Imagem publicada – um menino
zumbi? Uma foto colorida de meu arquivo pessoal com uma criança, com uma
camiseta regata vermelha, onde se lê Salvador, Bahia, Brasil, uma cidade, um
estado e um país bem pretos, com uma população infantil perdida e perambulante
em busca de sentido e existência. Meninos e meninas, na maioria negros, que
mendigam nossos olhares, nossa atenção, nosso respeito e nossa indignação.
Meninos e meninas caídos, emagrecidos, dopados, como o da foto, em cima de
pedras coloniais, por onde pisaram seus ancestrais escravizados, arrastando
correntes, ou servindo aos seus donos senhores nas ladeiras como carregadores
das liteiras, derivação de sua condição de mulas, ou seja, mulatos.
“Vós e nós somos raças diferentes. Existe entre ambas uma diferença
maior do que aquela que separa quaisquer outras duas raças. Pouco importa se
isto é verdadeiro ou falso, mas o certo e que esta diferença física é uma
grande desvantagem mútua, pois penso que muitos de vós sofreis enormemente ao
viver entre nós, ao passo que os nossos sofrem com a vossa presença...”.
Assim como o garoto “invisível”, esquecido e negado, para não deixar
esquecer e com o desejo de não ter de repetir, pergunto-lhes, como já o fiz em 17 de novembro de 2010: de quem seria
essa afirmação feita em 14 de agosto de 1862? Seria possível que fosse uma
frase do eugenista Francis Galton (1822/1911)? Ou então de algum outro que
pregasse à época a purificação das raças, sua higienização ou segregação para o
“bem” de ambos os grupos étnicos, inclusive em nome da Ordem.
Não, a frase foi
proferida por Abraham Lincoln, na Casa “Branca” para um grupo de negros,
àqueles ainda sob a escravidão, e ditos motivos históricos da Guerra de Secessão. O norte abolicionista contra o sul escravocrata.
Historicamente aí nasce, ou melhor, se aprimora uma conceituação que
alicerçará, por séculos, a ideia de raça. Naquele encontro presidencial estavam
os que iriam receber uma ajuda governamental, aprovada pelo Congresso, para sua
“instalação fora do país”. Seriam “ajudados” na sua volta a África, considerada
já sua única pátria e nação verdadeiras. Então, Lincoln sublinhou que “neste vasto continente não há um único homem
da vossa raça que seja considerado igual da nossa”. E, como nossa Princesa, entra para a História
como um defensor da abolição...
Escrevo este texto para nos lembrar, e em especial aos que negam a
existência das consequências da ideia e da ideologia ligadas à raça, que quando
se propõem uma comemoração ou celebração de um mês para a Consciência Negra, em
nosso país, ao estarmos presos a velhos preconceitos ou falsas benevolências, a
maioria da população deste país, apenas por ser a maioria, mesmo que tratada
desde a Colônia como minoria ou marginalidade social.
Nunca gostei do que colocaram em minha certidão de nascimento: cor da
pele – pardo. O que ouvia e o que sentia é que ainda existia, pela visão de
Abraham, uma diferença física que mesmo edulcorada com o “moreninho” permanecia
como " a diferença". Uma diversidade não tão divertida, como os nomes que aprendia: cafuzos, mamelucos e outras “coisas”.
Minha e nossa miscigenação era e é parecida com um processo de liquidificação genética de
superfície; explico, apesar da pele mais “clara”, os processos de inclusão
permaneciam, podem permanecer, na escola, na rua, nos mundos em volta, diferenciados. No fundo, no inconsciente colonizado, permanece a ideia da raça diferente.
São as sutis e negadas exclusões que permanecem subjacentes e como
significantes nos processos ditos inclusivos. As construções das ideias
intelectuais de raça foram, transhistoricamente, municiadas de “balas de
borracha teóricas”, ou seja, continuavam repressivas, violentas, instauradoras
de uma ordem, confirmadoras de um Estado de Exceção, mas sempre difundidas como
uma solução para os conflitos das multidões e dos povos.
