Espaço Aberto, Ágora Virtual, criados por Jorge Márcio Pereira de Andrade, como uma resultante do InfoAtivo DefNet,com textos, informações, comunicações, editoriais sobre Artes, Acessibilidade, Análise Institucional, Bioética,Cinema, Direitos Humanos, Educação, Ecosofia ...
segunda-feira, 26 de abril de 2010
QUEM NÃO GOSTARIA DE VIVER 100 ANOS?
Imagem publicada- uma ampulheta, o mais conhecido dos relógios marcadores de tempo com areia, que quando escorre entre os dois bulbos de vidro que a compõem sintetiza de forma clara a passagem do Tempo (Cronos). Nessa ampulheta na parte de cima encontra-se um ser humano sentado a uma mesa escrevendo enquanto a areia escorre pelo gargalo para parte de baixo. Eis a vida, que ao nascer, viram de cabeça para baixo as nossas ampulhetas individuais.
InfoAtivo DefNet nº 4400
"Antes de tudo, há o homem só.
Que nasce sozinho, que morre sozinho
e que sozinho vai vivendo, no seu ente mais fundo..." (Mais Profundo que o Amor - D. H. Lawrence - poemas)
Será que muitos dos seres humanos não respondem negativamente, de acordo com as suas condições de vida, a este interrogar sobre a longevidade?
Principalmente, quando suas vidas tornam-se descartáveis e insípidas? Muitos, porém, me dizem que gostariam de viver e comemorar estes 100 anos, ainda mais agora com as possibilidades biomédicas de extensão e prolongamento da vida, esperando-se que, bioéticamente, com dignidade e qualidade. A idade, biológica e cronológica, de todos nós ainda é um dos parâmetros para que façamos a medida da vida. É ainda uma bio-ampulheta...
Porém a sobrevivência não é proporcional ao que chamo de 'supervivência", ou melhor da vida que se viva com intensidade e profundo sabor de vida, como nos sugeriu o título daquele suave-alegre-triste filme: o Tempero da Vida...
A vida precisa de tempero, de bom cozimento, de hora certa para alguns ingridientes, de temperatura adequada para seu preparo, de igualdade e proporcionalidade das diferentes especiarias, uma pitada de ousadia e uma dose de poesia, e mais ainda de muita delicadeza e de arte para sua cozinha política, assim como também um educação do gosto para aprender a valorizá-la em suas diversas apresentações e diversificados odores e sabores, tudo regado por um salutar encontro na mesa grande da família humana e sua diversidade afetivo-culinária. (como o nome grego do filme - Politiki Kouzina, de Tassos Boulmetis).
O Tempero da Vida é uma obra que enternece. E mais ainda pelos ensinamentos do modo educar em cinema que propicia.Trata com suavidade a finitude e a infinitude do viver. Estou estes dias, uns mais dolorosos que outros, pensando/matutando muito o que escrever sobre um acontecimento familiar que me aguarda lá nas Minas Gerais. Há que temperar a vida... e homenagear nossas origens.
No dia 30 de abril de 1910 nasceu o homem que me gerou ao ser afetado por minha mãe, contribuindo para a luz/areia em minha vida com data de vencimento marcada. Ele conseguiu, com nobreza e dignidade, chegar aos 100 anos. Isto muito me orgulha e estimula, pois sua vida e trajetória é marcada por muitos acontecimentos e incidentes, uns trágicos outros cômicos.
Como, por exemplo, o que ouvi em família quando ele, ao passar em frente a casa de sua futura noiva, minha mãe ANA, o jovem motociclista Arnaldo, sofreu um acidente por ficar olhando para a beleza dela. Ele acabou com uma '' fratura amorosa" de seu braço e de seu "coração"...tudo isso pela persistência de sua conquista afetiva. Aos 98 anos por outra paixão, o vinho, fraturou o fêmur, colocou platina em seu corpo, e em dois meses já caminhava com muito mais galhardia que eu e minha coluna e seus parafusos de titânio.
Costumo dizer que a vida de meus pais me ensina com clareza inevitável o entendimento de nossa transitoriedade humana. Ele, o meu pai fará 100 anos, e minha mãe, que já faleceu, só viveu até a proximidade dos seus anos 50-60. Ela faz parte dos episódios e vivências intensas que o velho Arnaldo teve de enfrentar, pois seu fim de viver foi arrastado, de forma irreversível, pela doença de Alzheimer. Por isso digo que já vivi bastante, e, do mesmo modo, diria como Neruda que "confesso" que vivo intensamente.
