Imagem publicada – A foto
colorida de uma linha férrea, através da qual chegavam os trens lotados de
prisioneiros ao prédio ao fundo, uma sólida construção do nazismo: o campo de extermínio
e concentração de Auschwitz I Birkenau, na Alemanha. Essa imagem também aponta
para o futuro, apesar de ser, como um museu, parte do passado. As linhas de
trem também já foram utilizadas pelos manicômios, prisões e campos de trabalho
forçado para além dos tempos nazi-fascistas.
Hoje, 27 de janeiro de
2013, me acordaram com um pesadelo. Era a visão cruenta de corpos empilhados,
queimados ou asfixiados. É a visão “cáustica” de jovens, a maioria, queimados/asfixiados em uma boate de Santa Maria, RS.
Lembrei, então, que a
data é e será, também, tristemente, para lembrar em todo o mundo a Memória do
Holocausto.
Um termo que, segundo a
Wikipédia, “... (com inicial maiúscula) foi utilizado especificamente para se
referir ao extermínio de milhões de pessoas que faziam parte de grupos
politicamente indesejados pelo então regime nazista fundado por Adolf Hitler”.
Essa “queimação”
transformada e naturalizada no que se configurou como um dos maiores genocídios da
história. As novas fogueiras, como as da Inquisição, exterminou, com fornos
crematórios, muitos corpos diferenciados e rotulados.
O princípio deste
modelo biopolítico de controle e extermínio nasceu, historicamente, junto com
os campos de concentração. Construídos primariamente para os trabalhos forçados.
“O Trabalho Liberta” anunciava-se em um dos seus portões principais dos
cárceres previa e meticulosamente planejados.
Depois foram aprimorados
como Solução Final com o surgimento das “câmaras de gás”, com um pensamento e
modelo de fábricas econômica e serializadamente produtivas. E, posteriormente, “re-invenção” da cremação destes
corpos descartáveis.
Daí nasce a palavra
Holocausto. Holocausto que é derivado do
grego, o “todo” “queimado”.
As chaminés dos campos
de extermínio foram e são a mais sombria lembrança dos que sobreviveram a esta
indústria mortal de eliminação das diferenças.
Segundo as pesquisas
esta trágica marca da História não foi aplicada primordialmente aos judeus e
outros elimináveis. Em princípio foram aplicadas nos corpos “degenerados”,
feios e matáveis de pessoas com deficiência.
Estes eram colocados em
ônibus, com os vidros vedados, e, sob alegação judicial, eram retirados de suas
casas, com a impotência e a autorização dos pais. Todos deviam ser submetidos a
um processo de higienização. Iam para as “internações” em espaços de “reabilitação”.
Os que se interessarem
podem ver estas cenas reproduzidas no filme Homo Sapiens 1900, do sueco Peter
Cohen. Nessa obra prima de cinema é documentada a busca eugênica e purista que
atravessou o início do século XX.
A “onda” que fez brotar
com sucesso o ovo da serpente nazi-fascista na Europa. A busca de uma suposta
beleza para um mundo totalmente uniforme e sem heterogeneidades. A feiura e os
defeitos deviam ser erradicados.
A mesma onda, ou
melhor, moda macropolítica, de produção de Vidas Nuas (ler em Agamben).
Hoje, nesse suposto
Século de novas luzes, assistindo o confinamento como forma de lazer, à moda
dos BBBs, temos de reconhecer que, sob a ideologia de Segurança pública ou
nacional, ainda podem ser implementadas novas e sutis formas de “paredões/eliminações”
de quem for considerado “indesejável”.
Conheçam a memória do
Holocausto, não podemos deixá-la cair no limbo histórico. Os métodos nazistas
foram apenas o aprimoramento de outras práticas já exercidas em todo o
Ocidente. Em 1900 já se aplicavam os conceitos “modernos” de Eugenia. Os alvos principais da
limpeza étnico-racial, em massa, ultrapassaram a marca de milhões de pessoas.
Entre os principais “eliminados” estavam: judeus,
militantes comunistas, homossexuais, ciganos, eslavos, pessoas com deficiências
físicas ou ditas “mentais”, prisioneiros de guerra soviéticos, membros da elite
intelectual polaca, russa e de outros países do Leste Europeu, além de
ativistas políticos, Testemunhas de Jeová, alguns sacerdotes católicos, alguns
membros mórmons e sindicalistas.
E para completar o
embelezamento do mundo era preciso eliminar os pacientes psiquiátricos e os
criminosos de delito comum...
E, para todas as ações
governamentais, sempre houve uma legitimação e aprovação, para além do
Judiciário, das massas. Como bem mostra
o filme O Triunfo da Vontade (1935), com a “perfeição” e a “ordem” criadas, cinematograficamente, da
perspectiva e a participação do povo alemão.
Por isso temos de
relembrar os tempos de exceção e os seus campos quando mais um Holocausto, à
moda brasileira, é produzido.
A tragédia de hoje não
menor nem maior que a de ontem. Apenas poderia ser evitada, no mínimo, se aprendêssemos com a História
a não perpetuar nossos piores erros.
O confinamento, mesmo o
mais sutil, acaba e acabará gerando uma naturalização da morte. Não nascemos
para espaços, inclusive os interpessoais ou redes, que nos tornem escravos ou
matáveis.
Em um mundo de Trabalho
Escravo mantido, Novas institucionalizações e internamentos compulsórios, Racismos,
Intolerâncias religiosas ou étnicas, Horrores econômicos reproduzidos,
Estigmatizações, Desfiliações e Exclusões sociais, garantidos pelo
Hipercapitalismo, podemos estar legitimando, seja micro ou macro politicamente,
novas formas de “cremação coletiva”.
