domingo, 6 de julho de 2014

FUTEBOL, VÉRTEBRAS, CLONES E TRANSFORMERS – A PRODUÇÃO DO ESPETÁCULO DA VIOLÊNCIA.

Imagem publicada- foto da maquete tridimensional de propaganda do filme, recém lançado: Transformers 4, a Era da Extinção, onde  ‘caminhões-robôs’, são transformam em gigantescos e super armados Autobots e Deceptions, que hora defendem ou ameaçam a Terra e os humanos de sua extinção e aniquilamento total. Essa versão de número 4 inclui também o retorno de míticas figuras, como da foto, de monstros pré-históricos, qual dragões aliens ou dinossauros hipermetálicos, que são os meios de ataque ou de destruição a serem combatidos. Na foto há um robô  hipermetálico “cavalgando” uma dessas feras, dessas bestas deste Apocalipse, um Tiranossauro futurista, com vértebras de aço ou titânio. Entretanto tudo acontece, segundo a sinopse do filme porque: “um grupo de cientistas e empresários que buscam aprender com as invasões passadas dos Transformers, acabam levando a tecnologia a limites para além do que eles podem controlar...”. A utilização dessa imagem é uma aproximação da influência que estas ‘feras’ têm de humano. É a constatação de como, cada dia mais, o ato violento é legitimado, naturalizado, inclusive para supostas defesas patrióticas contra os ‘alienígenas’ ou quaisquer um que se torne, ou seja, tornado uma ameaça ou oponente... Como diz o cartaz: ‘agora não é guerra, é a extinção’. É o matar ou morrer. Na ficção naturaliza-se a tele visão da banalização da violência, em qualquer campo, inclusive os de futebol.

“Há diversos aspectos violentos, diretos ou indiretos, de caráter mais geral que ocorrem no futebol, mas não são exclusividade dele. Vejam só: o tráfico de drogas e de armas, o alcoolismo, a corrupção, a impunidade, a homofobia, competição excessiva, opressão, covardia (inclua-se o racismo) são práticas de violência que acontecem no futebol” (Maurício Murad, pág. 220).

Os jogadores do futuro usarão novamente armaduras ou camisas hiper tecnológicas? Ou duras armas letais que nos saciaram as nossas buscas de superação de nossas finitudes? Serão imbatíveis, heroicos, incansáveis, insensíveis, insípidos e, principalmente, indestrutíveis, como se fossem verdadeiras máquinas de fazer gols, mesmo que para isso fosse preciso passar como um trator sobre o outro que não veste a mesma camisa? O gramado que era verde poderá se tingir de vermelho, sem passar pelo amarelo?

Escrevi ontem, após mais um jogo da Copa do Mundo: “#NEYMAR EU SEI O QUE É DOR - PELA NÃO NATURALIZAÇÃO E BANALIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA DENTRO E FORA DO CAMPO - Neymar tem um FRATURA DE VÉRTEBRA (após anúncio “oficial”, via televisão, com  lesão na região lombar, da vértebra L 3,  para mim como agressão intencional), e Zuniga (jogador da Colômbia) nem remorso têm de sua deslealdade e violência? VALE TUDO.... UFUTEBOLCLUBE - UFC? Ou será apenas o UtilitarismoFIFAcomCerteza?

Há quase um ano atrás, por vários motivos, inclusive as manifestações das ruas, interessava-me questionar a produção social das violências. Estava atendendo a um pedido que me veio para um artigo sobre o que é Violência Social? Vinha lá da África, onde violências são, como aqui, parte do cotidiano. Logo de princípio reuni os livros que tinha sobre o tema. Um deles agora me incomoda e convida a relê- novamente: A Violência no Futebol, dele sai a citação lá em cima.

Não estaria escrevendo agora, com o sol já nascendo e me iluminando, ontem a noite dolorosa e a madrugada insone me colocaram em total implicação e empatia com um jogador de futebol: Neymar. E, graças à insônia e a inquietude diante da violenta cena de um “joelhaço” premeditado, resolvi provocar nas redes sociais uma fagulha de indignação, de revolta, mas também de reflexão. Valerá uma taça tantos “heróis”, suas vértebras ou mitos quebrados?

