www.bengalalegal.com/convencao-comentada

PRUDENCE MABHENA - MUSIC BY PRUDENCE -
ver/ler/ difundir o texto A Música que Encanta Depende dos Olhos? https://infoativodefnet.blogspot.com/2010/03/musica-que-encanta-depende-dos-olhos.html

Para ouvir e se encantar - VEJA O VIDEO - COM A MUSICA AMAZING GRACE https://www.youtube.com/watch?v=llVp22UuVTg&feature=player_embedded

RIADIS - http://www.riadis.net/
CONECTAS - https://www.conectas.org/index.php/Home/index

sábado, 26 de junho de 2010

SAÚDE MENTAL E DIREITOS HUMANOS COMO DESAFIO ÉTICO PARA A CIDADANIA

IMAGEM PUBLICADA _ A foto publicada no Correio Popular (Campinas- 21/05/2009) sobre Zaqueu, um rapaz de 25 anos, que foi enjaulado pelo pai, na cidade de Sumaré, SP, para "Para controlar o comportamento agressivo causado por uma deficiência mental do jovem ", segundo a reportagem, que traz um pequeno exemplo de possíveis milhares de outros cidadãos e cidadãs que ainda experimentam o isolamento, o encarceramento e outros meios de contenção como recurso para os cuidados com seus transtornos mentais no Brasil. O cárcere construído pela própria família era justificado pela ausência de recursos financeiros dos mesmos, apesar do fato de Zaqueu ser encontrado sem roupas e com fome... um retrato 3x4, que merece ser ampliado, de uma realidade que muitos vivenciam no campo das deficiências intelectuais na Saúde Mental e dos seus Direitos Humanos.

Nesse período de calamidades pouco visíveis, apesar de midiatizadas, onde a fumaça dos fogos de artifício das torcidas escondem os escombros, sob o som ensurdecedor das vuvuzelas (corneta das euforias futebolísticas), trago aos leitores de meu blog um texto recente que foi escrito a pedido do Ministério da Saúde.

É um texto para apoio às discussões e deliberações a ocorrer na IV CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE MENTAL - INTERSETORIAL, que começa amanhã (27/06) em Brasília. Nele abordo um tema indispensável para esse momento Jabulani (de Copa do Mundo de Futebol) de ser e estar globalizado: os Direitos Humanos e sua transversalidade na Saúde, em especial em nossa Saúde Mental.

Reproduzo, então, um trecho sobre o histórico e a importância dos Direitos Humanos para esta Convenção Nacional de Saúde Mental. Hoje estou sem condições física para estar lá, não ter pude participar de seu processo democrático de escolha de delegados, minha saúde, ou melhor minhas condições físicas e atual situação de "colunável" me impedem algumas realizações. Porém, para além dessas limitações, fiz o máximo de esforço para que o tema dos Direitos Humanos sejam uma tônica atravessando todos os outros dois importantes eixos em pauta.

A vocês dedico este texto, todos e todas implicados com a Saúde coletiva e mental no Brasil, como estímulo para uma leitura crítica do momento que vivenciamos. Estou convicto que esta Convenção trará novos ares para o campo das práticas e do cotidiano dos diferentes equipamentos (CAPS, Serviços Residenciais Terapêuticos, Centros de Convivência, etc...) que fazem parte do processo de desinstitucionalização e deshospitalização da Reforma Psiquiátrica.

Meu desejo micropolítico é que, neste momento da história da Luta AntiManicomial, da Reforma Psiquiátrica e da Saúde Mental, fundamentados em Direitos Humanos vislumbremos outras cartografias e novas conquistas nos territórios, nas comunidades e nos municípios brasileiros. Que a partir de amanhã, o devir e o futuro sejam marcados pelo avanço e pela busca de soluções para os impasses e desafios éticos, bioéticos e, indispensavelmente, pelas mudanças de paradigmas na Saúde e suas políticas públicas estruturais no Brasil.

Aos que lá estarão como delegados, usuários, familiares ou convidados, envio o meu mais carinhoso e doce abraço. Saudações antimanicomiais e a afirmação de que a Saúde Mental é um direito de todos e, para além de um dever do Estado, é a permanente construção individual/coletiva de um modo de ser, estar e existir na diversidade e na adversidade, como nos disse Nietzsche: "... nós precisamos, para um novo fim, também de um novo meio, ou seja uma nova saúde, de uma saúde mais forte, mais engenhosa, mais tenaz, mais temerária, mais alegre, do que todas saúde que houve até agora...". ( A Gaia Ciência, livro V, Nós, os Sem Medo -1886)

Direitos Humanos e Cidadania
JORGE MARCIO PEREIRA DE ANDRADE

"Confesso-vos que não sei explicar como podem tratar de infelizes os meus loucos, sendo a loucura, como é, patrimônio universal da humanidade, e quando todos os mortais nascem, educam-se e se conformam com ela... " Erasmo de Rotterdam (Elogio da Loucura – 1511)

Histórico e características fundamentais

As violações de Direitos Humanos na Saúde Mental existem, existiram e algumas de suas formas sutis ou naturalizadas persistem. Somente isso já justificaria uma atenção e dedicação de espaços apenas para sua discussão e afirmação. Segundo Norberto Bobbio: “Os direitos nascem quando o aumento de poder do homem sobre o homem - que acompanha, inevitavelmente, o processo tecnológico (a capacidade de dominar a natureza e os outros homens)- ou cria novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permite novos remédios para suas indigências, afirmando, em seu Era dos Direitos, a necessidade atual de proteção dos Direitos Humanos, muito mais do que sua mera legislação.