Os corpos humanos
passam a serem apenas cobaias ou números. Alguns mais “desejáveis e famosos”,
mesmo que por segundos, diante de multidões descartáveis.
Por isso não me
perguntem quantos morreram na Boate Kiss de Santa Maria, RS. Espero, com
tristeza antecipada, que não nos esqueçamos dos sobreviventes.
Como no Campo de
Auschwitz, disse um “mulçumano” como ali eram chamados, segundo o texto de Agamben, ao se tornar mais um
sobrevivente: “De minha parte, tinha decidido firmemente que independente do que me
viesse acontecer, não me teria suicidado. Queria ver tudo, viver tudo, fazer
experiência de tudo, conservar tudo dentro de mim. Com que objetivo, dado que
nunca teria tido a possibilidade de gritar ao mundo aquilo que sabia?
Simplesmente porque não queria sair de cena, não queria suprimir a testemunha
que podia me tornar”. *(H. Laiben)
Assim o fazem e fizemos os que gritarão ao mundo: Tortura
Nunca Mais. Assim farão os jovens que, tornados sobreviventes, ensinarão o
Futuro a desejar a Vida e não a dança fatal
com a Dona Morte.
Continuaremos
reproduzindo e recriando, sem nenhuma crítica, as exceções que justificam novas
normatizações e confinamentos a partir de estigmas?
E que se mantenham
acesas, não as neo-fogueiras institucionalizadas, mas sim as consciências
críticas, de cada um e de todos (as), que aprenderão com quaisquer das
tragédias que, humanamente, ainda poderemos gerar.
Em tempo – assista ou
revejam e reflitam com o documentário: JUSTIÇA, de Maria Augusta Ramos, sobre
as práticas judiciais a que os “infratores”, principalmente os “menores”
delinquentes e os “drogados” recebem em nosso país.
AOS PAIS, MÃES,
FAMILIARES, AMIGOS E AMIGAS DOS JOVENS QUE RECEBERAM O ‘’KISS’’ DA DONA MORTE,
E QUEIMADOS OU ASFIXIADOS, QUANDO APENAS BUSCAVAM DANÇAR A VIDA, E MORRERAM EM
NOME DE UMA SUPOSTA SEGURANÇA/GANÂNCIA, MEU RESPEITO E O SILÊNCIO AFETIVO DE
QUEM JÁ APRENDEU COM (AR) DOR TENTAR ELABORAR O LUTO E A PERDA DE UM FILHO
AMIGO.
copyright/left - jorgemarciopereiradeandrade 2013-2014 (favor citar o autor e as fontes em republicações livres pela Internet ou outros meios de comunicação de massa. TODOS DIREITOS RESERVADOS 2025 ...)
INDICAÇÕES E PESQUISA
NA INTERNET
Holocausto - https://pt.wikipedia.org/wiki/Holocausto
Enciclopédia do Holocausto - Operações de Asfixia por gás (com as experiências iniciais com pessoas com deficiência)
https://www.ushmm.org/wlc/ptbr/article.php?ModuleId=10005220
Enciclopédia do Holocausto - Operações de Asfixia por gás (com as experiências iniciais com pessoas com deficiência)
https://www.ushmm.org/wlc/ptbr/
Memorial do Holocausto deve ser advertência constante, diz papa
Rússia celebra Dia
Internacional das Vítimas do Holocausto
SOBRE A TRAGÉDIA EM
SANTA MARIA, RS:
Tragédia deve marcar
vida universitária de Santa Maria https://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/01/130127_universidade_santa_maria_ru.shtml
Histórico infeliz:
relembre outros incêndios trágicos em boates - Antes de Santa Maria, o mais
recente havia ocorrido na Tailândia, em agosto do ano passado https://www.clicrbs.com.br/especial/sc/jsc/19,6,4024452,Historico-infeliz-relembre-outros-incendios-tragicos-em-boates.html
FILMES INDICADOS OU
CITADOS:
HOMO SAPIENS 1900 – ,
Direção Peter Cohen, 1998.
Video– com legendas em
português(áudio em inglês) https://www.youtube.com/watch?v=ObJCkAcLmXw
A ARQUITETURA DA
DESTRUIÇÃO, Direção Peter Cohen, 1992.
Video – com legendas em
português (em alemão)
O TRIUNFO DA VONTADE,
Direção Leni Rienfstahl, Alemanha, 1935.
JUSTIÇA, documentário
de Maria Augusta Ramos, Rio de Janeiro, Brasil, 2004. https://www.justicaofilme.com Prêmio Melhor
Filme Anistia Internacional
LEITURAS CRÍTICAS e
INDICADAS –
O QUE RESTA DE
AUCHWITZ- Giorgio Agamben, Boitempo Editorial, São Paulo, SP, 2008.
HOMO SACER – O Poder
soberano e a Vida Nua I – Giorgio Agamben, Ed. UFMG, Belo Horizonte, MG, 2002.
O CORAÇÃO INFORMADO –
Autonomia na Era da Massificação - Bruno Bethelheim, Editora Paz e Terra, Rio
de Janeiro, RJ, 1985.
TEMPOS DE FASCISMO –
Ideologia-Intolerância-Imaginário – Maria Luiza Tucci Carneiro & Federico
Croci (Orgs.), Editora Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, 2010.
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EUGENIA – Como realizar
a castração e esterilização de mulheres e homens com deficiência? https://infoativodefnet.blogspot.com.br/2013/01/eugenia-como-realizar-castracao-e.html
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O MARTELO NAS BRUXAS -
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