Vi, recentemente, um pequeno desenho animado com os jogadores sendo substituídos por CLONES: PERFECT, como propaganda da NIKE, que no Brasil recebeu o nome de o “ÚLTIMO JOGO”, como parte de uma série #arrisque tudo. Nela os grandes jogadores de futebol do mundo seriam substituídos por seus clones.

E Ronaldo, o fenômeno que negou a Copa, é encarregado de dizer aos ‘verdadeiros’ originais: “_ Vocês fazem o jogo, vocês não tem medo de arriscar... lembrem-se que vocês jogam como se fosse um jogo... eles jogam como se fosse um emprego...”. Mas como vencer um jogo contra nossos próprios espelhos? Contra nós mesmos?

 E, ironicamente, sabemos qual é o preço de cada um desses “corpos”, volantes ou atacantes, no mercado, ou não?

Mas não é o seu valor de mercado que está em questão para mim. Já se naturalizou a frase: a vida (útil) de um jogador é curta. As suas pernas e seus passes serão precocemente exauridos. E o seu corpo-jogador será aposentado. Nós também ‘penduramos as chuteiras’? Sim, em outras condições e por outras perdas, assim como outros mínimos valores. Eles, entretanto, serão ‘eliminados’, ou em breve substituídos, após contusões, lesões e vértebras fraturadas? As suas carreiras, à exceção de alguns Garrinchas, podem ser “transformadas”.

O que poderá acontecer, por exemplo, com os que mordem, atropelam, violentamente ou ‘’falso intencionalmente’’, deixam seu corpo quebrar o desses outros, os que mais ganham, tanto sucesso como dinheiro, quando são driblados? Perguntem ao uruguaio Luiz Soares ou ao colombiano Camilo Zuniga, um deles já está com um contrato de 75 a 90 milhões de euros com o Barcelona.

Como eles vão vencer os ‘clones’ perfeitos? Tornar-se-ão avatares de clones criados para eliminar quaisquer adversários, com dentadas ou joelhaços. Vale tudo. Diz a propaganda da Perfect Nike: “vocês arriscam tudo... TUDO... para VENCER”, custe o que custar, inclusive o sacrifício espetacular dos seus ou dos corpos de outros jogadores.

 CORPOS VIDAS NUAS como os dos gladiadores, na neo-arenas, nos gramados ou competições, treinados para reações, em breve, aos seus pés, braços ou cérebros com chips implantados, assim como os que já existem dentro das bolas. Tornam-se máquinas, robôs ou seres trans humanos que poderão ser controlados e manipulados a bel prazer dos interesses, desde os macropolíticos até os empresariais/industriais do futebol. É só vestir uma camisa com novas tecnologias já idealizadas, com microfones, microcâmeras, e, quiçá, com possíveis monitoramentos dos movimentos e até das emoções dos competidores.

A comparação de jogadores com neogladiadores, tão sutil e presente, virará realidade? Já questionei em 2010 essa onda crescente de naturalização e banalização do que acontece dentro dos estádios, desde tempos ditatoriais. A ideia de que é natural em um ‘esporte de contato viril’, jogo para machos escolhidos a dedo, se confrontarem até o ‘mata-mata’, revela os significantes necessários para a análise do que é vir a ser o ‘campeão nas arenas’.

A violência no futebol também é a “do” futebol. Apenas uma representação de um fenômeno considerado social, e, portanto, também um fenômeno humano. Entretanto se o vislumbramos como uma “paixão coletiva”, conforme se reforçam nos mitos, aí temos de lembrar-se das arquibancadas, dos torcedores.

Nesse campo já somos campeões. Como nos diz o livro A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL, de Maurício Murad, sobre mortes de torcedores: “...O que dizer dos dados de 2009 e 2010? Chegamos a 9 e 12 mortos por ano, respectivamente. A grave conclusão da pesquisa, no entanto,  é que 78,8% são de torcedores com nenhuma ligação com grupos organizados e responsáveis por atos e comportamentos marginais...”