No meu universo empardecido procurei, pela voracidade do conhecer e do
ler, encontrar um rebelde com quem me identificasse. Esse, que nos Anos de
Chumbo, transformei em uma força constituinte e instituinte para meu próprio
futuro: Zumbi (1655/20 de novembro de 1695). Um nome ligado a uma resistência
ao colonialismo e à nosso histórico de dominação por Portugal. Um quilombola
que os livros de história (com h minúsculo) diziam que tinha se suicidado na Serra
da Barriga. Não, ele foi é traído e morto, como alguns das guerrilhas que se
deram em outras matas da América Latina.
Segundo o livro de Joel Rufino dos Santos, como reparação dessa versão
suicida, ao ser morto, após perder sua única fortificação e posição fixa no
Quilombo dos Palmares, quando retomou a ‘guerra do mato’, demonstrou o
vilipendio do seu corpo tombado por “quinze furos de bala e inumeráveis de
punhal”. Tinham lhe castrado, e o seu pênis enfiado na boca, além de um olho
tirado e uma mão direita decepada. Tinha se tornado uma vida nua, matável,
despojável e uma ‘coisa negra’ que os vencedores do Império precisavam
eliminar: um vândalo, um subversivo, um inimigo político dos bandeirantes, dos
comandantes militares e dos aristocratas de Pernambuco e Alagoas.
Por isso quando leio que uma cidade brasileira impõe uma liminar para
impedir a comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra, 20 de Novembro, lá
em Curitiba, me sinto, novamente, experimentando na pele esse disfarce e tática
para a discriminação. A ACP (Associação Comercial do Paraná) entrou com uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade, e a Justiça concedeu uma liminar, tendo
como principal alegação: “...a ACP alega que
o feriado (dia 20) causaria o prejuízo de 160 milhões à economia do município”.
Entretanto, como contradição a este suposto prejuízo, difundi pelas
redes sociais o Relatório do DIESSE (Os
Negros no Trabalho, 2013) que confirma que apesar de trabalhar mais a
maioria dos trabalhadores negros, mesmo ao ter maior participação no mercado de
trabalho, ainda ganham menos do que os não negros e ocupam os postos de
serviços menos valorizados.
Então, seja no Paraná ou no Amapá, continuam sendo
uma maioria que alicerça a tal economia que seria prejudicada. Continuam uma ‘maioria’
em marginalização e discriminação laborativa. São os ‘zumbis’ que constroem
prédios, novos aeroportos, novas estradas, novas economias, de novo denominados
de mulatos e mulatas, inclusive no Global.
Para que não pensem que esta discriminação é localizada e datada na
Colônia precisamos lembrar que a presença do trabalho indigno e escravo é mais
atual do que nunca em nosso país. E, para nossa reflexão, um dos estados onde
mais ocorre, o Mato Grosso, apenas 03 (três) de seus 141 (cento e quarenta e
um) municípios, Corumbá, Ladário e Itaporã, irão comemorar o feriado do dia 20,
o dia de Zumbi e da Consciência Negra. Em Campo Grande a Federação do Comércio
também impediu o feriado. Entretanto, no Mapa da Escravidão, uma realidade e
vergonha a ser enfrentada, este estado ocupa um grande espaço junto a outros
que mantiveram mais de 43 a 200 mil trabalhadores em escravidão no séc. XX/XXI.
Então, alguns irão questionar o que há para comemorar? Não há nada para
festa ou carnaval com mulatas globelezas nos encantando como sereias. Não há
nenhum lamento ou banzo negreiro a ser rememorado. Não há nem mesmo nenhuma
chaga gerada por velhos troncos ou torturas, ou chãos rasgados por mãos
calejadas e ainda acorrentadas por novas escravidões.
Há apenas que, como a lembrança de Tiradentes, oficialmente autorizada, embora também martirizado por ser
revolucionário, refazer a História, com participação ativa da população afrodescendente.
Fazer, a partir das escolas, o resgate de um corpo, de uma História e de uma
resistência, pela consciência e a educação, que retire os grilhões, hoje
invisíveis, dos pés, mãos e cabeças dessa parte diferente e incômoda de
cidadãos e cidadãs.
Este ano o 13 de Maio já passou. O dia 20 de novembro espero será menos
negado e mais reconhecido, pois uma das mais comuns alegações ou
justificativas, além das econômicas, para não torná-lo mais que um feriado, é a
de que “não existe racismo no Brasil”.
