quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

UM MUNDO PARA VOAR


(imagem publicada - Logomarca criada por Priscila Fonseca, como um desejo que este seja o símbolo para as paralisias cerebrais, com o símbolo em azul no meio representando uma pessoa em cadeira de rodas, com vários círculos ao redor, onde se alternam as imagens de mundos em formato de coração e circulos com pombas, ora brancas ora azuis,ora cinzas, ora pretas, tendo ao alto a frase: O Mundo pode mudar cada vez mais, para podermos voar, e embaixo a sua logomarca PÉ-SSOAL de autoria desta jovem mineira que é uma pessoa com paralisia cerebral)

InfoAtivo.DefNet 4320 - ANO 13 - 16/12/2009

"NATAL
NASCE UM DEUS. Outros morrem.
A Verdade nem veio nem se foi: o Erro mudou.
Temos agora uma outra Eternidade,
E era sempre melhor o que passou
Cega,a Ciência a inútil gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho de seu culto.
Um novo deus é só uma palavra.
Não procures nem creias: tudo é oculto..." (Cancioneiro, Fernando Pessoa)


Tenho recebido muitas manifestações de afeto e carinho, principalmente pela minha mudança de condição física, após a minha cirurgia de coluna vertebral. Mas tenho também vivenciado, intensa e criativamente, o sentido da perda parcial de algumas funções, habilidades e, principalmente, a mobilidade física para a Vida, como no passado.
Disse e escrevi ao meu neuro-cirurgião , junto à minha gratidão por sua intervenção, refletindo sobre a mudança que o pós-operatório me apresentava de que : A VIDA EXIGE MOVIMENTO....

Acho que nunca sonhei tanto com asas, vôos e, retomei na minha memória, um personagem de minhas poesias da adolescência: Ìcaro. Este mito que considero a melhor representação de nossos desejos mais profundos de libertação de nossos próprios labirintos, mesmo que nossas asas sejam de cera. Aspiramos o Sol e seu calor, por mais que nos leve até as profundezas do mar, mesmo quando nos derrete o sonho alado.

Eu acredito que tenhamos muito a aprender com as pessoas que já vivem com suas asas, semi-asas ou múltiplas asas em alerta. Estou reaprendendo, mais uma vez na minha vida, a presença de vôos sobre/para além dos limites do corpo. Como o poeta Fernando Pessoa, sem heteronomia ou alter-poetas, há uma busca que fazemos para explicar nosso mundo e seus mistérios. A visão do poeta nos obriga a pensar sobre nossa In-finitude humana e nossa transitoriedade.O que passamos é, nesse instante, mais um dos nossos muitos passados que explicarão nosso futuro.

O Amanhã, para os argonautas e seu desejo de novos mares e aventuras será sempre um novo des-cobrimento. Para este poeta múltiplo ser um argonatu implica em navegar nas àguas tempestuosas. Nos nossos tempos atuais, da Era do Acesso, mover-se exige tanto a velocidade como um caminhar, navegar ou voar com maior suavidade. Será isso possível quando nos impõem tantas e tamanhas barreiras, ondas da moda hipermidiatizada, naturalizações estigmatizantes, banalizações engessadas das violências?

O rei de Minos queria aprisionar uma fera em um labirinto. Nós o construímos, Dédalos e Ícaros Modernos, hoje, para nos libertar de nossos próprios monstros. E sem a ajuda de nenhum fio de Ariadne estamos meio perdidos em um mar-de-sargaços da hiperinformação, envolvidos no meio de um turbilhão macropolítico da corrupção, assombrados por ondas revoltas do maremoto de angústias que produzimos. Há uma saída ou solução cartográfica? Talvez sim, quando desejarmos, como o poeta lusitano, nos tornarmos outro e mais Outro, provocando, através de Alberto Caiero:

"ANTES O VÔO DA AVE, que passa e não deixa rastro,
que passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser...
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!"


Eu aqui, mais um bicho-homem e seus rastros, continuo sonhando ser apenas uma ave, talvez um albatroz ou novo Ícaro. Ainda mais que, depois de minha asa partida, não ter podido mais sobrevoar na invenção de um tal Santos Dumont. Não fiz mais nenhuma travessia ou travessura aérea. Por isso aprendo um pouco mais a aprender com os amigos, chamados de 'paralíticos' ou 'cadeirantes', pois sei que em cada um deles mora um passarinho, gaivota ou uma águia, quiçá em alguns até o condor, que talvez seja o que lhes anima e faz re-existir a todas as violências e discriminações. E persistirei no desejo de outros vôos e outras aeronaves. Como diz minha amiga: "O MUNDO PODE MUDAR, CADA VEZ MAIS, PARA PODERMOS VOAR"...