E, dentro do panorama Copa, quando essas violências, com múltiplas facetas, são exercitadas agora contra os que ficam fora do perímetro dos estádios? Lá também está a presença, mesmo não visível, do modelo gerado pela Sociedade do Espetáculo, lá está presente, com a força truculenta das polícias e suas tropas de choque, o Estado Espetáculo. E são também naturalizadas as atitudes repressivas ou violadoras de direitos humanos, em nome da ordem e do progresso. Aí também está o “vale tudo”.
E, durante entrevista, o técnico da Seleção Brasileira, nos traduz o que fica aparentemente encoberto sobre essa violência naturalizada: “sabíamos que o Neymar seria caçado, desde o início da Copa...”. Há a caça, o caçado e o neo-caçador de chuteiras. Teremos, então, de nos preparar para assistir, em futuro não muito longínquo, o no ROLLER-FOOTBALL?

Como responderíamos, se nossa memória fosse mais viva, à indagação de onde estávamos no ano passado? Nas ruas ou nos nossos sofás? Acho que preferiríamos continuar mais um tempo, confortavelmente, ou nos sofás ou nos lugares de alguns que conseguiram ingressos para estar nos estádios/arenas. Não é mais seguro e menos arriscado nos mantermos nesses campos?

É-nos mais habitual ficarmos de espectadores do que espect-Atores? Melhor a primeira condição do que a exigente segunda, afinal ter de se re-inventar e, a cada momento, ter de se assumir produzindo, social ou individualmente, nossos próprios gozos ou sofrimentos.

 E, assim ficamos de costas para as nossas próprias penalidades. Nossos clones trocados por belicosos “transformers” resolverão todas as disputas, todas as querelas, e, como os heróis míticos, nos levarão para um futuro sempre vencedor e glorioso. Como máquinas-de-guerra aperfeiçoadas não mais precisaremos nem mesmo de biotecnologias, apenas bioengenharias que nos tornem “quase-perfeitos”, “quase-imortais”. Seremos todos ciborgues ou Robocops?

Em tempos de drones, clones, busca de perfeição e aprimoramento das máquinas futebolísticas e espetacularizantes, qual então será nossa proposta para enfrentamento, para além dos racismos e das discriminações, das bananas nos gramados às condenações de Zunica por sua pele e não por sua deslealdade violenta, para que recuperemos nossos sentidos éticos para todos os nossos jogos, todas nossas disputas e jogadas, todos os nossos “encontrões e trombadas” com o Outro e as alteridades?

Vamos “aprender a aprender”, ou melhor, inventar e re-inventar, como linhas de fuga e suaves cartografias coletivas, outros modos de viver mais humanos e menos cópias perfeitas de nós mesmos? E que tal recuperarmos nossos sentidos de multidão, sem temor das repressões, para além de massas passivas que podem ser esmagadas pelos viadutos, superfaturados e desestruturados, que só nos levam em direção dos estádios? Ou dos espetaculares estádios que nos fazem esquecer aqueles que os construíram e sob suas ferragens deixaram alguns “soterrados”?

E, se possível, dizermos, para além dos hinos ou dos patriotismos: NÃO VALE TUDO PARA VENCER EM QUALQUER CAMPO OU GRAMADO...

E a próxima Copa já começou... Continuaremos apenas campeões de audiência, passividade e ausência, insensibilizados e anestesiados diante da Era da Extinção, aquela que nós mesmos produzimos?

PS- Dona Fifa acrescente nas suas faixas:  SAY NO VIOLENCE IN FOOTBALL, além do RACISM que também se fundamenta em outras sutis e históricas violências.

Copyright/left – jorgemarciopereiradeandrade (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de comunicação e manipulação de massas)

LEITURAS CRÍTICAS INDICADAS –

A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL – Maurício Murad, Editora Benvirá, Saraiva, São Paulo, SP, 2012.

VIOLÊNCIA E CIDADANIA, Práticas Sociológicas e Compromissos Sociais – José Vicente Teixeira dos Santos et allii (orgs), Editora UFRGS/Sulina, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 2011.