Assim se produziu, inclusive teórica e cientificamente, um embranquecimento de
nossas memórias. Há quem não reconheça nem mesmo suas próprias identidades,
origens ou negritudes.
Deu um ‘branco’ nas páginas obscuras de nossos movimentos eugênicos e
higienistas que envolveram desde escritores infantis até grandes nomes das
ciências. Estes esquecimentos já fazem parte de uma anistia que tentou esconder
verdades de um tempo totalitarista e de exceção. O movimento de ocultamento de
Amarildos e seus corpos reavivam essas práticas. O que a terra oculta, na nossa
‘culta’ sociedade, é para ser esquecido?
Zumbi diria que não, inclusive com armas ou pedras na mão, mesmo que
decepada.
Por ter um dia me visto, reconhecido e re-existente através da história
verídica de um homem livre, Zumbi, é que inventei nos tempos da Análise
Institucional a “potência Zumbi”. Uma potência capaz, por sua força instituinte
e desestabilizadora, de construir novos analisadores históricos, novas
revoluções moleculares, novas cartografias, novas alianças e suavidades
existenciais, para que possamos ir além das cotas e das ações afirmativas. Para
que possamos realizar, em ato e mudança de paradigmas, minha frase premiada
pela Seppir: “Abolir as novas escravidões
e novos racismos, um futuro possível e urgente para o Brasil”.
Então, nem mesmo os mais radicais, os mais ‘poderosos’ ou os mais
falsos abolicionistas poderão deter os novos Zumbis, novos black powers, novas
singularidades, que não são mais massa, nem povo, são somente multidões
indignadas e cansadas de sua exploração e escravidão neo e hipercapitalística.
Martin Luther King, Malcom X e Frantz Fanon estarão juntos, de mãos e cabeças
não decepadas, para nos inspirar essas potências Zumbis em nós.
- Se entrega, Zumbi! Eu não me entrego não, só me entrego LIVRE, VIVO e
com o belo nas mãos.
Copyright/left jorgemarciopereiradeandrade 2013/2014 (favor citar o
autor e as fontes em republicações livres pela Internet e outros meios de
comunicação de massa)
LEITURAS CRÍTICAS para reflexão e demolição de conceitos e
preconceitos:
A IDÉIA DA RAÇA, Michael Banton, Edições 70, Lisboa, Portugal, 1977.
ZUMBI, Joel Rufino dos Santos, Editora Moderna, São Paulo, SP, 1985.
“A HORA DA EUGENIA” – Raça, gênero e nação na América Latina, Nancy
Leys Stepan, Editora Fiocruz, Rio de Janeiro, RJ, 2005.
Notícias citadas no texto:
Dia da Consciência
Negra está SUSPENSO em CURITIBA http://www.parana-online.com.br/editoria/cidades/news/705262/?noticia=DIA+DA+CONSCIENCIA+NEGRA+ESTA+SUSPENSO+EM+CURITIBA
NEGROS/INCLUSÃO NO
TRABALHO - Relatório do DIEESE revela que mesmo trabalhando mais sempre ganham
menos /Só escolaridade não garante presença de negros no mercado de trabalho,
aponta Dieese http://infonoticiasdefnet.blogspot.com.br/2013/11/negrosinclusao-no-trabalho-relatorio-do.html
Três municípios de
Mato Grosso do Sul decretaram feriado no dia 20 de novembro http://www.igualdaderacial.ms.gov.br/index.php?templat=vis&site=256&id_comp=3889&id_reg=220570&voltar=home&site_reg=256&id_comp_orig=3889
Mapa da escravidão
(Lista suja do Trabalho Escravo no Brasil) http://cienciahoje.uol.com.br/blogues/bussola/2013/11/mapa-da-escravidao
O TRABALHO ESCRAVO
ESTÁ MAIS PRÓXIMO DO QUE VOCE IMAGINA/ Cartilha do MPT http://portal.mpt.gov.br/wps/wcm/connect/9a0cf38047af3bb1bd98bfd0854ab81a/Cartilha+Alterada_3-1.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=9a0cf38047af3bb1bd98bfd0854ab81a
IBGE mapeia a