Apesar dos quase 500 anos que nos separam de Erasmo de Rotterdam ainda persistem os estigmas e as segregações aplicadas aos sujeitos considerados loucos. Ainda se promovem reclusões, tratamentos forçados, internações e hospitalizações que não são regidas pelas mudanças de paradigmas e cuidados pelos quais tanto se lutou na busca da Reforma Psiquiátrica brasileira.

Ao se incluir os Direitos Humanos com um dos eixos principais da IV Conferência Nacional de Saúde Mental estar-se-ia reconhecendo sua importância e sua transversalidade pelos outros dois eixos principais. Tendo como definição que os Direitos Humanos são aquelas liberdades ou valores básicos que, de acordo com diferentes visões filosóficas, são inerentes a todas as pessoas baseados em sua condição humana, para lhes garantir uma vida digna. 

Desde sua criação como uma proposição universalista estes direitos devem ser garantidos, respeitados e promovidos pelos Estados. Nesse sentido é que a participação ativa do Governo, através da sua Secretaria de Direitos Humanos tem um papel a desempenhar e a ser valorizado, bem como afirmado e exigido por parte de todos os participantes deste importante acontecimento democrático.

A partir da compreensão de que os Direitos Humanos são garantias jurídicas que protegem às pessoas ou grupos de pessoas contra ações institucionalizadas dos governos ou seus agentes, seja na saúde pública ou privada, que possam, por exemplo, afetar ou restringir as liberdades fundamentais de pessoas com transtornos mentais, é que se faz necessário compreender algumas de suas principais características:

- são UNIVERSAIS, ou seja, devem proteger a todos os seres humanos sem exceção ou discriminação;

- são INALIENÁVEIS, ninguém pode renunciar a eles ou serem destituídos deles.

- são INTRANSFERÍVEIS, os direitos não podem ser transferíveis de uma pessoa para outra;

- são INDIVISÍVEIS E INTERDEPENDENTES, são indivisíveis por que mesmo divididos para sua melhor compreensão, são vistos em conjunto e são interdependentes devido ao fato de que ao serem efetivados estes direitos dependem uns dos outros;

- são IMPRESCRITÍVEIS, os direitos humanos não se perdem por decurso de prazo;

- são INVIOLÁVEIS, pela impossibilidade de desrespeito por determinações infraconstitucionais ou por atos de autoridades públicas, sob pena de responsabilização civil, administrativa e criminal;

- são EFETIVÁVEIS, portanto sua efetividade depende da atuação do Poder Público que tem o dever e a obrigação, particularmente os Estados e os seus agentes, no sentido de garantir sua realização, não se satisfazendo com o simples reconhecimento abstrato.

Portanto, o momento democrático promovido pela realização da IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial, com sua temporalidade separando-a da sua última realização por 09 anos, nos traz uma oportunidade única de refletirmos sobre a relação indissociável entre os Direitos Humanos e a Saúde. ...

INFOATIVO DEFNET 4438 - JUNHO DE 2010
copyright jorgemarciopereiradeandrade 2010-2011 ( favor citar a autoria e fontes na republicação e difusão livre pela internet)


LEIAM O TEXTO INTEGRAL NO LINK  ABAIXO:
http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/dhjorgemarcio.pdf

IV CONFERENCIA NACIONAL DE SAÚDE MENTAL - INTERSETORIAL, BRASÍLIA, DF, DE 27 A 01 DE JULHO, CENTRO DE CONVENÇÕES ULYSSES GUIMARÃES.

As Conferências de Saúde são fundamentais para a construção democrática das políticas públicas do Sistema Único de Saúde. A Saúde Mental já realizou três conferências setoriais, que produziram importantes deliberações que têm subsidiado a Política Nacional de Saúde Mental.
http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=34077&janela=1

SOBRE ZAQUEU - indico o texto que escrevi na época: ENTRE JAULAS E EXCLUSÕES http://topicosemautismoeinclusao.blogspot.com/2009_05_01_archive.html

LEIA TAMBÉM NO BLOG -
O MANICÔMIO MORREU? PARA QUE O MANTEMOS VIVO EM NÓS?
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2015/05/o-manicomio-morreu-para-que-o-mantemos.html