NOTÍCIAS NA INTERNET – *(relacionadas com o texto)

Nike Futebol lança animação "O Último Jogo" vejam em: 

Copa do Mundo 2014 | Neymar, o gladiador abatido pela violência desleal do colombiano Zuñiga http://www.jornalgrandebahia.com.br/2014/07/copa-do-mundo-2014-neymar-o-gladiador-abatido-pela-violencia-desleal-do-colombiano-zuniga.html



Infográfico: a computação vestível e o futuro das camisas de futebol http://idgnow.com.br/ti-pessoal/2014/05/20/infografico-a-computacao-vestivel-e-o-futuro-das-camisas-de-futebol/

DIRETO DO TWITTER -  Guerra do futuro pode ter ‘transformers’ e drones impressos em 3D 
http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/guerra-do-futuro-pode-ter-transformers-drones-impressos-em-3d-13156602

LEIAM TAMBÉM NO BLOG –

RACISMOS, BARBÁRIES, FUTEBOL... ONDE ENTRECRUZAM AS VIOLÊNCIAS SOCIAIS? http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2014/05/racismos-barbaries-futebol-onde.html


EM BUSCA DE UM CORPO “PERFEITO” PERDIDO, NO TEMPO DAS OLIMPÍADAS... http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/08/em-busca-de-um-corpo-perfeito-perdido.html

SEREMOS NO FUTURO, CIBORGUES? PARA ALÉM DE NOSSAS “DEFICIÊNCIAS” HUMANAS http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/02/seremos-no-futuro-ciborgues-para-alem.html

8 comentários:

  1. Muito pertinente o texto. O tema tem que ser discutido para tornarmos a sociedade mais agradável e a vida mais respeitada.

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  2. Como escrevi outro dia falta Fair Play dentro e fora dos campos de futebol.
    Fair Play: significa jogo justo, jogar limpo, ter espírito esportivo, é uma expressão do inglês que significa modo leal de agir.
    Hoje li que alguns médicos avaliam a possibilidade de Neymar jogar a final, caso ela aconteça, às custas de infiltrações de analgésicos.
    Me pergunto qual é o preço justo a ser pago por uma vitória numa competição de futebol.Acho que estamos extrapolando limites em todos os sentidos.
    Continuo defendendo a postura de que, muitas vezes, menos é mais!

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  3. Eis as nossas grandes questões ético político existenciais! Que poderá nos salvar de nós mesmos?! Quem?!...quem?!... reverbera,mesmo.

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  4. A fagulha de indignação, de revolta, mas também de reflexão sobre a violência no futebol e também nos esportes olímpicos (que sacrificam os atletas já no treinamento intenso abusivo e lesiona tantos jovens atletas), deve ser insistentemente estimulada desde já...para que nos preparemos exemplarmente para as próximas olimpíadas. Nós é que devemos exigir que a chama ilumine a tod@s as torcidas os visitantes e aos organizadores do evento, respeitem o espírito esportivo contribuindo para o sucesso a segurança e alegria da festa, que deve ser exemplar...Ainda há muito que lutar por Direitos Humanos, até nos esportes...

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  5. Ótima reflexão!!! Humanização ou maquinografia?

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  6. Perfeito seu texto amigo Jorge!! Tenho pensado muito sobre o "que chamam de esporte" e pouco diferem das arenas sangrentas do antigo circo de Roma...
    Naquela época o massacre era legalizado e o povo saía saciado depois das cenas barbarismo, violência e morte, contentando-se em assistir. Hoje as arquibancadas participam, deixam que saia de dentro de si o monstro oculto e em nome de um "patriotismo", agridem outros cidadãos e se matam, em nome de quê?? de quem??? futebol?? Falamos dos circos de Roma e seus gladiadores como se isso estivesse muito longe de nós, de nossos tempos. O primitivismo está aí, a olhos vistos com as mesmas arenas e com a violência de rédeas soltas, sendo aplaudida, hilariada, levada em conta de normalidade, afinal jogo é jogo... será mesmo?? Se mordidas e coices são parte do jogo, me desculpem ALGEMAS TAMBÉM DEVERIAM SER!!

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  7. Achei muito interessante o percurso que Jorge faz para discutir a sociedade do espetáculo e as manifestações e expressões da violência; reflexão do filme Transformers 4 e o futebol...
    Ao ler o texto me lembrei dos comentários de algumas repórteres da GloboNews sobre a escritora americana de direita Ann Coulter que critica o aumento da popularidade do futebol nos Estados Unidos. Coulter lista as razões absurdas e dentre elas afirma que este futebol não tem força e nem violência como o futebol americano: dá até para as meninas jogarem. Eu me pergunto: até que ponto chegamos com a apologia à violência?

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  8. Importante demais levantar essas questões. Já é mais que hora de lançarmos um olhar menos permissivo e alienado ao tema FUTEBOL.
    Vera Versiani.

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