distribuição da população preta e parda - Baixe o mapa http://www.geledes.org.br/areas-de-atuacao/questao-racial/afrobrasileiros-e-suas-lutas/21962-ibge-mapeia-a-distribuicao-da-populacao-preta-e-parda-baixe-o-mapa
Pesquisa mostra que
raça é fator predominante na escolha de parceiros conjugais http://www.ebc.com.br/2012/10/pesquisa-mostra-que-raca-e-fator-predominante-na-escolha-de-parceiros-conjugais
Para quem só lê ou
para fazer pesquisas na Internet –
Abraham Lincoln - http://pt.wikipedia.org/wiki/Abraham_Lincoln
Francis Galton – http://pt.wikipedia.org/wiki/Francis_Galton
Zumbi dos Palmares - http://pt.wikipedia.org/wiki/Zumbi_dos_Palmares
LEIAM TAMBÉM NO BLOG:
INCLUSÃO, RACISMO E
DIFERENÇA
https://infoativodefnet.blo11/05/inclusao-racismo-e-diferenca.htmlgspot.com.br/20
https://infoativodefnet.blo11/05/inclusao-racismo-e-diferenca.htmlgspot.com.br/20
01 NEGRO + 01 DOWN +
01 POETA = 01 Dia para não esquecer de incluir https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/03/01-negro-01-down-01-poeta-01-dia-para.html
NA NOITE GLOBAL TODOS
OS SERES TORNAM-SE PARDOS QUAL É A SUA RAÇA? -
Nada a declarar...
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2009/11/infoativo-defnet-n-4305-ano-13-2122-de.html
https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2009/11/infoativo-defnet-n-4305-ano-13-2122-de.html
RACISMO, HOMOFOBIA,
LOUCURA E NEGAÇÃO DAS DIFERENÇAS:as flores de Maio https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/05/racismo-homofobia-loucura-e-negacao-das.html
A CONSCIÊNCIA
INCLUSIVA E O RACISMO NA ESCOLA https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2011/11/consciencia-inclusiva-e-o-racismo-na.html
Consistente, profundo e claro. Gostaria de sugerir a inclusão, na lista de textos indicados, da obra de Eric Williams, descendente de escravos de Trinidad-Tobago, "Capitalismo & Escravidão".
ResponderExcluirLígia
Carissima Ligia
ResponderExcluirObrigado pelo elogio também consistente e estimulante, e seguirei a indicação da obra de Eric Williams, assim como recomendo a todos a leitura de um pequeno grande livro: O Racismo explicado à minha filha, de Tahar Ben Jelloun, que estimulará aos meus leitores e leitoras a busca de suas próprias crianças e suas curiosidades para o desejo de romper com as 'correntes' invisíveis que são tecidas e amarradas sutilmente desde nossa mais tenra idade... um doceabraçolivreembuscadoBELO
Este é um país onde o racismo se apresenta de forma mascarada, visto que, existe em todos os lugares e as pessoas fazem de conta que não vivenciam isso diariamente.
ResponderExcluirÉ INTERESSANTE COMO NO BRASIL EM PLENO SÉCULO XXI, O RACISMO CONTINUA DE FORMA TÃO FORTE E ISSO É ALGO MUITO DIFÍCIL DE SER SUPERADO. OBRIGADO E PARABÉNS PELOS SEUS VALIOSOS COMENTÁRIOS! BENÉLIA
ResponderExcluirBom dia Drº Jorge Márcio, guardaremos este material com muito carinho, ele é muito importante, cursamos Serviço Social na faculdade Dom Pedro II, estamos no 5º semestre. Tivemos o prazer de participar do Seminário no Ministerio Público, sua palestra foi perfeita, nossa equipe vai apresentar um seminário sobre Saúde Mental, colhemos bastante material, temos certeza que será um sucesso. Muito obrigada. não posso deixar de comentar sobre sua simpatia, é contagiante. Fique com DEUS e muita saúde.
ResponderExcluirJorge e leitores, conhecem essa publicação? Qual a avaliação de vocês?
ResponderExcluirhttp://canaldoensino.com.br/blog/colecao-de-livros-gratis-sobre-historia-geral-da-africa
Jorge querido, mais uma vez, você me dá uma aula de história e sociologia maravilhosas! Sou grata por sua lucidez e consciência!