A Dona Morte já me atormentou, mas depois da última cirurgia e seu pós-cirurgico hiperdoloroso, acho que aprendi um pouco mais de resiliência: nóis inverga mais nóis num quebra, diria o matuto, quando nóis ama profundamente a VIDA.
Eu, por tudo isso, acredito na construção de um sólido alicerce para viver e suportar viver. Viver não é moleza, diziam os meus ancestrais mineiros. E digo que esta vida que ando levando, pois sigo o poeta Fernando Pessoa em seu Dessassossego: "Viva a tua vida, não seja vivido por ela.".., o aprendizado da re-existência e do humor tem sido uma boa saída. A todo dia tem muitas coisas, pessoas ou fatos que lhe ajudam a despejar mais um pouco de areia-vida do outro lado da ampulheta... Mas resistir é preciso, viver não é preciso, além de navegar (hoje na Internet é claro)...
A longevidade tem de ser temperada pela arte-vidade, a amorosidade, a Transitoriedade,,,precisamos buscar, olhando para a imensidão do Universo, qual o astrônomo e astrofísico do filme grego, buscar alguma forma de amor intenso, nascido entre temperos, mas que nos faz ter a compreensão de despedida em cada encontro, em cada paisagem, em cada estação de trem ou local de partida.
E olhando os planetas e o Sol compará-los, poeticamente, com todos as especiarias que um ente querido nos ensina utilizar para uma boa fermentação de nossas vidas. As mesmas vidas que correm o risco de serem transformadas em Vidas Nuas.
Como o velho avô que sonhava retornar a sua terra grega, o astrônomo aprendeu a gastronomia da vida. Eu aprendi com um antigo romeiro, daqueles que caminham a pé, até Aparecida do Norte, que, para superar nossas bolhas nos pés e nossos cansaços físicos, há que buscar alguma transcendência, um além de nossas mesquinhas condiçóes biológicas. Um Zarathustra andarilho que possa estender um tênue fio entre a vida vivida e um além do abismo que nos atrai todos os dias, a tal da pulsão de morte freudiana, mais conhecida como DonaThanatós.
Queria deixar aos meus seguidores e seguidoras, visitantes e leitores do blog um brinde a VIDA e escolher com eles/elas um canto, entre as folhas da relva, de Walt Whitman para homenagear ao meu pai e sua longevidade.
Acho que o Canto à Estrada Aberta seria um bom brinde aos 100 anos de Arnaldo Pereira de Andrade, a quem dedicarei um grande cartaz/banner com os dizeres: "Arnaldo 100 você eu não estaria aqui...". E talvez responda a curiosa pergunta sobre o "segredo" de como ele chegou a esta idade: caminhar, caminhar, caminhar para além do corpo e sua limitações, como diz o poeta:
"A pé e de coração leve
Eu enveredo pela estrada aberta..."
referências no texto:
Ampulheta
http://www.museutec.org.br/previewmuseologico/a_ampulheta.htm
TEMPERO DA VIDA (FILME)
http://www.adorocinema.com/filmes/tempero-da-vida
DAVID HERBERT LAWRENCE - D. H. LAWRENCE
http://pt.wikipedia.org/wiki/D._H._Lawrence
CANTO A ESTRADA ABERTA- WALT WHITMAN
http://epifaniasvirtuais.wordpress.com/2008/02/13/54/
LIVRO DO DESASSOSSEGO - BERNARDO SOARES&FERNANDO PESSOA
http://livro-do-desassossego.blogspot.com/
ASSIM FALOU ZARATHUSTRA - NIETZSCHE
http://pt.wikipedia.org/wiki/Assim_Falou_Zaratustra
LEIAM TAMBÉM NO BLOG -
O MUNDO ENVELHECE, AS INJUSTIÇAS AINDA PERSISTEM, E ENTRE TANTOS, O MEU PAI FAZ 102 ANOS - http://infoativodefnet.blogspot.com.br/2012/04/o-mundo-envelhece-as-injusticas-ainda.html
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Belíssimas palavras de amor à vida, a Seu Arnaldo e a tod@s nós.
ResponderExcluirSenti-me "contaminada", emocionada, com vontade de convidar você e tod@s que lerem esta crônica nesta semana (que inicia em 26 de abril) para saírem na rua e apreciarem a linda lua cheia, que enfeita o céu, ilumina a noite e a vida. É um espetáculo da natureza que está disponível pra quem se dispor a ver/olhar.