A estes amigos, os muitos Ronaldos, Priscilas, Alexandres, Leandras, Isabeis, Vinicius, Sachas, Geraldos, Kátias, Gregórios, Lílias, Veras e muitos outros que usam rodas em suas cadeiras esvoaçantes para a longa caminhada pela estrada aberta..., dedico esta mensagem de fim de ano.

NO ANO DE 2010, e neste fim de ano, envio, a todos e todas, inclusive aos "sem-asas" de sonhos, meu desejo de que saibamos cada dia mais ver mais longe, sonhar mais alto, mesmo que nos ameacem com todos os aquecimentos da Terra ou do Sol.

Como exemplo de um sonho-amigo, recomendo a todos que vejam ou re-conheçam como os dedos dos pés, e algumas cabeças, para além das mãos imobilizadas, podem ser/se tornar asas. Indico estes pés e mentes que exigem movimento, que mesmo sem deixar rastros, vem marcando presença e diferença, com arte e paixão, no que ainda chamamos de "Paralisia Cerebral".

Conheçam a Priscila Toledo, hoje estudante de Designer Gráfico na Universidade Estadual de Minas Gerais,poetisa e artista em:
http://www.feitocomospes.com/index.html


O seu primo Gregório de Negreiros Caldas, que pinta com uma ponteira ligada à testa - em video do Youtube:
http://www.youtube.com/watch?v=pBPr0zVkuRg


e visitem o Ronaldo Correa Jr , de quem sinto saudades, em seu Dedos dos Pés:
http://www.dedosdospes.com.br/


A CADA UM DELES CABE UMA ARTE-OFÍCIO DE VIVER SEM PARAR, POIS COMO NOS DIZ FLORBELA ESPANCA: " BELA, BELA , VIVER NÃO É PARAR... AS CINZAS NUNCA AQUECEM...", e eu plagio o poeta dizendo: "VOAR É PRECISO, POIS VIVER É IM-PRECISO"...
jorgemarciopereiradeandrade copyright 2009/2010 (livre para copiar e difundir quando citada a fonte)

5 comentários:

  1. eh uma honra mt grande ser homenagiada por vc jorge. acertia q ja me vploquei como o iucaro tb. rs.
    obrigada

    bjs
    pri

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  2. Não sei o que aconteceu com o senhor mas,mesmo com asas de cera,lutará bravamente como sempre fez e faz.
    um abraço e minha admiração
    Antonieta

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  3. Um lindo 2010 para vc e para sua familia...
    Bjus

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  4. Quando leio relatos de outros voos e outras aeronaves possíveis, ainda que resistentes aos tempos e contratempos humanos e limitados, ultrajantes e discriminatórios, lembro de um livor que li ainda bem menina, sobre o voo contrário ao vento, do suposto lado oposto, "Fernão Capelo Gaivota" e imaginava-me naquele voo, numa possibilidade arbitrária, em que pudesse ultrapassar as nuvens e ousar... Fico muito feliz quando leio sobre a ousadia de não ,limitar-se ao pesares e as "peninhas", as "limitações" que podem ser superadas, por cada um na sua possibilidade e no prazer de ver/conseguir/re-agir sobre quaisquer realidade... Não há rei de Minos que aprisione desejos!!!!

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  5. Quando leio relatos de outros voos e outras aeronaves possíveis, ainda que resistentes aos tempos e contratempos humanos e limitados, ultrajantes e discriminatórios, lembro de um livor que li ainda bem menina, sobre o voo contrário ao vento, do suposto lado oposto, "Fernão Capelo Gaivota" e imaginava-me naquele voo, numa possibilidade arbitrária, em que pudesse ultrapassar as nuvens e ousar... Fico muito feliz quando leio sobre a ousadia de não ,limitar-se ao pesares e as "peninhas", as "limitações" que podem ser superadas, por cada um na sua possibilidade e no prazer de ver/conseguir/re-agir sobre quaisquer

    realidade... Não há rei de Minos que aprisione desejos!!!!

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