ResponderExcluirMaravilhoso texto,uma aula de sociologia... Parabéns Jorge! Triste que ainda em pleno século XXI temos que conviver com este tipo de preconceito! Joao urbano
ResponderExcluirCaro Jorge, li seu texto e concordo que há, sim, preconceito e discriminação no Brasil. O que não concordo, que ainda me causa profunda estranheza (principalmente ao ver tal ideia sendo defendida por pessoas com mentes supostamente esclarecidas) é a contínua defesa do ser humano de pele "negra" (não seria mais correto dizer "marrom"? Aliás, existem muitíssimos tons e cores de pele, não é?) com o artifício de reunir a população negra sob a égide das raízes africanas, daí o termo "afro-descendente, o qual aliás é, para mim, um absurdo e um desrespeito a quem é brasileiro e, acima de tudo, ser humano! Causa maior sobressalto ainda ver que a figura de Zumbi ainda é evocada como símbolo de liberdade e conquista de direitos... É fato notório, podendo ser examinado mais a fundo por qualquer pessoa que se permita levantar a cabeça e olhar para além dos livros escolares do primário, que Zumbi foi um violento e nada democrático traficante de escravos, que colaborou bastante para a degradação de seus compatriotas na época da escravatura brasileira. Por fim, me permita dizer um desejo meu: o de que, algum dia, nós, brasileiros, possamos nos reconhecer não como negros, brancos, pardos ou mulatos, nem como nipônicos, afro-descendentes, cafuzos, mamelucos ou indígenas; acredito que já está mais do que na hora de reconhecer que nosso modo de viver, nossas instituições democráticas e a mobilidade social que incentivamos dentro de uma nação laica e liberal, provém da miscigenação de costumes imersa num caldeirão maior de influência portuguesa, isto é, européia. Ou seja, temos (pelo menos na teoria, na forma da Lei) um ideal de respeito às diferenças, de liberdade de credo e de autonomia do indivíduo que (lamento se alguém fique ofendido com isso, mas é verdade) só pôde existir e só persiste até hoje porque não nos fixamos ao paradigma de povos e tribos silvícolas ou pré-colombianos. Melhor dizendo: só estamos aqui, discutindo civilizadamente assuntos complexos através de uma rede internacional de comunicação porque o Brasil aderiu, ou melhor, foi criado a partir de contribuições variadas, sim, de várias etnias, mas que, paradoxalmente, só puderam atingir um nível de coexistência e desenvolvimento graças a uma ocupação estrangeira, baseada em modos de pensar e agir que eram ramificações de algo que costuma-se definir como civilização ocidental.
ResponderExcluirCARO ANÔNIMO EGON (em duas partes)
ExcluirPrimeiramente gostaria muito que tivesse se identificado nominalmente, Egon, inclusive com sobrenome, e assinado sobre e sob seu discurso, muito “embora haja discriminação e preconceito” no país chamado Terra Brasilis. Ainda há quem veja antes o sobrenome, ou seja, a herança ou a “boa origem genética”. O seu discurso, já ouvido e lido em outras plagas, me parece não ter uma fundamentação científica, revela um viés ideológico e mitificador, pois alegar que Zumbi era um “traficante de escravos”, segundo os livros que leu ou deveriam ser lidos no PRIMÁRIO, já demonstra sua origem escolar arqui criada, com uma subjetividade produzida nos tempos dos ‘bancos escolares’ do modelo da educação Moral e Cívica. Uma educação construída e levantada a partir de escritas hegemônicas, ou seja, a História dos vencedores, dos colonizadores. Houve sim processos de escravatura, como iniciação e inclusão étnica dentro dos quilombos, e Zumbi não foi o único e nem foi transformado em "anjo" Era um escravo que fugiu das correntes e das torturas comuns a quem resistia à aristocracia e à escravidão. Qual era mesmo o nome e o sobrenome dos que traíram, caçaram e esquartejaram o seu corpo?