Lembrei-me de uma música-poena de Gonzaguinha, que a Elis Regina cantava (e canta...) maravilhosamente bem, e que diz um pouco do sabor da vida.
Parabéns pelos 100 anos, Seu Arnaldo. Parabéns Jorge Márcio, filho amoroso.
Eu cá por mim, fico pensando no meu pai, que teria feito 100 anos mno ano passado, mas nao aguentou chegar lá. Em compensação, minha mãe está chegando nos 92 anos no próximo 2 de junho. Sua receita de longevidade: alegria pelas coisas simples da vida, sem nunca deixar de se surpreender e emocionar. Parabéns, mãezinha Marieta Medeiros Grisolia.
Concluo, com sua permissão, deixando o Gonzaguinha que, consegue dizer o que sinto, apesar de, paradoxalmente, nem ele, nem Elis estarem materialmente entre-nós. Como grandes artistas, sobrevivem à sua própria curta exiência material.
Carinhos,
Corinta
Redescobrir
Gonzaguinha
Como se fora brincadeira de roda, memória
Jogo do trabalho na dança das mãos, macias
O suor dos corpos na canção da vida, história
O suor da vida no calor de irmãos, magia
Como um animal que sabe da floresta, perigosa
Redescobrir o sal que está na própria pele, macia
Redescobrir o doce no lamber das línguas, macias
Redescobrir o gosto e o sabor da festa, magia
Vai o bicho homem fruto da semente, memória
Renascer da própria força, própria luz e fé, memória
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós, história
Somos a semente, ato, mente e voz, magia
Não tenha medo, meu menino bobo, memória
Tudo principia na própria pessoa, beleza
Vai como a criança que não teme o tempo, mistério
Amor se fazer é tão prazer que é como se fosse dor, magia
Como se fora brincadeira de roda, memória
Jogo do trabalho na dança das mãos, macias
O suor dos corpos na canção da vida, história
O suor da vida no calor de irmãos, magia.
Emocionante seu texto!
ResponderExcluirParabens Sr. Arnaldo.
Uma bela e justa homenagem.
Lindo.
Bjussssss.
Cara Corinta
ResponderExcluirAgradeço seu depoimento e elogios, sabedor de seu afeto por sua mãe e por seu pai, bem como pelo seu carinho comigo. Tenho certeza de os leitores do blog apreciarão o seu comentário literopoéticomusical do Gonzaguinha. Um doce abraço Jorge
Aos amigos resgatados no oceano da INTERNET e recentemente reencontrados pelo afeto envio o meu abraço trans-oceânico até o CATAR e que possamos viver na intensidade da amorosidade e da busca do alegre momento do reencontro novamente... um doceafetuosoabraço jorge
ResponderExcluirLindo texto ...
ResponderExcluirÀs vezes acho que precisamos de textos como esse, ou qualquer fonte de inspiração que seja, para continuar ...
A vida não é moleza realmente ...
Mas o doce só é doce, porque existe o amargo.
Parabéns para o seu pai!
Acredito que a razão para os 100 anos seja talvez um filho como esse.
Grande Abraço!
Thomás
Olá Dr: Jorge.
ResponderExcluirPsiquiatra ou poeta?
Cada vez que leio seus textos tenho esta impressão , por conta da poesia contida nelas.
Penso que Seu Arnaldo foi sempre seu inspirador. O mineiro é quieto, mas transborda de poesia e alguma sabedoria. Creio que é o nosso lugar, nossa quietude , nossas baixas montanhas nos chamem para uma reflexão, um aceitamento do que tudo a vida nos dá!
Seu Arnaldo com certeza era assim , quieto no que reclamar e um deixa a vida me levar, aproveitarei a lua de hoje. Amanhã? Quem sabe?.... Tal pai , tal filho , que dele aprende a viver, mesmo que seja dificil. Que na lembrança do Seu Arnaldo querido aprende a viver!Vivendo com alegria e resigninação.
Meu pai mineirão que deixou uma herança, a alegria mesmo na dor. Meu pai era alegre e morreu alegre aos 61 , prematuramente de infarto. Mas eu só lembro dele alegre e risão, o tipico mineirão que gargalha gostoso e que no final diz , ai , ai ai......
Jorge Márcio , por isso lembrei-me desta poesia de Drumond :
No meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
*************************************
Apesar de nossa vida , nossos caminhos terem uma pedra, a gente vai indo assim mesmo.....