Há confirmação de sua postura ideológica conservadora em todo o texto (maior que um comentário, mais próximo de uma "lição"), e, em especial, quanto ao que critica como afrodescendência. Sim os nossos ancestrais negros vieram da África ocidental trazidos em navios negreiros, tendo no timão, dessas embarcações mortíferas, nossos ''portugueses'' e outros genocidas de aluguel, os mesmos que retiraram algumas TONELADAS do PAU BRASIL e de OURO, usando a força de trabalho escravo (como em alguns latifúndios até os dias de hoje) com sua força de império colonialista para cobrir e tingir a Europa com nossas riquezas e nossos bens Lamento que tenha uma visão eurocêntrica e colonizada, pois sua leitura é a mesma que se criticou, após ser louvada, da Casa Grande e a Senzala. Escritas históricas, historiografias e "estórias"(como fabulações legitimadoras de uma microfísica do poder) são eivadas e contaminadas de tentativas de edulcorar a chamada 'miscigenação'. Não somos marrons, não somos tingidos de pau brasil, somos pretos, mais que "pardos" (um constructo estatístico e geopolítico, quiçá biopolítico) somos de uma etnia cuja pele é "escura" e oriunda de um continente chamado África. O mesmo que exigiu mais de 05 volumes de grossas páginas para contar sua história, pela UNESCO, inclusive do tráfico negreiro, ocorrido na exploração das diferentes tribos e com participação de dominações e explorações entre os próprios negros, também ditos pretos.
...
parte dois - ao Caro Anônimo Egon
ExcluirCom todo respeito à suas convicções, ainda devo dizer que há um discurso de sua parte que revela a ideia, se não estou tendo uma visão parcial, de que os 'povos primitivos', ou seja, os índios e 'tribos silvícolas", deveriam continuar sendo tratados como "ignorantes e atrasados" diante das caravelas e das armas de fogo de nossos invasores. Será que é preciso lhe lembrar a revisão histórica da América Latina e da América Central, com os chamados Incas, Maias e outros que deixaram as marcas de seus processos civilizatórios? Me parece que o caro ou cara amigo(a) prefere a visão construída e legitimada, inclusive com apoio das antropologias mais conservadoras, de que somos devedores e devemos ser eternamente gratos aos nossos colonizadores e invasores, caso contrário ainda estaríamos escondidos na mata Atlântica ou perdidos nos desertos, savanas e florestas das muitas e diferentes Áfricas. Sim o que o Sr. ou Sra. chama de Brasil é resultado freyreano da propagada 'miscigenação racial', a mesma que foi condenada pelos Eugenistas, com Renato Kehl com apoio de Monteiro Lobato, pois a "civilização ocidental" foi contaminada por essas raças menores e degeneradas, gerando seres híbridos e com defeitos genéticos irreparáveis. Agradeço seu comentário pois permitirá a muitos buscarem uma contraposição desse discurso ainda rico de ideologias, racismos e eugenismos, se não for justificador de algumas práticas higienistas e neo-liberais, pois talvez melhor seria que aceitássemos, como bons "neo-escravos" a "ocupação estrangeira" com uma dádiva divina, afinal nosso lema não é ORDEM E PROGRESSO, e sob ele não podemos eliminar quaisquer perturbações, vivas ou inanimadas, que prejudiquem o desenvolvimentismo custe o que custar?
Muito obrigado, ou devo dizer Thank You Sir. Continuemos sobressaltados, mas também sempre indignados com qualquer forma de escravidão, ontem, hoje e no amanhã, em qualquer lugar, em qualquer ilha ou continente. Vossa Mercê me permite discordar, como dizia Empedócles, sem que eu precise me abaixar ou rebaixar, lhe faça reverências ou aos que ainda sonham com um Brasil cordial, ainda colonial e não-racista?. Jorge Márcio Pereira de Andrade (Pereira é de origem portuguesa dos tempos da Inquisição, quando alguns resistentes judeus foram forçados e despojados pela Inquisição da Igreja Católica, recebendo nomes de árvores frutíferas, com forma de identificação genética e das heranças desses hereges)
Sim, somos os novos Zumbis redefinindo os novos espaços territoriais de pertencimento e de cidadania!... A luta apenas está recomeçando!!!...
ResponderExcluirSim, somos os novos Zumbis redefinindo os novos espaços territoriais de pertencimento e cidadania.
ResponderExcluirUbuntu
ResponderExcluirSó tive acesso a este texto agora, em 2017. Cada vez mais atual Jorge! Triste isso.
ResponderExcluir