Parabéns pelo texto. Muito bem escrito. Eu amei.
Grande abraço.
Ray
Caro Thomás agradeço sua emocionante forma de elogiar ao meu pai, que espero seja o mesmo elogio que eu devo dirigir ao seu. E que a livre doçura da poesia continue sendo um dos caminhos que você possa percorrer na sua vida blogueira e caminhante rumo ao futuro... um abraçocarinhoso jorge
ResponderExcluirCara Ray obrigado por 'desvendar' o poeta antes das minhas outras capacidades, pois isso já vem desde guri das Minas Gerais... não é por acaso que tenho um Andrade no nome, mas não tenho as asas e a verve de poesis do Carlos Drummond... ele tinha o lado telúrico e profundo dos minérios das palavras nas suas Minas Geraes...mas aprendi muito com sua leitura. Espero continuar acreditando, a moda de nossos ancestrais mineiros, que 'silenciosamente' também gritamos para o Mundo. um abraçodoce jorge
ResponderExcluirConhece o Sr. Arnaldo Pereira de Andrade? Esse seu ativo pai, com certeza, vai ser um companheiro de D. Mariazinha, hoje com 104.
ResponderExcluirPrezado Jorge Marcio
ResponderExcluirQuem não é feliz por ter podido ter um pai que chegasse aos 100 anos, eu fui. Papai faleceu em 2008 com 102 anos e 10 meses, lúcido, sem rugas, não queria partir, mas uma desidratação devido uma infecção urinária o levou. Quantas alegrias passamos juntos principalmente suas histórias(hoje um pouquinho delas contadas no livro lançado "Crianças do Brasil" editado pelo Museu da Pessoa - Editora Peirópolis, ~uma história contada por uma pessoa de cada estado do Brasil, papai por Mato Grosso)se tiver oportunidade leia.Só para se ter uma idéia o 1º curso de Economia que teve no Brasil foi porque ele foi ao Rio de Janeiro conversar e fazer esta solicitação para Getulio Vargas. Ficaria horas aqui contando, porém a finalidade deste comentário é parabenizá-lo pela linda crônica, pelo seu excelente trabalho que vem realizando e pelos 100 anos de seu pai.
Fraternalmente, abraços Regina Leondarides mãe de Thais com Síndrome de Down com 32 anos incluidissima no mercado de trabalho trabalhando já há 5 anos nos cartões de crédito American Express/Bradesco elaborando planilhas no Excel e é artista plástica.(mrleondarides@uol.com.br)Recebo seus emails. e espero continuar a receb^-los.
Que lindo texto, Jorge! Um encanto!
ResponderExcluir100 anos?! Não é para qualquer um...Tem que ser muito especial.
Fico imaginando a quantidade de experiência, de conhecimento, de sabedoria...Você, pelo jeito, deve ser um bom filho. Creio que essa seja uma das razões para se chegar aos 100 anos.
Meus amigos sempre foram bem mais velhos do que eu. Sempre gostei de ter amizade com pessoas bem mais velhas, aprendo muito com eles.
Parabéns e felicidades a você e a seu pai!
Abraços!
Jorge MArcio,
ResponderExcluirQuero agradêce-lo pela correção, por favor me oriente sempre que possível. Existe uma outra definição sobre paralisia cerebral que eu pudesse agregar ao post? Obrigada! Leticia
Ô Jorge...só hoje que pude sentar-me, como o momento merecia, para ler o seu texto.
ResponderExcluirAndei andando por aí. E devo andar muito mais...
Acho que o tempo ou a idade andam me deixando emotiva.Por diversas vezes emocionei-me com suas palavras.No final recolhi todos os sentimentos numa caixinha e guardei-a bem em meu coração, para que muitas e muitas vezes eu possa lembrar-me de quão linda pode ser uma vida, por mais dolorosa que pareça ser.
Até breve :o)
Obrigada por me enviar esse poema desdobrado em poemas. As confissões
ResponderExcluirmais doces e as agruras, os medos, e o temperos tudo o que tem impor-
tancia para o poeta/médico que fala em Dona Morte e seus acordos com ela.O poeta que fala em seu pai com o amor mais imenso que já vi. Quando penso que tu podes estar sentindo dor faço uma oraçãocoladanoutra para mágicamente te livrar da dor e correr com D.Morte que possa te pegar.Tu és alguem tão raro que as vezes desconfio que volitas por muitos mundos colhendo coisas bonitas. Amar bonito e nome do pai. Abraços!Gratidão/Gracias